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Raúl Castro mostra os limites da democratização de Cuba

Raúl Castro mostra os limites da democratização de Cuba

Durante a visita de Obama, o regime castrista mostra que ainda não está disposto a relaxar seu controle autoritário da ilha

GUILHERME EVELIN
21/03/2016 - 19h07 - Atualizado 22/03/2016 11h27

A histórica visita do presidente Barack Obama a Havana, iniciada neste domingo (20), marco da progressiva normalização das relações diplomáticas entre Estados Unidos e Cuba,  talvez seja o maior impulso para a democratização do regime político da ilha – resquício da guerra fria entre capitalismo e comunismo do século XX que sobrevive no mar do Caribe. Mas os efeitos desse impulso dado por Obama para uma transição democrática em Cuba têm um limite a curto prazo: o próprio regime castrista. Apesar de estar no seu crepúsculo, ele ainda mobiliza seu aparato para frear uma maior abertura política – talvez com o intuito de tentar controlar um inevitável processo de reforma mais à frente.

Os presidentes Raul Castro e Barack Obama durante encontro em Havana, Cuba, nesta segunda-feira (21) (Foto: AP Photo/Ramon Espinosa)

Isso ficou claro nos dois primeiros dias da visita de Obama. Antes mesmo de o Air Force One pousar em Havana, com Obama a bordo para a primeira visita de um presidente americano desde Calvin Coolidge, em 1928, o regime comandado hoje por Raúl Castro mostrou que não está disposto a aplacar a perseguição aos seus opositores.  No domingo, o governo cubano reprimiu duramente, com dezenas de detenções, uma manifestação de ativistas do grupo Damas de Branco, que reúne opositores ao regime castrista. Uma das líderes das Damas de Branco, Berta Soler, deve fazer parte do grupo de representantes da sociedade cubana que vai se reunir com Obama, nesta terça-feira. 

Os limites que o regime castrista quer impor à abertura política ficaram evidentes também na entrevista conjunta que Obama e Raúl Castro deram depois do encontro que tiveram nesta segunda-feira 21 de março. A entrevista realçou as diferenças entre Cuba e Estados Unidos em relação à questão da democracia e dos direitos humanos.  Obama disse que a democracia, a liberdade de expressão e de associação se constituem em valores universais e realçou que o desrespeito aos direitos humanos  pode constituir um obstáculo ao pleno restabelecimento das relações entre os dois países – ainda marcadas pelo bloqueio econômico dos EUA a Cuba. Raul Castro se apegou à visão cubana de que há uma “politização” da questão dos direitos humanos e que Cuba observa, alguns direitos, como à educação e à saúde que muitos países não  respeitam. O presidente de Cuba se irritou também com a pergunta de um jornalista cubano-americano sobre a existência de presos políticos em Cuba e o desafiou a apresentar uma lista com os nomes dos prisioneiros.

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Apesar de ressaltar as diferenças de visões em relação a sistema político e econômica, Obama enfatizou que essas divergências não devem prejudicar a aproximação entre Cuba e Estados Unidos e acrescentou que o “futuro dos cubanos será decidido pelos cubanos, e ninguém más”. Antes do encontro com Raúl Castro, Obama visitou o monumento em homenagem ao poeta José Martí, o herói nacional cubano, onde deixou uma oferenda de flores. Foi uma mensagem forte de respeito à soberania cubana e de que os Estados Unidos não tentarão impor uma mudança no sistema político de Cuba.  Isso é um ponto pacífico. Mesmo os defensores da democratização da ilha dizem que ela, para ter efeitos duradores, terá que surgir por obra dos cubanos e não de pressões externas.

De qualquer forma, já está marcada uma transição no poder em Cuba. Em 2018, o quase nonagenário Raúl Castro, atualmente com 84 anos, deixará o poder. A substituição de Raúl Castro, diz o historiador Rafael Rojas, autor de “A História mínima da revolução cubana”, em artigo para o jornal espanhol El País, poderá ter dois desenlaces: uma sucessão autoritária, com a instituição de um modelo de capitalismo de Estado, ou uma transição democrática. O castrismo, por enquanto, está bloqueando qualquer transição para um sistema político mais aberto- segundo Rojas, unicamente por um obsessivo cálculo biológico. Eles não querem que nenhuma reforma política se produza enquanto estiver no poder os irmãos Castro e a geração histórica que fez a revolução cubana de 1959.

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