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Donald Trump

Donald Trump

Presidente eleito dos Estados Unidos. Candidato pelo Partido Republicano, derrotou a democrata Hillary Clinton nas eleições americanas de 2016

MARCELO MOURA
09/11/2016 - 09h50 - Atualizado 28/04/2017 16h10
Na segunda (13), em New Hampshire, Donald Trump fala a correligionários sobre o ataque à boate Pulse, em Orlando (Foto: Getty Images)

Donald John Trump foi eleito o 45º presidente dos Estados Unidos após uma das campanhas mais acirradas da história do país, derrotando a democrata Hillary Clinton. Trump venceu a ex-secretária de Estado em estados-chave, como Flórida (29 delegados), Michigan (16 delegados) e Pensilvânia (20 delegados), e ultrapassou, na madrugada de 9 de novembro de 2016, os 270 delegados necessários no Colégio Eleitoral.

Criança brigona – a ponto de deixar a escola e concluir os estudos em uma academia militar –, aos 25 anos, em 1971, Donald Trump assumiu o negócio da família. A imobiliária Elizabeth Trump & Son foi fundada por sua avó Elizabeth, na década de 1920, com seu filho Fred – pai de Donald. No fim dos anos 1960, a empresa administrava cerca de 14 mil imóveis. Os Trumps enriqueceram com a valorização do mercado residencial de Nova York – por vezes, com métodos questionáveis. Em 1973, o Departamento de Justiça americano processou a Trump Organization – novo nome da imobiliária – por discriminação racial. Segundo a acusação, os funcionários marcavam com o número 9 ou a letra C as propostas de negros e latinos interessados em alugar. Trump processou de volta seus acusadores, e o caso se encerrou após um acordo judicial. “O que eu não fazia era alugar para programas sociais, fossem brancos ou negros. Eu preferia lutar a ceder. Depois de ceder uma vez, você ganha a fama de ceder sempre”, disse Trump na biografia Trump – A arte da negociação (1987).

A biografia Trump – A arte da negociação construiu o mito de Trump como um grande administrador. Uma farsa, admite hoje Tony Schwartz, jornalista contratado para escrever o livro. “Tenho um remorso profundo por ter contribuído para apresentar Trump de um modo que chamou a atenção para ele e o tornou mais atraente do que é”, diz. A fama se consolidou em 2004 com o lançamento do reality show O aprendiz, no qual Trump era um chefe impiedoso de aspirantes ao sucesso. Trump nunca foi um empresário bem-sucedido como Jack Welch, ex-presidente da GE, ou Bill Gates, fundador da Microsoft. Mas é de longe o mais exibicionista deles. “Eu gosto de sentir as propriedades”, disse. “Nas empresas de tecnologia, não há nada que você veja facilmente.” Trump ostenta prédios como ostenta pessoas. Casou-se com três mulheres e traiu publicamente as três. Em uma gravação de 2005, Trump se gaba de atacar sexualmente desconhecidas. “Quando você é uma estrela, elas te deixam fazer qualquer coisa. Pegue-as pela b...”, diz. Filhos, tem cinco. “Não faço nada para cuidar deles. Dou o dinheiro e elas cuidam das crianças”, disse, em 2005. No ano seguinte, falou sobre sua filha Ivanka, então com 25 anos: “Se não fosse minha filha, talvez eu estaria namorando ela”.

>> A "autobiografia" que criou o mito

Em Bart no futuro, episódio do desenho Os Simpsons lançado em março de 2000, um líder espiritual mostra a Bart imagens do mundo anos adiante. Naquela previsão, Lisa Simpson, irmã de Bart, se tornara a primeira presidente dos Estados Unidos. Reunida com assessores na Casa Branca, Lisa diz: “Como vocês sabem, nós herdamos finanças públicas falidas pelo presidente Trump”. Dezesseis anos atrás, aquilo tudo era uma piada.

>> O risco Trump

Um mês antes do desenho, Donald Trump havia acabado de desistir de sua primeira corrida presidencial, após quatro meses de aventura como pré-candidato do nanico Partido Reformista. Trump presidente era uma ideia tão esdrúxula que foi tratada, por muitos, como mera campanha publicitária. “Nego fortemente que minha campanha tenha sido apenas uma promoção”, disse, ao desistir da candidatura. “Embora seja verdade que meu livro The America we deserve [A América que merecemos] se tornou um best-seller, além de meu cassino e meus negócios imobiliários terem certamente se beneficiado da exposição.” O marketing pessoal já era sua principal ferramenta. Empresas pagavam para usar o nome Trump para valorizar prédios. “Eu tenho meu nome em metade dos grandes edifícios de Nova York. Frequentei a escola de finanças Wharton, a melhor de todas. Eu sou inteligente. Alguns diriam que eu sou muito, muito, muito inteligente”, disse, em 2000. “Sabia que eu sou o palestrante mais bem pago dos Estados Unidos?”

>> A herança do Trumpismo para a política americana

>> O que diabos significa o sucesso de Donald Trump?

