Comparativo

Por Raul Machado Carvalho*

Desde a formação da Autolatina já havia o plano de motorizar o Escort com a mecânica 1.8 da Volkswagen. Mas o momento escolhido foi agora, quando o Kadett entra no mercado. A novidade que o Kadett representa, além, é claro, de suas qualidades e tecnologia de ponta, são fortes argumentos para que o modelo da GM dispare nas vendas. Mas, por outro lado, o recurso do motor 1.8 introduzido no Escort, carro mais vendido do mundo nos últimos sete anos, lhe dá condições de competir de igual para igual.

* Matéria publicada originalmente na edição 291 da revista Autoesporte em julho de 1989

Todavia os dois continuam a ser alimentados por carburação. Mesmo assim, suas performances não ficam muito longe das do Gol GTI – pelo contrário, até surpreendem. A primeira questão comparativa, quando se alinham os dois carros lado a lado, é o design de cada um. São absolutamente diferentes no conceito e no estilo, mas semelhantes no prazer que proporcionam para os que sabem dirigir esportivamente.

Portanto a questão beleza, muito subjetiva, fica ao gosto do cliente: um estilo esportivo clássico, o Escort XR3, e o outro com a pretensão de voltarmos ao estilo hatch, porém muito redondo, em forma de gota, e de linhas absolutamente limpas, o Kadett GS.

O Kadett chamava muito mais atenção que o Escort — Foto: Carlos G. de Paula/AE (Acervo MIAU)
O Kadett chamava muito mais atenção que o Escort — Foto: Carlos G. de Paula/AE (Acervo MIAU)

Nas ruas o Kadett chama muito mais a atenção, ao contrário do XR3 1.8, que poucos entendidos percebem e logo chegam para perguntar se ele realmente acelera muito mais que o modelo anterior do velho motor CHT. A propaganda é inevitável: ele acelera muito mais e nos faz esquecer rapidamente a versão anterior.

Agora o XR3 é um carro muito mais agradável de ser conduzido, com respostas muito mais precisas sem os engasgos de alimentação anterior, muito rica, e com equilíbrio muito melhor. Vamos comparar por partes: externamente o XR3 proporciona o excelente teto solar que permite ótima aeração no interior e perfeita vedação.

O Kadett vem com os detalhes dos encaixes para bagageiro, embutidos e escondidos sob uma peça corrediça em quatro pontos das laterais do teto. O Escort tem novidade no rodapé da carroceria, onde os locais de encaixe do macaco agora são protegidos por tampas. Dois detalhes absolutamente novos no mercado nacional.

Na área frontal o carro da GM vem com faróis auxiliares embutidos no para-choque, um local facilmente atingido por pedras. Os faróis auxiliares do XR3 são dois tradicionais redondinhos, na altura dos faróis normais, um charme antigo do modelo que continua agradando. Quanto à iluminação o carro da Ford oferece melhor visibilidade noturna, com um facho de luz maior e mais claro.

Os dois têm para-choques envolventes interligados à carroceria e pequenas aberturas frontais para a refrigeração do radiador. O desenho dos faróis até que é bem parecido, mas diferem-se quanto às lanternas nas extremidades: a do Kadett, de cor âmbar, chama melhor a atenção do que do o XR3 de lentes brancas, porém com lâmpadas também âmbar.

Na traseira as diferenças se acentuam drasticamente: o Kadett se impõe com um design hatch com ampla área envidraçada, aerofólio integrado à carroceria e lanternas dispostas no sentido vertical, além de uma exclusiva luz para enfrentar a neblina. Já o XR3, com característica de dois volumes e meio, tem um aerofólio de material emborrachado e grandes lanternas dispostas horizontalmente.

Só o Escort XR3 tinha teto solar à época — Foto: Carlos G. de Paula/AE (Acervo MIAU)
Só o Escort XR3 tinha teto solar à época — Foto: Carlos G. de Paula/AE (Acervo MIAU)

Na questão de abertura do porta-malas o XR3 leva vantagem, pois assim que as portas laterais são abertas com a chave automaticamente fica destravado o acesso. Aí é só apertar o botão do fecho e que ele abre fácil. No Kadett o botão de pressão só se abre com a introdução da chave, única nos dois modelos para todos os acessos e ignição. Os dois também são equipados com limpadores do vidro traseiro e sistema antiembaçante elétrico. Na capacidade do porta-malas o maior espaço disponível fica para o XR3, com 420 litros contra 390 litros do Kadett, ambos medidos até a tampa que os cobre.

Internamente, vamos começar pelo volante de direção. O do Escort 1.8 XR3, mais anatômico, de duas hastes, permite melhor empunhadura. Mas o do Kadett GS 2.0 oferece o ótimo recurso de cinco posições, o que facilita a acomodação do motorista e uma melhor visualização do painel de instrumentos.

