Guga Chacra
PUBLICIDADE
Guga Chacra

Colunista do Globo e comentarista de política internacional da Globonews.

Informações da coluna

Guga Chacra

Mestre em Relações Internacionais pela Columbia University de Nova York. É colunista do Globo e comentarista de política internacional da Globonews.

Por Guga Chacra


Milhões de mulheres pobres e jovens de estados mais conservadores dos EUA correrão risco de morrer, como ocorre no Brasil, caso optem por abortar. As mais ricas do Texas e do Alabama, por sua vez, poderão viajar para Nova York, Los Angeles e Boston para interromper a gravidez nos melhores hospitais do planeta. Afinal, há milênios ocorrem abortos no mundo independentemente das regras e leis de civilizações, impérios e países. Esse é resultado na prática da decisão da Suprema Corte de derrubar a Roe vs Wade, uma decisão da própria instituição tomada há quase cinco décadas que havia garantido o direito ao aborto em todo o território americano.

A decisão de hoje era esperada porque havia ocorrido um vazamento sobre como os juízes iriam votar semanas atrás. Veremos qual será o impacto agora que se tornou algo oficial. Pode ser classificada como uma das decisões mais importantes da Suprema Corte em décadas. O voto seguiu a linha divisória entre conservadores e progressistas. Os seis juízes conservadores, sendo três deles nomeados por Trump, votaram a favor da derrubada da lei. Já os três progressistas votaram pela manutenção desse direito conquistado pelas mulheres em 1973 quando a Suprema Corte era mais progressista do que a atual, por incrível que pareça.

Resumindo, os conservadores seguem a linha originalista e interpretam a Constituição da forma como foi escrita. Como o aborto não está previsto no texto, cabe, na visão deles, aos estados decidirem. Se alguns forem a favor, deve seguir legalizado. Os que forem contra passam a poder proibir. Os progressistas seguem uma linha progressista e veem a Constituição com os olhos de hoje. Afinal, na época em que foi escrita, havia escravidão e mulheres não podiam votar. Levam em consideração a lei dos direitos civis para garantir esse direito às mulheres.

Cerca da metade dos estados americanos, incluindo o Texas, devem adotar leis rígidas proibindo ou restringindo esse direito. Outros, como Nova York e Califórnia, manterão o direito das mulheres. Consequentemente, uma texana rica que tiver uma gravidez indesejada poderá pegar um avião e viajar para Boston, por exemplo, e realizar um procedimento de aborto com toda a segurança. Dias depois, estará de volta a Dallas ou Austin. Já uma mulher mais pobre de Houston, no entanto, não terá como comprar a passagem aérea para ir a um estado onde o direito ao aborto seguirá legalizado. Muitas delas são mães e não terão com quem deixar seus filhos. Seus empregos tampouco as liberarão. A saída será, infelizmente, recorrer a práticas clandestinas que colocarão suas vidas em risco.

Mais recente Próxima

Inscreva-se na Newsletter: Guga Chacra, de Beirute a NY