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"Prometo falhar": um best-seller de frases poéticas e boas jogadas de marketing

"Prometo falhar": um best-seller de frases poéticas e boas jogadas de marketing

O livro de Pedro Chagas Freitas vendeu mais de 110 mil cópias em Portugal. Chegou ao Brasil em agosto

RUAN DE SOUSA GABRIEL
11/09/2015 - 08h00 - Atualizado 11/09/2015 08h00

O português Pedro Chagas Freitas já havia publicado 19 livros (tiragens pequenas que ele pagou do próprio bolso) quando começou a postar crônicas no Facebook. Todos os dias, ele pedia temas aos seguidores da página. A sugestão que tivesse mais “gostos” (“curtidas”, no Brasil) virava o mote da crônica do dia seguinte. Essas crônicas foram reunidas no livro Prometo falhar, que vendeu mais de 110 mil cópias e transformou o autor num dos maiores fenômenos do mercado editorial português. O sucesso se repetiu deste lado do Atlântico. A edição brasileira foi lançada em agosto pela Novo Conceito e já figura em listas de mais vendidos.

Freitas, de 35 anos, passa longe do estereótipo do escritor português que lamenta o destino de Portugal às margens do Tejo. Se Fernando Pessoa escreveu que sua pátria era a língua
portuguesa, Freitas diz que vive na Lamechalândia. Em português do Brasil, “lamechas” pode ser traduzido como piegas. “Ser lamechas é sentir as coisas à flor da pele”, diz Freitas. “Eu vivo na Lamechalândia porque a emoção é o que mais me interessa nessa coisa que chamamos vida.” As crônicas de Prometo falhar não poderiam ser outra coisa que não lamechas. Um viúvo afirma que Deus levou sua esposa por ciúmes. Um homem assiste a sua amada dormir e outro tenta justificar uma traição. Aqui e ali, orgasmos e algum comentário sobre a crise portuguesa. O estilo é fluido, poético e repleto de figuras de linguagem. As frases de Freitas provocam mais suspiros que os versos dos poetas ultrarromânticos que adicionaram açúcar à literatura portuguesa do século XIX. Por isso mesmo, são compartilhadas nas redes sociais como se fossem trechos apócrifos de Clarice Lispector ou Caio Fernando Abreu. “A obra pode ser consumida como o leitor quiser. Ele pode interpretar as frases a sua maneira, e o autor não tem direito de se queixar”, diz.

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Pedro Chagas Freitas  (Foto: Pau Storch )
Lamechas Pedro Chagas Freitas, autor de Prometo falhar.  “A emoção  é o que mais  me interessa  nessa coisa  que chamamos  vida”, diz (Foto: Divulgação)

“Amar é deixar sempre uma porta entreaberta.” “O amor acontece quando desistimos de ser perfeitos.” Esses são alguns dos aforismos que Freitas posta em sua página no Facebook, que conta com mais de 390 mil curtidas. Postagens mais longas, como a que anunciou sua vinda ao Brasil para participar da Bienal do Livro do Rio, são encerradas sempre com a mesma frase: “E viva a pornografia de estar vivo”. Uma assinatura apropriada para quem gosta de exposição.

A crítica portuguesa credita o sucesso comercial de Freitas a boas jogadas de marketing. Ele discorda, mas não nega que cruzaria o Cabo da Boa Esperança por um leitor. “O público é crítico e rejeita obras que são puro marketing sem qualquer substância”, afirma. “Faço questão de ser lido. E, além de escrever, o trabalho do escritor é fazer com que as obras cheguem aos leitores, que estão também nas redes sociais.” A vontade de divulgar seus livros levou Freitas a se aventurar pelos círculos culturais lisboetas com a ousadia dos antigos navegadores portugueses. Em 2012, ele enviou um e-mail para Francisco Penim, diretor adjunto de programação da SIC, uma emissora de TV portuguesa. Penim e Freitas não se conheciam, mas o escritor convidou o executivo para promover seu Eu sou Deus, um livro que não é autoajuda, mas pode levar o leitor a se autoajudar. O atrevimento de Freitas convenceu Penim. “Em termos narrativos, estou sempre à procura de novas possibilidades. Por que em termos de divulgação não haveria de tentar coisas diferentes?”, diz o autor, que ainda guarda valiosas lições do tempo em que era publicitário.

Desde que lançou seu primeiro livro, Mate-me, em 2005, Freitas experimentou diferentes gêneros literários e estratégias de mercado. Além dos 21 livros publicados, ele tem mais de 100 obras na gaveta. Tudo isso sem recorrer a heterônimos. Em 2010, ele lançou dez livros numa mesma noite. Em 2012, o romance Ou é tudo ou não vale nada foi escrito ao vivo em lugares públicos ao longo de 2.012 minutos. Uma tela conectada ao computador permitia que o público acompanhasse a história e desse sugestões.

Freitas também usa as redes sociais para compartilhar conhecimento. Ele ministra oficinas de escrita criativa pelo Facebook. “Não dou curso de como se tornar um best-seller porque não conheço a receita. Se conhecesse, teria explorado mais”, diz ele. 








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