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Saúde

Faltam médicos em Portugal e centenas de brasileiros esperam reconhecimento do diploma

Homem recebe dose da vacina contra Covid-19 em Lisboa

Superado o momento agudo da pandemia de Covid-19, Portugal volta as atenções para um problema crônico: a falta de médicos no Sistema Nacional de Saúde (SNS). Uma crise revelada no momento em que centenas de brasileiros ainda esperam pelo reconhecimento do diploma.

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Tratados pela população como heróis no combate ao coronavírus, os médicos da organização pública não têm o poder da multiplicação. Desta maneira, estes profissionais sofrem devido às condições de trabalho longe das ideais e aos baixos salários, que os empurram para o privado ou para o exterior. 

E sofrem os portugueses e brasileiros residentes à espera do atendimento especializado e da designação de um médico de família. Este profissional do SNS se desdobra em muitas tarefas, como o acompanhamento do prontuário, avaliação clínica e prescrição de receitas individuais, inclusive as digitais, quando o paciente nem precisa ir ao posto de saúde.

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A relação com um profissional dedicado ao núcleo familiar pode durar por grande parte da vida dos pacientes. Mas, neste momento, cerca de um milhão de pessoas em Portugal não têm um médico de família. São 10% da população. É muita gente.

A revelação foi feita no Parlamento pela ministra da Saúde, Marta Temido. 

— Há mais médicos no SNS, mais profissionais, mas ainda temos cerca de um milhão de pacientes sem médico de família. É por isso que temos de continuar o reforço do SNS — disse a ministra.

A fratura do sistema tem sido exposta em cidades distintas: Lisboa, Algarve, Setúbal e Leiria. Veio à tona primeiro em Setúbal, área metropolitana de Lisboa, após 87 médicos pedirem demissão coletiva. Ato solidário ao diretor demissionário Pinto de Almeida, da obstetrícia. Ele denunciou que a unidade está sob risco de ruptura. Após a denúncia, o ministério anunciou a contratação de mais médicos.

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Na capital, os blocos operatórios do Hospital Egas Moniz pararam porque faltam anestesistas, uma situação denunciada pela Federação Nacional dos Médicos.

Em Leiria, o Sindicato Independente exigiu contratações ao governo para cobrir a falta de 50 médicos. No Algarve, há um déficit de 100 especialistas e o hospital apela ao reforço de médicos terceirizados, operação que seria mais cara do que pagar extras aos profissionais da casa.

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Outro alerta preocupa o país: a proximidade do inverno pode aumentar a procura pelos hospitais, principalmente pelos mais idosos, sobrecarregar o sistema e dificultar a resposta de maneira adequada.

Observadores deste vácuo de recursos humanos do SNS, os brasileiros e médicos de demais nacionalidades enfrentam seu próprio limbo. Desde o início do ano, há 850 estrangeiros (maioria brasileiros) que são candidatos em processo de reconhecimento dos diplomas de fora da União Europeia, uma saga de pelo menos três provas e uma espera -  que dizem ser de sete meses - pela inscrição na Ordem dos Médicos (OM). Brasileiros já disseram terem sido discriminados pelos responsáveis pelas autonomias das especialidades.

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Durante uma nova onda da pandemia no inverno, o presidente Marcelo Rebelo de Sousa publicou decreto autorizando a contratação temporária de estrangeiros. O Conselho das Escolas Médicas Portuguesas (CEMP) propôs à OM uma inscrição temporária, mas a ordem estava relutante à época. 

Se esta quantidade de estrangeiros for refinada para quem está na reta final de reconhecimento, são 103 o número de brasileiros aptos a iniciar a prática clínica, segundo havia informado a CEMP em janeiro, como mostrou O GLOBO.

Formada na Universidade Federal de São Paulo, Laís Vieira deu entrada no processo em 2019, e concluiu as duas primeiras fases, provas teórica e prática. Agora, em outubro de 2021, espera ser convocada para a terceira fase, quando apresentará um trabalho científico original na Universidade do Porto (UP), mas ainda sem data. Depois, irá aguardar pela inscrição na OM.

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Ela diz que tem acompanhando o drama recente do SNS ao mesmo tempo em que se dedica à telemedicina e à conclusão da dissertação de um mestrado em Saúde Pública no Instituto de Saúde Pública da UP. E faz um alerta: os valores das inscrições para quem iniciou o processo agora é mais elevado.

— Temos acompanhado (a situação no SNS) e lamentado. Irônico, não é? E eles têm imposto restrições ainda maiores para as pessoas que vão iniciar o processo agora. Triplicaram o valor das inscrições sem justificativa alguma — disse Vieira.

Procuradas, a OM e a CEMP não responderam.

 

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