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Segunda Guerra

'O bombardeio': A história real do trágico ataque a uma escola que virou filme da Netflix

Bombardeio: O Instituto Jeanne D'Arc em chamas após ataque

Em meio ao escândalo gerado por evidências de que a Rússia bombardeou uma maternidade e um teatro que abrigava civis na Ucrânia, além de todos os óbitos de pessoas inocentes causados pela invasão de Vladimir Putin no país vizinho, um filme sobre a Segunda Guerra Mundial, recém-lançado na plataforma Netflix, resgata um episódio trágico do conflito dos anos 1940 que deixou dezenas de crianças e freiras mortas numa escola católica em Copenhague, na Dinamarca.

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Dirigido por Ole Bormedal, "O bombardeio" é uma ficção baseada em fatos reais que está entre os títulos mais buscados do Netflix. O filme reproduz a tensão na capital do país escandinavo no início de 1945, quando a resistência local ainda lutava para minar o controle nazista. Os personagens apresentados pelo longa dinamarquês levam vidas já bastante atravessadas pelos horrores do conflito, que começara em 1939. Mas ninguém estava pronto para o que viria a seguir.

Quando a produção estreou, atraindo interesse de público e crítica, muita gente ficou chocada com a pesada sequência que dá nome ao filme e foi perguntar no Google: "O bombardeio da escola pela força aérea britânica aconteceu mesmo?".

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A Dinamarca foi invadida pela Alemanha de Hitler em abril de 1940. Em vez de fugirem, o rei e o governo locais decidiram colaborar com os nazistas, o que gerou uma aparente tranquilidade. Porém, com o tempo, moradores de Copenhague criaram grupos de resistência, passando informações ao Reino Unido, realizando atos de sabotagem e até assassinando colaboradores. Os rebeldes recebiam armas dos britânicos e foram se tornando cada vez mais hostis para os invasores.

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No início de 1945, dezenas de membros da resistência estavam presos sob tortura no prédio da Gestapo local. Os líderes rebeldes vinham pedindo um bombardeio da Royal Air Force (RAF), a força área britânica, contra o edifício. Mas a RAF hesitava porque que a base inimiga ficava numa área com muitos civis. A resistência sabia também das chances de muitos de seus integrantes morrerem, mas alegava que os nazistas estavam fechando o cerco sobre eles e, portanto, a ofensiva era urgente.

Após meses de relutância, o bombardeio ocorreu em 21 de março de 1945, pouco menos de 50 dias antes do fim da guerra na Europa, celebrado em 8 de maio. O ataque foi constituído de três "ondas", cada uma com seis caças-bombardeiros DH Mosquito, além de duas aeronaves do mesmo tipo com a função de gravar os efeitos da ofensiva. A força áerea britânica chegou ao alvo às 11h e lançou diversas bombas contra o prédio da Gestapo, mas um deslize abriu caminho para a tragédia.

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Uma das aeronaves de reconhecimento bateu em um poste com uma das asas e caiu sobre o Instituto Jeanne D'Arc, uma escola católica de idioma francês gerida por freiras da congregação Irmãs de São José. Fundado em 1924, o colégio funcionava num prédio de tijolos vermelhos, no distrito central de Copenhague, onde estudavam 482 crianças e lecionavam 34 freiras.

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A queda do Mosquito, logo na primeira onda de ataques, não causou grandes danos à escola, mas, quando viram a densa fumaça subindo do Instituto Jeanne D'Arc,  pilotos de diferentes caças das ondas seguintes confundiram o edifício com o alvo e despejaram sus bombas no colégio. O terror das cenas criadas pelo filme de Ole Bormedal não é sem motivo: Aquele erro desastroso da RAF deixou 86 crianças e 19 adultos mortos. Além disso, 67 crianças e 35 adultos ficaram feridos.  

Segundo um trabalho de pesquisa publicado no site do Instituto Saint Joseph, que acolheu grande parte dos alunos sobreviventes, os estudantes foram, inicialmente, aconselhados a não falar sobre o que tinha acontecido. Os adultos acreditavam que não fazia sentido "remoer o passado", e durante muito tempo tentaram apenas apagar a triste memória. A atitude de negligência obrigou as crianças a lidar sozinhas com os traumas e pesadelos motivados pelo que viveram naquela manhã. 

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Para romper o silêncio, a dinamarquesa Elisabeth Lyneborg, aluna do jardim de infância na época da tragédia, escreveu a biografia "Eu estava lá! 21 de março de 1945". Ela conta que, em sua casa, o desastre era assunto tabu. Quando a lista de mortos era lida no rádio, seus pais mandavam a menina subir para seu quarto. Ela queria saber sobre seus colegas, mas não obtinha respostas claras. Sua família não compareceu nem mesmo à missa de sétimo dia em memória das vítimas. 

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Apenas anos mais tarde, ela soube que apenas cinco das 23 crianças que estudavam em sua classe morreram no ataque da RAF. 

Um monumento em homenagem às vítimas foi erguido no local, onde hoje estão situados seis prédios residenciais. Uma das professoras mortas foi a freira Gerda Moltzen, que, durante o ataque, tentou tirar o máximo de crianças da escola. Ela conseguiu, mas acabou morrendo quando as paredes do edifício colapsaram. Em 1988, foi inaugurada a Fundação em Memória de Gerda Moltzens.

A ofensiva também destruiu o prédio da Gestapo, matando 55 soldados alemães, além de 47 dinamarqueses que colaboravam com os nazistas. Dezoito prisioneiros da resistência escaparam, mas oito morreram. Quatro bombardeiros foram perdidos. A operação paralisou as ações da Gestapo na Dinamarca, porém, mais de 77 anos depois do ataque, aquele dia 21 de março ficou muito mais marcado na História devido à sucessão de erros que tirou a vida de todos aqueles inocentes.   

O Bombardeio: Monumento em tributo às vítimas, no local da antiga escola

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