Em 2015, Trump disse novamente que queria ser presidente dos Estados Unidos. “Os mexicanos estão trazendo drogas e o crime para os Estados Unidos”, discursou, como pré-candidato do Partido Republicano. “Eles são estupradores, embora alguns, eu admito, sejam boas pessoas.” A fala parecia uma sátira, típica de um episódio do desenho Os Simpsons. Mas não. Foi levada a sério pelo Partido Republicano, que em 2016 o escolheu candidato, e pelos americanos na urna, que o fizeram, pelo sistema de Colégio Eleitoral, o presidente dos Estados Unidos.

>> A candidatura de Donald Trump

No discurso de vitória, Trump chegou a mostrar um lado diferente. Prometeu “unir um país dividido e governar para todos os americanos”. Distribuiu elogios e agradecimentos. Até os esforços de Hillary Clinton, sua adversária nas eleições, foram reconhecidos. Por um breve momento, houve esperança de que Trump assumiria uma postura mais presidencial ao longo dos dois meses de transição até chegar à Casa Branca e deixaria de lado a postura belicosa e o radicalismo de sua campanha. Não foi o que aconteceu. Depois de eleito, ele desferiu dezenas de ataques pelo Twitter. Seus alvos incluíram desde o ex-governador da Califórnia Arnold Schwarzenegger, seu substituto no reality show O aprendiz, até o pastor John Lewis, deputado democrata e um dos heróis do movimento pelos direitos civis dos negros nos Estados Unidos. As críticas à imprensa americana, hoje um hábito de Trump e de Sean Spicer, seu secretário de Imprensa, também começaram cedo. A CNN e o The New York Times foram alvos frequentes de Trump durante a transição presidencial.

>> Donald Trump, um subversivo na Casa Branca
          
Após assumir a Presidência dos Estados Unidos, no dia 20 de janeiro, Trump tentou levar adiante suas promessas protecionistas e isolacionistas. Durante a primeira semana como presidente, ele tirou os Estados Unidos da Parceria Transpacífico, reforçou a necessidade de renegociar o Nafta, muito criticado durante a campanha, e assinou um decreto que determinava a construção de um muro na fronteira com o México, o que causou um mal-estar diplomático com o México e seu presidente, Enrique Peña Nieto. Para fechar a semana de decisões polêmicas, Trump assinou uma ordem executiva que barrava a entrada de refugiados e cidadãos de sete países de maioria muçulmana nos Estados Unidos. A medida gerou protestos pelo país e confusão nos aeroportos. Acabou sendo derrubada por um juiz de Seattle, no estado de Washington, que a considerou discriminatória e contrária à Constituição americana. Trump desqualificou o juiz – e a própria Justiça americana – e não desistiu: cedeu em alguns pontos e assinou uma nova ordem, um mês depois. Dessa vez, foi um juiz do Havaí que alegou o descumprimento da Constituição e suspendeu a medida.

>> Vergonha americana

Não só o Judiciário barrou os planos de Trump. No primeiro grande teste do poder de articulação do presidente no Congresso, sua proposta de desmantelamento do Obamacare não foi aprovada. Acabar com o programa de saúde implementado pelo ex-presidente Barack Obama era uma das principais promessas de campanha de Trump. A derrota foi simbólica, pois parte dos Republicanos, hoje maioria no Congresso, não apoiou sua proposta.

Outra ocasião em que Trump percebeu que até mesmo o poder do presidente tem limites foi no planejamento de gastos de sua administração. Para ter suas contas aprovadas no Congresso e não correr o risco de lidar com a paralisação das atividades do governo federal, o presidente adiou mais uma promessa: a construção do muro na fronteira com o México.

>> Trump em guerra com a Justiça
         
Em abril, os Estados Unidos realizaram o primeiro ataque militar contra a Síria sob as ordens de Trump. O país é palco da guerra civil que já matou mais de 400 mil pessoas. O bombardeio mirou as forças do presidente Bashar al Assad, em resposta ao uso de armas químicas pelo regime sírio. Assad ordenou um ataque em uma cidade controlada por rebeldes que combatem seu governo e matou 72 pessoas.  

A intervenção americana mostra uma mudança na posição de Trump. Na campanha para a Casa Branca, seu slogan era “América em primeiro lugar” – uma plataforma que aparentava caminhar para o abandono da tradição intervencionista do país. A ação na Síria estremeceu a relação dos Estados Unidos com a Rússia, que apoia militarmente o regime de Assad. Ainda que os americanos tenham alertado os russos antes do bombardeio, para evitar que as forças de Vladimir Putin fossem atingidas, o Kremlin considerou o ataque uma “agressão contra um Estado soberano”. A relação de Trump com a Rússia é permeada de polêmicas. Alguns membros de sua administração são acusados de manter ligações obscuras com oficiais de Inteligência de Moscou antes mesmo de Trump chegar à Casa Branca. Com o abalo recente, o futuro dessa relação fica ainda mais imprevisível.

>> A guinada de Trump na Síria

Embora Trump busque reforçar para o público americano e internacional que ele faz jus à imagem de durão cultivada durante a campanha presidencial, a ação na Síria pode sugerir que ele também busca desviar a atenção das derrotas internas que vem acumulando. A ação militar aponta para um aumento da influência da cúpula do Partido Republicano, mais intervencionista, exatamente no momento em que Stephen Bannon, estrategista-chefe da Casa Branca ligado à extrema-direita americana, perde espaço e prestígio no governo Trump. A intervenção, entretanto, decepcionou os eleitores que votaram em Trump apoiando o slogan “América em primeiro lugar”.








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