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Por — Rio de Janeiro

Bastaram 24 horas, entre os dias 15 e 16 de agosto de 1942, para que o submarino nazista U-507 matasse 551 pessoas no litoral nordestino ao lançar seus torpedos contra três navios. Foram 84 vítimas a mais do que o número de baixas da Força Expedicionária Brasileira (FEB) em um ano de combate na Itália.

Em abril deste ano, pesquisadores da Universidade Federal do Sergipe (UFS) deram início a uma pesquisa para encontrar o Aníbal Benévolo, uma dessas embarcações destruídas há oito décadas, que transportava 154 passageiros de Salvador a Aracaju. Novas sondagens serão feitas em outubro, e os mergulhos continuarão ao longo do verão.

Como eram o Aníbal Benevolo e o submarino que afundou o navio de passageiros — Foto: Editoria de Arte
Como eram o Aníbal Benevolo e o submarino que afundou o navio de passageiros — Foto: Editoria de Arte

Comandante sobreviveu

O ataque nazista, o primeiro em território nacional, levou o Brasil a declarar guerra contra a Alemanha quinze dias depois. Nesse intervalo, o U-507 fez novas investidas contra navios brasileiros, e os corpos das vítimas do Aníbal, do Baependi e do Araraquara começaram a chegar às praias de Aracaju.

— A cidade não tinha nem cemitério para enterrar o tanto de gente que chegava. Foi preciso criar um, de frente para a praia, para as vítimas não identificadas. É o Cemitério dos Náufragos. Nenhuma outra cidade brasileira construiu um cemitério para vítimas do nazismo — explica a historiadora Roberta Rosa, doutoranda e integrante do Laboratório de Arqueologia em Ambientes Aquáticos (LAAA) da UFS.

O Aníbal foi construído em 1905 na cidade alemã de Hamburgo. Assim como os outros dois navios, levava passageiros, incluindo famílias, na hora do ataque. A demora da sua chegada a Aracaju alarmou parentes, e o governo pediu aos pilotos do aeroclube da capital para tentar descobrir do alto o que teria acontecido. Apenas quatro sobreviventes foram resgatados, entre eles o comandante, Henrique Jacques Mascarenhas. Seu relato do ataque está entre as principais fontes dos arqueólogos para localizar o naufrágio, na divisa entre Sergipe e Bahia.

— Ele relata que era madrugada na hora do torpedeamento. Trancados em suas cabines, os passageiros mal puderam se desesperar porque o navio levou pouco tempo para afundar. Ainda podemos ter corpos ali — conta Rosa.

Pesquisador no mar em busca de navio: arqueologia subaquática — Foto: Divulgação/Aventuras Produções
Pesquisador no mar em busca de navio: arqueologia subaquática — Foto: Divulgação/Aventuras Produções

Segundo a historiadora, “Aracaju sentiu a guerra em seu cotidiano”. Um blackout programado foi decretado, e a cidade apagava as luzes à noite por medo de submarinos com novos bombardeios. Barricadas foram erguidas no centro, enquanto militares patrulhavam as praias. O porto foi fechado, e os preços dos alimentos subiram. Sob a suspeita de serem espiões, descendentes de imigrantes de países do Eixo, como italianos, foram perseguidos.

— Fomos a primeira cidade vítima dessa guerra submersa — diz ainda Rosa.

A agressão alemã precipitou a declaração de guerra aos nazistas, mas o Brasil havia rompido relações com o regime meses antes. A ditadura de Getúlio Vargas fechou acordos com o governo dos Estados Unidos para fornecer suprimentos e ceder bases militares no Nordeste, que eram estratégicas pela proximidade com o norte da África e a Europa. Em troca, o Brasil recebeu recursos, por exemplo, para a criação da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Dois anos depois do ataque, em julho de 1944, os pracinhas da FEB desembarcaram na Itália.

As operações para encontrar os destroços do navio tiveram início em abril deste ano. Com um sonar, o oceanógrafo Jonas Santos realizou uma varredura da área ao longo de seis dias, em busca de anomalias que indicassem a presença da embarcação.

Alguns pontos foram identificados, e uma nova expedição foi planejada para maio. Dessa vez, o objetivo era conhecer o que há embaixo da água:

— É uma região pouco explorada, sem interesse comercial ou turístico. Nos surpreendeu por ser um lugar tranquilo de mergulhar, com vida marinha, pouca correnteza e boa visibilidade. Vamos voltar lá no verão — conta Yuri Sanada, documentarista que prepara um filme sobre os naufrágios.

A relativa baixa profundidade da região, cerca de 27 metros, foi um dos motivos que levou o Aníbal a ser escolhido como primeiro alvo.

— Acreditamos que o Baependi está próximo, mas mais fundo, a cerca de 40 metros. É um mergulho mais complicado. Já o Araraquara estaria a mais de mil metros. Só seria possível com robôs. Vamos colocar a energia no Aníbal, mas a ideia é dar conta de todos — explica o professor de arqueologia da UFS Gilson Rambelli, coordenador do LAAA.

Memorial para vítimas

Parte dos recursos que bancam a pesquisa vem do pagamento de uma multa de R$1,8 milhão por infrações ambientais da construtora sergipana Cunha. Em um acordo com o Ministério Público Federal (MPF)em setembro de 2022, decidiu-se que os valores seriam destinados a projetos ligados ao meio ambiente e ao patrimônio histórico.

— Arqueologia é uma área pouco olhada, ainda mais a subaquática — diz a procuradora Lívia Tinôco, responsável pelo acordo. — Uma sociedade deve rememorar e ter consciência de fatos históricos que a trouxeram até aqui. Poucos em Aracaju conhecem essa história. Quando eu converso com sergipanos, eles se espantam com esse passado.

O Governo de Sergipe tem planos de construir um memorial para as vítimas do Aníbal, Baependi e Araraquara, no Cemitério dos Náufragos. Responsável pelas mortes, o U-507 teve final semelhante ao dos navios que torpedeou ao longo de 15 meses de atividade.

Em 13 de janeiro de 1943, enquanto navegava no litoral cearense, aviadores americanos avistaram o submarino e o atacaram com bombas. Ele naufragou, levando ao fundo do oceano sua tripulação.

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