Publicidade

comunicação

Ministro do TCU reconhece irregularidades em licitação para promover governo Bolsonaro no exterior

Bolsonaro fala com jornalistas na porta da Embaixada da Itália, em Roma, durante viagem para a cúpula do G20 em outubro

Por Malu Gaspar e Johanns Eller

O ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Walton Alencar abriu um procedimento para apurar indícios de irregularidades no edital de licitação para a escolha de uma assessoria de imprensa que promoveria o governo Jair Bolsonaro no exterior em ano eleitoral ao custo de R$ 60 milhões. O caso foi revelado pela equipe do blog em novembro e se tornou alvo de uma representação do subprocurador-geral do tribunal, Lucas Furtado. 

Frente amplaPT avisa PSB que não abre mão de Haddad para o governo de São Paulo

O objetivo principal da assessoria de imprensa a ser contratada no ano da eleição é apresentar uma imagem positiva da gestão Bolsonaro no exterior. É o que informa o edital divulgado pelo Ministério das Comunicações. O briefing diz que a missão da empresa escolhida será  "apresentar ao mundo" o modelo de gestão de Bolsonaro, destacando "o zelo pela democracia e pela institucionalidade". 

Em despacho do final de novembro disponibilizado na noite de terça-feira no sistema do TCU, Alencar determinou que o tribunal ouvisse a Secretaria de Comunicação do governo federal responsáveis pela licitação e solicitasse informações para esclarecer uma série de problemas encontrados nas regras da concorrência pelo Ministério Público de Contas, em petição do procurador Júlio Marcelo de Oliveira. 

Leia tambémProcurador do TCU vê indício de direcionamento em licitação para promover Bolsonaro no exterior

O prazo para a realização de oitivas já terminou, mas o prazo para Secom fornecer as informações pedidas ainda está aberto. Em sua decisão, o ministro afirma que a Secom não é obrigada a entregar os documentos, mas a verificação deve prosseguir mesmo que o governo não se pronuncie. 

O procurador Lucas Furtado tinha pedido também a suspensão do edital, mas, como as propostas ainda não foram entregues, o ministro entendeu que não havia materialidade que consistisse em um risco grave ao erário.

E aindaKatia Abreu avisa governo Bolsonaro que não aceita "sangrar em público" na disputa por vaga no TCU 

O primeiro problema reconhecido pelo ministro Alencar é a falta de justificativa para o preço estimado para os serviços. Além de ser o maior contrato da história da Esplanada para assessoria de imprensa, – R$ 60 milhões só em 2022 –, seu valor é pelo menos o dobro do que foi pago nos anos anteriores pelo Ministério do Turismo (Embratur) e o da Cidadania, exemplos usados pelo próprio governo no estudo técnico preliminar que acompanha o edital. 

Diplomacia e política: Portugal concede agrèment para ministro do TCU Raimundo Carreiro ser embaixador em Lisboa

Walton Alencar também concluiu que não há no edital fundamentação quanto os locais onde a empresa escolhida terá que montar escritórios de representação internacional. Washington, nos Estados Unidos; pela América do Sul, Bogotá, na Colômbia; na Europa, Londres, na Inglaterra e Paris, na França: no Oriente Médio e na África, Tel Aviv ou Jerusalém, em Israel; e pela Ásia e Oceania, Sidney ou Camberra, na Austrália. "Chama a atenção a preferência por Bogotá em vez de Buenos Aires e a exigência de duas cidades na Austrália e nenhuma na Ásia. Não há razões fundamentadas para essas escolhas", escreveu o procurador Oliveira em sua decisão. 

Além de apontar a falta de lastro técnico para a escolha dos locais, o MP de Contas também afirma que a "definição taxativa do rol de cidades" restringe a competitividade da licitação, "pois o pode direcionar para empresa que já possua escritórios nessas localidades em razão de contrato anterior com algum órgão ou entidade do governo, como, por exemplo, a Embratur, o que reduz seu custo em comparação com concorrentes que não tenham escritórios já estabelecidos nessas praças". 

Eleições 2022: Congresso quase triplica verba para "emendas pix" no orçamento do próximo ano

Outra questão crucial sobre a qual a Secom terá que se justificar ao TCU é o conteúdo do briefing em que o governo federal descreve o conteúdo das informações a serem divulgadas ao público. 

A entrega das propostas está prevista para a próxima segunda-feira. O edital foi publicado no início de setembro pelo Ministério das Comunicações, ao qual está subordinada a Secom. A estratégia faz parte de um escopo de ações coordenadas pelo governo federal para promover a gestão de Bolsonaro contra o que chamam de “desinformação na mídia” às vésperas do pleito de 2022. Ao todo, as campanhas somam R$ 510 milhões. 

Com base na petição de Oliveira, Walton Alencar reconheceu inconsistências nas informações que seriam divulgadas pela empresa que vencer a licitação. Além do “zelo de Bolsonaro pela democracia”, a empresa contratada também deverá "apresentar ao mundo"  uma suposta coordenação bem-sucedida do combate à pandemia pelo governo federal, e a queda dos índices de desmatamento e queimadas na Floresta Amazônica. 

Tudo isso, claro, a despeito das diversas manifestações antidemocráticas convocadas pelo próprio presidente, o desastre sanitário vivido pelo país e as próprias estatísticas oficiais que apontam uma devastação recorde na Amazônia. 

Crise na PFLei antiterrorismo leva a mais uma exoneração de delegado

Em 2019, o presidente Jair Bolsonaro cancelou iniciativa similar, de R$ 30 milhões, sob a justificativa de que a licitação representaria “uma das muitas fontes de ações escusas” de grupos no poder. Desta vez, aposta em uma concorrência que custará o dobro aos cofres públicos no momento em que seu governo vive altos índices de rejeição no Brasil e no exterior. 

No mês passado, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e a deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP) já haviam pedido ao TCU e à Justiça Federal do Distrito Federal a abertura de investigação sobre a licitação do Ministério das Comunicações. No caso da primeira instância, os parlamentares propuseram uma ação popular contra o coordenador-geral de recursos logísticos do Ministério das Comunicações, Ivancir Gonçalves da Rocha Castro Filho, que assinou o edital publicado pelo governo.

 


 

Leia também