A liderança, antes vista como o ápice do sucesso profissional, tem se tornado um território perigoso. Sob a pressão crescente de resultados, a multitarefa constante e disponibilidade ininterrupta, muitos gestores enfrentam uma sobrecarga insustentável. Esse cenário está criando um novo risco: o colapso dos líderes, que não afeta apenas a saúde, mas a produtividade e a cultura organizacional.
Com as mudanças crescentes na dinâmica dos negócios, líderes têm conduzido suas áreas com um nível cada vez maior de pressão por resultados, estruturas reduzidas e uma gestão mais complexa de pessoas impulsionada pela transformação do mundo do trabalho. A liderança precisa administrar temas sensíveis, como impulsionar a diversidade, cuidar da saúde mental do seu time, debater estratégias de carreira, dar feedbacks, além de cumprir uma agenda extensa de rituais de gestão, incluindo relatórios, intermináveis reuniões e processos internos.
Dados mostram que estamos à beira do colapso da liderança. Um estudo recente da Harvard Business Review mostra que 96% dos líderes entrevistados se sentem estressados e 33%, cronicamente esgotados. Outro estudo da consultoria Deloitte mostra que 77% dos entrevistados afirmam que a cultura do “sempre disponível” está prejudicando seu equilíbrio de vida e trabalho.
Esse esgotamento gera impactos profundos na cultura das organizações, levando ao risco de um ambiente tóxico, onde o estresse é transmitido para a equipe, afetando o clima e o engajamento.
A consultoria norte-americana DDI (Development Dimensions International) apresentou um estudo mostrando que 62% das lideranças acreditam que a sobrecarga tem impactado a cultura da empresa. No mesmo levantamento, 42% dos gestores consideram mudar de empresa em função dessa exaustão.
Esse contexto também afeta a criatividade e tende a colocar todos em modo de sobrevivência, com a sensação permanente de estar sempre devendo e com baixa qualidade no trabalho.
Essa realidade tem afastado o interesse das pessoas em ocupar posições de chefia. Segundo a DDI, 57% dos jovens não querem cargos de liderança em função da pressão e sobrecarga.
É hora de mudarmos a perigosa direção para a qual estamos levando os gestores. Não acredito que reduzir metas ou criar estruturas de apoio sejam caminhos viáveis para alterar essa realidade de sobrecarga e desencanto com a gestão.
A maior parte dos negócios não comporta mudanças significativas de estrutura ou modelo de custos. Margens apertadas e competição intensa limitam essa direção. Talvez seja hora de construirmos uma cultura menos hierárquica e reforçar o protagonismo dos funcionários. Em uma cultura intraempreendedora e menos centralizada, a liderança funciona como apoio. Significa construir um ambiente em que não sejam necessários super líderes e sim times mais potentes e independentes.
O paternalismo dominou as relações de trabalho em todo o século passado. A cultura de comando e controle não se adapta mais ao mundo atual. Precisamos superar a hipossuficiência do trabalhador e fomentar ambientes com segurança psicológica, conflitos construtivos e autonomia. A centralização e a dependência de uma gestão antiquada, típicas de cem anos atrás, já não fazem sentido. É essencial fortalecer um modelo mental de iniciativa e risco, onde equipes buscam soluções sem depender do gestor.
A ideia de que tudo recai sobre a liderança está ultrapassada. Seu líder não deu o feedback esperado? Marque você a reunião. Nem tudo é culpa do chefe.
Rafael Souto é sócio-fundador e CEO da Produtive Carreira e Conexões com o Mercado