• Augusto Siqueira (@augustosiqueira)
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Cam Newton faz parte do time de atletas que se alimentam à base de plantas (Foto: Getty Images)

Cam Newton faz parte do time de atletas que se alimentam à base de plantas (Foto: Getty Images)

Em meados de 2017, com duas participações em Jogos Olímpicos pela seleção brasileira e uma passagem pela NBA, a principal liga de basquete do mundo, o jogador Marcelinho Huertas decidiu aderir ao veganismo.

Influenciado pelo documentário “What the Health” ("Que Raio de Saúde", 2017), o atleta iniciou um processo gradativo para cortar o consumo de alimentos de origem animal. Hoje, aos 38 anos e vivendo na Espanha, ele mantém uma alimentação à base de frutas, sementes, verduras e legumes, além de queijo feta vegano em pedacinhos.

"Se estivesse comendo como antes, não estaria jogando em alto nível quase aos 40 anos", afirma ele, que percebeu uma melhora na recuperação do corpo após jogos e treinos. "Tinha muita dor em tendões, joelhos, e isso foi desaparecendo", conta.

Inspirado pelo mesmo documentário, o mesa-tenista carioca Hugo Calderano, 25, atualmente no top 5 mundial da modalidade, diz que há quatro anos aderiu à alimentação vegetariana (veja as diferenças entre as dietas no quadro ao fim da reportagem).

Morando na Alemanha, afirma ter evoluído no esporte depois de adotar a um cardápio sem carne. Em 2021, o atleta alcançou o melhor resultado da história do tênis de mesa olímpico brasileiro ao chegar às quartas de final nos Jogos de Tóquio. “No começo me senti fraco, mas depois de duas semanas observei meu corpo mais leve e disposto. Não penso em consumir carne novamente.”

Lewis Hamilton é adepto do cardápio à base de plantas (Foto: Getty Images)

Lewis Hamilton é adepto do cardápio à base de plantas (Foto: Divulgação)

A transição alimentar feita pelos brasileiros tem sido cada vez mais comum entre esportistas de elite, em modalidades com pouco ou muito impacto, que exigem mais ou menos força. Entre os mais esguios que se tornaram veganos estão nomes como o britânico Lewis Hamilton, estrela da Fórmula 1, e o ultramaratonista norte-americano Scott Jurek, vencedor de todas as principais provas do mundo na categoria.

Há também adeptos com muitos músculos, como o fisiculturista alemão Patrik Baboumian, e os norte-americanos DeAndre Jordan, jogador da NBA, e Cam Newton, da NFL, a liga de futebol americano.

De acordo com Ruan Santos, coordenador da área de nutrição do Comitê Olímpico do Brasil (COB), é possível ser um atleta de alto nível tendo uma dieta à base de plantas. Ele afirma que esse tipo de alimentação tem conquistado os esportistas por ter "uma ótima quantidade de carboidratos, fitoquímicos, antioxidantes, minerais e vitaminas”, que ajudam a inibir processos inflamatórios nos músculos, mais comuns em atletas que consomem carne.

DeAndre Jordan, jogador dos Philadelphia 76ers, da NBA (Foto: Getty Images)

DeAndre Jordan, jogador dos Philadelphia 76ers, da NBA (Foto: Reprodução Instagram)

Santos explica que o cardápio de um atleta de elite que seja vegano ou vegetariano é composto de oito refeições ao dia, com abundância de alimentos ricos em energia, como sementes, oleaginosas, abacate, frutas secas, homus e cereais. "A alta concentração de carboidratos diminui a fadiga precoce, dando mais resistência ao atleta."

Ele afirma que as dietas nas quais o consumo de alimentos de origem animal é menor ou zero podem incluir o uso de suplementos: "Sob o ponto de vista clínico, pode ser desejável para prevenir ou tratar deficiências nutricionais, como de ferro, vitamina D e cálcio".

Até fisiculturistas são adeptos ao cardápio à base de plantas (Foto: Getty Images)

Até fisiculturistas são adeptos ao cardápio à base de plantas (Foto: Getty Images)

A nutricionista Esthela Oliveira argumenta que a alimentação à base de plantas pode ser feita por qualquer esportista, mesmo aqueles que usam mais força ou a explosão. Ela diz que questionamentos são comuns, porque uma dieta desse tipo poderia dificultar a obtenção de proteínas, que ajudam a regenerar e fortalecer os músculos.

"Nós sabemos que a proteína de origem animal tem uma digestibilidade maior. Ou seja: a absorção do organismo é melhor. É possível compensar isso com a ingestão de alimentos oleaginosos, como amêndoas, pistache, castanha-de-caju, nozes e avelãs. Mas é recomendável ter um especialista acompanhando essa dieta para evitar qualquer desequilíbrio."

A procura de esportistas por dietas veggie está baseada em alguns fatores. Um deles é que a produção de conteúdos relacionados ao tema extrapolou as universidades e as salas de aula, chegando à TV e ao cinema — um exempo é o documentário que influenciou Huertas e Calderano. Esthela cita ainda a maior oferta de produtos de origem vegetal. “Antes, nós só tínhamos a soja. Era mais restrito."

Passo Atrás

Santos podera que a alimentação à base de plantas é uma via de mão dupla, com questões muito positivas, mas outras que merecem atenção, como a possível carência de micronutrientes como vitamina B12 e ômega-3, cruciais para a prática esportiva.

Para Esthela, não há uma dieta melhor ou pior para um atleta, independentemente do esporte. "Não há regra. O que precisa ser analisado é a resposta do organismo de cada pessoa", ressalta.

Esse é o caso da tricampeã mundial de kitesurf Bruna Kajiya, 35, que foi vegana por quase duas décadas, mas há três anos precisou dar um passo atrás e retomar parte dos velhos hábitos alimentares.

Após realizar exames de rotina, a esportista foi avisada por sua equipe médica sobre a ausência de algumas vitaminas. Em paralelo, percebeu que seu rendimento esportivo havia diminuído. “Liguei o sinal de alerta”, conta.

Mesmo a contragosto, ela seguiu a recomendação para voltar a comer carne uma vez por semana. Escolheu peixes e frutos do mar. Depois de um mês com a dieta, novos exames mostraram que tudo estava normalizado. Hoje, ela se enquadra na categoria dos piscitarianos. "Encontrei um meio-termo e uma alimentação equilibrada que me faz bem."

Quem é o quê

Veganos  não consomem nada que tenha origem animal, seja na alimentação, seja em outros produtos — higiene, limpeza ou vestuário

Vegetarianos  não comem carne, peixe nem aves, mas ingerem alimentos de origem animal — ovos e derivados do leite              

Flexitarianos ou semivegetarianos  são aqueles que apoiam a diminuição do consumo de alimentos de origem animal, mas não são vegetarianos nem veganos.

Piscitarianos
comem uma grande variedade de alimentos à base de plantas, como frutas, verduras, legumes, grãos e nozes — além de peixes e frutos do mar