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Tribuna
São da responsabilidade do editor e transmitem a visão do diário sobre assuntos atuais – tanto nacionais como internacionais

Câmeras mostram Polícia que ainda tem muito a avançar no combate a abusos

Caso de execução e de policial que algemou jovem à sua moto evidenciam importância de controle interno e externo da atividade policial

O chefe do programa de câmeras corporais em São Paulo, o coronel Robson Cabanas, observa as imagens captadas por um dos dispositivos.
O chefe do programa de câmeras corporais em São Paulo, o coronel Robson Cabanas, observa as imagens captadas por um dos dispositivos.Lela Beltrão
Carolina Ricardo Leonardo Carvalho Natália Pollachi

Esta semana dois casos graves de abuso na atuação policial vieram à tona em São Paulo e demandam respostas exemplares de parte das instituições responsáveis.

O primeiro deles foi o caso da execução de um jovem já rendido pelo Batalhão de Ações Especiais de Polícia (Baep) em São José dos Campos (SP), conforme matéria veiculada no programa Fantástico no último domingo. A identificação dessa execução, ocorrida em setembro deste ano, só foi possível em virtude do uso das câmeras corporais implantadas de forma inovadora no Brasil pela Polícia Militar de São Paulo, justamente como medida para prevenir e responsabilizar esse tipo de ilegalidade. As câmeras permitiram identificar a execução, fraudes à cena do crime e também tentativas de prejudicar a captação das câmeras.

O Ministério Público Militar pediu prisão preventiva dos envolvidos à Justiça Militar, que alegou não ser de sua competência, já que se tratava de homicídio e encaminhou o caso à Justiça comum. O Ministério Público Estadual, no entanto, decidiu não seguir com o pedido de prisão, apesar das provas contundentes apresentadas pela própria Corregedoria da Polícia Militar. Os policiais envolvidos nesse caso foram retirados do policiamento das ruas e exercem funções administrativas, ações tomadas pela própria polícia até a conclusão da investigação.

O segundo caso aconteceu em 30 de novembro, quando a cena em que um policial militar em serviço algemou um jovem negro à sua moto e o obrigou a correr enquanto dirigia o veículo foi filmada por um transeunte. A reação social foi imediata em apontar a cena como tortura, grave por si só, e praticada em plena luz do dia em área de grande movimento, indicando que aquele policial não estava preocupado com a gravidade dos fatos. Além da tortura, foi também apontado o crime de racismo, e é impossível não ver a semelhança com os relatos históricos da forma como pessoas escravizadas eram tratadas. Diante das imagens, a Polícia Militar foi ágil em repudiar a ação, afastar o policial das ruas e instaurar inquérito para demais investigações.

Nesse contexto, reiteramos a importância de termos no Brasil instituições policiais que busquem constantemente o aperfeiçoamento em direção à plena profissionalização, à superação de estereótipos e de práticas racistas em sua atividade de policiamento. Essas condutas são incompatíveis com instituições modernas de garantia da lei e que discutam seriamente as causas estruturais de ações como as que vimos esta semana.

Reconhecemos o empenho da Polícia Militar nas ações para redução de sua letalidade e para a responsabilização de ações ilegais, com a implantação de um conjunto de medidas como comissões para discutir os casos com evento morte, apuração célere, investimento em equipamentos menos letais e a implantação do uso de câmeras corporais de gravação contínua. Apesar de números ainda altos, 2021 vem registrando o menor número de pessoas mortas pela polícia desde 2010, mostrando que com vontade política e capacidade técnica é possível realizar um controle sustentável e responsável do uso da força pela polícia.

Destacamos, ainda, que para que os ganhos obtidos com a medidas implantadas não se percam e sejam, de fato, incorporados pela tropa, é preciso também o comprometimento social e de todas as instituições envolvidas nos controles internos e externos da atividade policial. A redução da letalidade policial e o respeito à dignidade humana precisam ser prioridades do Ministério Público Estadual, responsável pelo controle externo da atividade policial, bem como das demais instituições do Sistema de Justiça e Segurança. A recente recriação da Comissão de Monitoramento da letalidade envolvendo policiais publicada em resolução da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo no dia 1º de dezembro é mais um importante passo nesse sentido.

A sociedade espera que casos como esses não mais ocorram. No entanto, quando descobertos e analisados, esperamos que sejam emblemáticos para a consolidação de avanços que não devem retroceder, assim como que ajudem a orientar os novos passos que precisam ser trilhados pelas instituições de segurança e pela sociedade.

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