As buzinas dos dois modelos ficam no centro do volante e são de bom tamanho, sem exageros. Os bancos são muito confortáveis em ambos, mas o encosto de cabeça do XR3 é muito melhor. Por outro lado o banco do Kadett oferece maior número de regulagens, o que ajuda o motorista de grande ou pequeno porte. Além disso o banco traseiro do carro da GM pode ser rebatido em 1/3 e 2/3.

Os dois painéis são bem completos, como devem ser os de carros esportivos, e também bem iluminados à noite. No entanto os comandos do XR3, compactos e rotatórios, são mais modernos. Os do Kadett são bem anatômicos e ambos são eficientes.

A ressalva fica por conta do acionador do limpador traseiro, que no XR3 é mais fácil de ser entendido pois se trata de um simples liga/desliga, enquanto no caso do Kadett o equipamento é acionado com um toque para frente e desativado com outro toque para frente. Como isso complica um pouco, já vimos nas ruas novatos na linha GM com o limpador traseiro funcionando em dias de sol sem saber como desligá-lo.

Na velocidade máxima ligeira vantagem do GS, 182 km/h contra 180 km/h — Foto: Carlos G. de Paula/AE (Acervo MIAU)
Na velocidade máxima ligeira vantagem do GS, 182 km/h contra 180 km/h — Foto: Carlos G. de Paula/AE (Acervo MIAU)

Os dois modelos têm alavanca do afogador à esquerda do volante de direção, local correto para esse dispositivo, e sistemas de ventilação interna semelhantes, embora o do Escort seja menos barulhento. Mas os dois são eficientes. Ainda no painel o comando tipo pressão do Kadett para acionar o desembaçador elétrico do vidro traseiro fica melhor posicionado que o do XR3, na parte de baixo do painel, local de pouca visibilidade.

Quanto aos porta-luvas ambos são de bom tamanho, embora o do Kadett, com uma tampa muito grande, mostre tendência a se tornar um foco de ‘grilos’ dentro do automóvel. Os dois também têm espaços internos para pequenos objetos.

Quanto à tecnologia de check-control e computador de bordo oferecidos no Kadett GS como recursos de valiosa informação para o usuário, vamos nos abster de criticá-los, pois nas nossas mãos se mostraram muito imprecisos, até defeituosos, o que não é um bom sinal quando se deseja introduzir a eletrônica embarcada no produto nacional. Mas é um ponto a mais para o Kadett.

Os dois rádios são de ótima qualidade, mas o do Kadett é superior ao oferecer a memorização das emissoras, tanto em AM quanto FM. Ambos também são equipados com toca-fitas e o Kadett com guarda-fitas. Aliás o XR3, pela sofisticação que oferece, já devia ter antena elétrica, um avanço a mais no GS.

Escort XR3 1.8 e Kadett GS 2.0: dois esportivos de verdade — Foto: Autoesporte/Carlos G. de Paula/Acervo MIAU
Escort XR3 1.8 e Kadett GS 2.0: dois esportivos de verdade — Foto: Autoesporte/Carlos G. de Paula/Acervo MIAU

A alavanca do freio de mão está melhor posicionada no XR3 do que no GS, pois neste quando totalmente puxado chega a encostar e prensar a mão do motorista junto ao banco do carona. Diferença grande mesmo está na colocação das teclas que acionam os vidros elétricos: os do Escort em um local apropriado, junto às portas, numa haste que se estende a partir do descansa-braço.

No Kadett a operação de abrir e fechar vidros fica mais dificultada pois os comandos estão entre os dois bancos e o motorista precisa procurá-los com o tato para não desviar a atenção do volante. Os dois carros também têm comandos para posicionar os espelhos retrovisores externos.

No preço ganha o Kadett. No consumo (e autonomia), o Escort — Foto: Carlos G. de Paula/AE (Acervo MIAU)
No preço ganha o Kadett. No consumo (e autonomia), o Escort — Foto: Carlos G. de Paula/AE (Acervo MIAU)

Na questão do cinto de segurança o Kadett leva vantagem. Os do Escort apresentam certa dificuldade tanto para serem puxados até o engate (com frequência se engancham entre o espaço da porta e do banco dianteiro) e depois não são recolhidos automaticamente, mas mais pela insistência do motorista.

Andando, são quase iguais. A diferença na motorização – o Kadett com o motor dois litros já utilizado pelo Monza e o Escort com o 1.8 do Santana, ambos a álcool – na prática se equivale tendo em vista inúmeros outros detalhes que compõem o conjunto desses dois automóveis. O XR3, por exemplo, é 100 quilos mais leve que o Kadett, mas o coeficiente de penetração aerodinâmica é muito diferente: no GS é 0,30 e no XR3, 0,39. Todavia o desempenho dos dois esportivos foi bastante semelhante.

