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Forças Armadas

General endureceu jogo com TSE após indulto de Bolsonaro a Daniel Silveira

O deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) exibe o indulto assinado por Bolsonaro emoldurado em um quadro ao lado do presidente e do deputado Coronel Tadeu (PL-SP) em cerimônia no Palácio do Planalto, na última quarta (27)

Personagem-chave da crise entre o Palácio do Planalto, as Forças Armadas e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o general Heber Portella intensificou a pressão sobre a comissão de transparência eleitoral depois do perdão de Jair Bolsonaro ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ).

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É o que mostram as atas das reuniões do grupo, obtidas pela equipe do blog. 

Os documentos revelam que Portella, que costumava ficar em silêncio, endureceu o jogo com o tribunal no último encontro da comissão, realizado quatro dias depois do indulto. 

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Silveira foi condenado a oito anos e nove meses de prisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por ameaças e incitação à violência contra ministros da corte, o que enfureceu o presidente Jair Bolsonaro e o fez reforçar os ataques ao Judiciário.

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A coluna obteve atas de três reuniões da comissão: a primeira, ocorrida em 13 de setembro do ano passado, quando foram iniciados os trabalhos do grupo; a segunda, da reunião de 14 de fevereiro deste ano, quando Bolsonaro já havia usado questionamentos do Exército sobre as urnas para atacar o sistema eleitoral; e a terceira é a da última reunião, em 25 de abril. 

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Nesse período foram feitas ainda outras duas reuniões, das quais não existem atas. Segundo a coluna apurou, a equipe do então presidente do tribunal, Luís Roberto Barroso, não achava necessário produzir os documentos, tal o clima de tranquilidade nesses primeiros encontros. 

Nas duas primeiras, o general Portella entrou mudo e saiu calado. Não há registro de nenhuma fala do general, escolhido a dedo pelo ex-ministro da Defesa Braga Netto para compor o grupo. 

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Mesmo na reunião de fevereiro, quando as perguntas do Exército já tinham sido encaminhadas ao TSE, ele não se pronunciou.

Na reunião do mês passado, a coisa mudou de figura. A ata desse encontro mostra que Portella ja chegou na ofensiva. 

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Portella fez questão de falar depois da exposição do secretário de Tecnologia da Informação, Julio Valente. 

O técnico disse que o processamento dos dados das urnas é feito por por um sistema único em todo o país, que as possibilidades de auditoria são “muitas e complementares” e que a totalização dos votos pode ser repetida “por qualquer entidade que assim o deseje”.

Mas Portella não se conformou. Demonstrando uma pró-atividade inédita,  solicitou que “fosse apresentado o cálculo feito para o índice de confiabilidade no aumento de urnas auditadas nos testes de integridade”. 

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E, ecoando uma ideia que estava sendo gestada no Palácio do Planalto pelo próprio presidente Jair Bolsonaro, ainda consultou “sobre a possibilidade de que seja feita uma auditoria específica, caso haja um resultado diferente nos testes de integridade”. 

Também solicitou ao TSE que informasse “qual seria a melhor forma de realizar as auditorias existentes, considerando o processo como um todo”. 

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Em resposta, Fachin disse que o trabalho de auditoria global da eleição está sendo realizado pelo Tribunal de Contas da União (TCU). 

O general ainda perguntou se, mesmo os trabalhos do grupo sendo sigilosos, ele poderia conversar com as Forças Armadas sobre seu conteúdo. Fachin respondeu que sim. 

Não há cobranças desse tipo por parte do general nas atas das primeiras reuniões. 

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A comissão ainda fez outras duas reuniões no ano passado, em 4 de outubro e 22 de novembro, mas não há atas desses encontros. Em dezembro, Portella encaminhou ao tribunal um ofício em que solicitava acesso a um total de 27 documentos, entre eles relatórios de riscos e políticas de auditoria, segurança da informação e gestão de vulnerabilidades. 

Também deu início a uma série de perguntas sobre a preparação das eleições, a fiscalização das urnas e os mecanismos de segurança para detectar eventual “intrusão” aos sistemas, cujo teor foi revelado pela revista Veja.

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Os ofícios de Portella municiaram o presidente da República, que passou a usar as questões para reforçar os ataques contra a Justiça Eleitoral. 

Em fevereiro, dois dias antes de uma reunião da comissão em que o general não se manifestou, Bolsonaro declarou em um programa de rádio que “as Forças Armadas identificaram algumas dezenas de dúvidas, vamos assim dizer, sobre o sistema." 

O presidente ainda concluiu: "Oficiaram o TSE, o prazo era 30 dias, o TSE nada respondeu e foi reiterado. Anteontem expirou o prazo, nada responderam também”.

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Em abril, dois dias depois da reunião em que o general questionou os testes e as possibilidades de auditoria nas urnas, Bolsonaro recebeu no Palácio do Planalto um grupo de parlamentares e disse que o resultado das eleições era apurado em uma "sala secreta"– o que nunca ocorreu. 

"Uma das sugestões é que, esse mesmo duto que alimenta na sala secreta os computadores, seja feita uma ramificação um pouquinho à direita para que tenhamos do lado um computador também das Forças Armadas para contar os votos no Brasil”, afirmou o chefe do Executivo.

Desde então, o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira Oliveira, escanteou o general Portella e tomou para si a interlocução com a comissão.

Bolsonaro, porém, não parou de fazer ataques diários ao tribunal. 

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A comissão foi criada em setembro de 2021 por Barroso, com o objetivo de aumentar a segurança e a transparência de todas as etapas do processo de votação.  

O colegiado, ampliado na gestão de Fachin, reúne atualmente integrantes da PF, Ministério Público, Fundação Getulio Vargas (FGV), universidades (USP, Unicamp e UFPE, a federal de Pernambuco) e Congresso, além de entidades da sociedade civil.

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Diante da situação de tensão com o Palácio do Planalto, Barroso decidiu chamar os militares para compor a comissão – no que, hoje, é visto como um “tiro no pé”, já que o grupo se tornou um instrumento das Forças Armadas contra o próprio tribunal. 

Mesmo assim, Fachin decidiu manter os trabalhos do grupo até o fim de sua gestão, em meados de agosto, para não colocar mais lenha na fogueira.

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A equipe da Coluna procurou a assessoria do Exército na noite desta terça-feira, 16, com uma série de questionamentos sobre a atuação de Portella na comissão – e ainda não obteve resposta.

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