Mosquitos também gostam de perfumes. Mas não exatamente um Chanel número 5. Diversos mosquitos que transmitem doenças são atraídos por determinados compostos voláteis — em bom português, cheiros — liberados por pessoas infectadas. É ao picar os doentes que os mosquitos “ficam carregados” com os parasitas causadores da doença, e os levam até novas vítimas. A malária, por exemplo, altera o odor do hospedeiro, atraindo mais mosquitos transmissores. Cientistas resolveram testar se o mesmo acontece com doenças transmitidas por um velho conhecido nosso: o mosquito Aedes, transmissor, no Brasil, da zika, dengue, chicungunha e febre amarela. Estudo publicado na revista Cell mostra que sim: infecção pelos vírus da dengue e da zika altera o cheiro das pessoas, tornando-as mais atraentes para mosquitos do gênero Aedes.
Trabalhando com camundongos, os pesquisadores constaram que animais infectados com dengue ou zika atraíam mais mosquitos do que os não infectados. O experimento foi simples. Camundongos infectados e saudáveis foram colocados em gaiolas separadas e mosquitos do tipo Aedes, liberados. A maioria dos mosquitos, em torno de 65%, preferiram os animais doentes. O que é vantagem para o vírus, e contribui para aumentar o contágio.
Mas o que atrai os mosquitos? Os pesquisadores apostaram em um composto volátil, algo que conferisse ao animal um odor característico. Isolando várias moléculas liberadas pelos animais infectados, chegaram na acetofenona. Ela é produzida por uma bactéria que vive na pele de camundongos e de humanos. O vírus parece provocar uma disbiose — um desequilíbrio nas populações de bactérias que vivem em paz na pele e que nem notamos. Nos animais infectados com dengue ou zika, as bactérias produtoras de acetofenona eram mais abundantes, e outras espécies, geralmente numerosas, apareciam suprimidas. A produção de acetofenona era dez vezes maior.
Um experimento simples em humanos confirmou os resultados em camundongos: uma amostra coletada da axila de voluntários com dengue foi utilizada para testar a preferência do mosquito. O resultado foi o mesmo: mosquitos foram mais fortemente atraídos pelo suor de pessoas doentes.
Para tentar entender o que poderia causar o aumento na população de bactérias produtoras deste “perfume de dengue”, os cientistas procuraram genes relacionados a proteínas de pele que estariam mais ou menos ativados durante a infecção por dengue ou zika. Encontraram uma proteína de epiderme que é importante para manter o equilíbrio microbiano e proteger a pele de bactérias que causam doenças. Esta proteína estava bem reduzida nos animais infectados, e a escassez pode ser a culpada pela proliferação das bactérias produtoras de acetofenona.
A boa notícia é que a produção dessa proteína pode ser induzida por um derivado de vitamina A, que é usado em medicamentos contra acne. Alguns experimentos preliminares nos camundongos sugerem que estes medicamentos podem diminuir a população de bactérias produtoras de acetofenona, fazendo com que os animais percam seu perfume de dengue, e o mosquito torça o nariz e procure uma vítima mais atraente.
O trabalho foi feito em animais, com um pequeno teste complementar em humanos, e por isso é apenas um estudo gerador de hipótese — mostra que a ideia é viável, mas ainda não prova nada de maneira definitiva —, e por isso precisa ser replicado, e se for o caso, a hipótese precisa ser testada amplamente em humanos. Mas o resultado é consistente com outras doenças transmitidas por mosquitos, além de oferecer uma explicação para por que algumas pessoas sempre são vítimas mais constantes de mosquitos, e uma possível estratégia de prevenção. Além dos repelentes já conhecidos, agora podemos testar intervenções para mexer na produção de acetofenona e liberar menos Chanel de mosquito!