O GS tem excelente estabilidade nas curvas mas arrancadas um pouco menos favoráveis. Eficientes freios a disco ventilados estão nos dois, o que garante a segurança. A potência máxima do 2.0 do GS é de 110 cv a 5.600 rpm contra 99 cv a 5.800 rpm do 1.8 do Escort. O torque também é maior: 17,3 kgfm a 3.000 rpm contra 16 kgfm a 3.200 rpm do Ford. Na velocidade máxima o confronto também pendeu para o GS, com ligeira vantagem: 184 km/h contra 182,5 km/h na melhor passagem de ambos.

Nas dimensões externas o Escort XR3 ganha: 4,06 m de comprimento contra 3,99 m do Kadett. Em pneus e rodas há empate, ambos com aro 14 e pneus radiais sem câmara. Todos esses dados dão bem ideia ao leitor da igualdade dos dois modelos da GM e Ford.

O Escort XR3 1.8 ficou muito mais silencioso que sua versão anterior, com um motor de ronco mais metálico e agressivo. Diferença grande há na autonomia: o Escort com seu tanque de 65 litros permite ir muito mais longe, cerca de 600 quilômetros, do que o do Kadett GS com apenas 47 litros.

Além disso o XR3 não se beneficia apenas do motor mais potente mas também de outros itens de conforto como o câmbio importado de colocação transversal e pelas alterações introduzidas na suspensão.

Menor peso ajuda o XR3 a compensar maior potência do GS nas arrancadas e retomadas — Foto: Carlos G. de Paula/AE (Acervo MIAU)
Menor peso ajuda o XR3 a compensar maior potência do GS nas arrancadas e retomadas — Foto: Carlos G. de Paula/AE (Acervo MIAU)

Conclusão: são dois esportivos de tração dianteira com velocidades máximas parelhas, praticamente impraticáveis no Brasil e que exigem responsabilidade maior para quem os dirige. Ao final as acelerações, retomadas e velocidade final são muito fortes, feitas para dar emoção aos que gostam e sabem conduzir esportivamente. Os dois são muito seguros e de estilos completamente diferentes.

O Kadett, por ser absolutamente novidade no mercado e por suas formas externas inéditas, chama muita atenção, enquanto a simples motorização nova no Escort fica por conta apenas de um melhor desempenho. No preço o Kadett ganha longe e esse pode ser um fator decisivo na escolha entre os dois esportivos de puro sangue mais bonitos do mercado brasileiro.

Comparativo

TESTE GS XR3
Vel. máxima 182 km/h 180 km/h
0 a 100 km/h 10,6 segundos 10, 2 segundos
0 a 400 m 18 s 17,8 s
0 a 1.000 m 33 s 33 s
40 a 80 km/h 9,6 s 9,5 s
60 a 100 km/h 10,1 s 10,1 s
60 a 120 km/h 16 s 15 s
60 a 0 km/h 16 metros 15,5 metros
80 a 100 km/h 26,8 m 25 m
Média (Cidade) 6,3 km/l 7,8 km/l
Média (Estrada) 8 km/l 11,2 km/l

CHEVROLET KADETT GS 2.0
Motor: dianteiro, transversal, quatro cilindros, 1.998 cm³, refrigerado a água, álcool
Potência máxima: 110 cv a 5.600 rpm
Torque máximo: 17,3 mkgf a 3.000 rpm
Transmissão: manual, cinco marchas, tração dianteira
Suspensão: independente, tipo McPherson, molas helicoidais, braço de controle inferior, barra estabilizadora e amortecedores telescópicos de dupla ação (diant.) e molas helicoidais de ação progressiva tipo barril, barra conjugada de geometria fixa combinada com barra de torção e amortecedores telescópicos de dupla ação (tras.)
Rodas e pneus: 185/60 HR 14
Freios: Disco ventilado com pinças deslizantes sob pinos selados (diant.) e tambor auto ajustável com válvula equalizadora de frenagem (tras.)
Peso: 1.041 kg
Medidas: 3,99 m de comprimento, 1, 66 largura, 1, 39 m de altura e 2,52 m de entre-eixos
Tanque de combustível: 47 litros
Porta-malas: 390 litros

FORD ESCORT XR3 1.8
Motor: dianteiro, transversal, quatro cilindros, 1.781 cm³, refrigerado a água, álcool
Potência máxima: 99 cv a 5.800 rpm
Torque máximo: 16 kgfm a 3.200 rpm
Transmissão: manual, cinco marchas, tração dianteira
Suspensão: independente, tipo McPherson, molas helicoidais, amortecedores telescópicos (diant.) e independente, molas helicoidais, amortecedores telescópicos de dupla ação pressurizados (tras.)
Rodas e pneus: 185/60 HR 14
Freios: Disco ventilado (diant.) e tambor auto ajustável (tras.)
Peso: 950 kg
Medidas: 4, 06 m de comprimento, 1,64 m de largura, 1, 32 m de altura e 2,40 m de entre-eixos.
Tanque de combustível: 65 litros
Porta-malas: 420 litros

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