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Por Clarice Muniz, Especial para o gshow — Rio de Janeiro


Chico Moedas, Luísa Sonza, IZA e Marília Mendonça: o que explica o fenômeno de novos seguidores nas redes sociais após anúncios dramáticos? — Foto: Reprodução/Instagram | Arte gshow

Um movimento causa perplexidade após um famoso fazer uma revelação devastadora. A repercussão do assunto desencadeia uma avalanche na internet. Um exemplo foi o anúncio do término do relacionamento feito pela própria cantora IZA em sua rede social. A cantora, grávida de seis meses, costuma buscar a discrição sobre a vida íntima, mas decidiu falar abertamente sobre o assunto ao se tratar de uma traição com prenúncio de “show de horrores”, como ela mesma definiu.

O vídeo foi postado no fim da tarde de quarta-feira (10). Na manhã seguinte, a artista já havia recebido mais de 1 milhão de novos seguidores. O jogador Yuri Lima, o namorado “traidor”, conquistou mais de 200 mil.

O que acontece quando uma notícia triste, polêmica ou dramática, envolvendo algum nome famoso, vem à tona? O ganho expressivo de novos seguidores nas redes sociais é um dos movimentos mais comuns. E não importa que seja um ídolo ou não, mas a comoção, como uma espécie de acolhimento digital diante da dor, se faz presente.

E até mesmo o algoz é “beneficiado” com o ganho de visibilidade e engajamento, ainda que por curiosos e haters. Foi o que aconteceu também quando Luísa Sonza anunciou o término do seu relacionamento com o influenciador digital Chico Moedas, ao vivo, no programa Mais Você. Os seguidores dispararam. O que explica esse fenômeno?

“De certa forma, esses traços que humanizam as figuras públicas produzem uma certa identificação do público. Se por um lado há a admiração por um acesso extraordinário, com as viagens, festas, carros, por outro lado, é o ordinário e, portanto, universal. É o caso dos términos, doenças e na própria morte que os espectadores encontram os seus ídolos no rosto a rosto”, avalia o psicanalista Leonardo Goldberg, Doutor em Psicologia pela USP e autor do livro "O sujeito na era digital".

Identificação e conexão emocional com as personalidades

De acordo com a psicóloga Alana Anijar, especializada em Terapia Cognitiva Comportamental e apresentadora do podcast Psicologia na Prática, o interesse do público em assuntos como esses é resultado de uma “interação complexa de fatores psicológicos, sociais e culturais”.

“A identificação e conexão emocional pode ser um fator com bastante influência, na medida em que as pessoas se identificam com celebridades e investem emocionalmente em suas vidas, relacionamentos e histórias. Isso pode ser uma forma de escapismo também, onde os problemas pessoais são temporariamente esquecidos enquanto nos distraímos pensando e falando sobre esses problemas de terceiros”, sugere a especialista.

E como a vida dos famosos é vista como uma forma de entretenimento, as notícias sobre suas vidas oferecem uma distração e uma pausa da rotina.

“Além disso, existe a curiosidade natural do ser humano e essa sensação de que famosos têm problemas comuns como todos nós temos, gera bastante engajamento e, em muitos casos, até comparação”, analisa Alana.

Fim de namoro, traições, polêmica, morte de famosos… O que explica o fenômeno de novos seguidores nas redes sociais após anúncios dramáticos? — Foto: Freepik

Fãs se solidarizam com as dores dos famosos: ‘Porém, o equilíbrio é necessário’

Segundo a terapeuta, é importante que cada pessoa esteja atenta às suas próprias motivações para o “envolvimento emocional” com essas notícias, sejam términos de relacionamentos recentes ou duradouros, traições, doenças ou outras notícias comoventes.

“Há quem fique muito abalado e diga ‘não acreditar mais no amor’, por exemplo, ao ver a notícia de um rompimento de um casal famoso pelo qual tinha admiração. Esse tipo de reação pode ser preocupante”, explica Alana, ressaltando que a solidarização com a dor do outro é algo natural do ser humano.

“Porém, é necessário ter equilíbrio em relação a intensidade com que nos relacionamos com essas notícias, especialmente quem já tem uma certa fragilidade emocional”, alerta ela.

Não há como afirmar se para todos esse tipo de interação tenha o mesmo efeito, afinal, como Alana reforça, cada ser humano é complexo: “E reagem de formas distintas, de acordo com sua personalidade, suas vivências, suas crenças…”

Mas ela acredita que, de forma geral, essa identificação com a dor do outro - e mesmo que sejam pessoas distantes do convívio íntimo, como é o caso dos ídolos - é capaz de trazer um certo alívio.

“Uma sensação que chamamos na Psicologia de ‘humanidade compartilhada’, ou seja, não estou sozinho nessa experiência difícil. Porém, percebo que pessoas que já estão mais fragilizadas emocionalmente podem ter seu quadro piorado quando se envolvem demais emocionalmente com notícias trágicas”, acrescenta.

Até anúncios de mortes dos famosos fazem números de seguidores disparar

Muita gente estranha esse fenômeno e considera até doentio, mas a reação dos usuários diante das notícias de morte de famosos, por exemplo, também impressiona. Como no dia em que a morte de Marília Mendonça foi anunciada, vítima de um acidente trágico de avião.

O perfil da cantora no Instagram ganhou mais de 2 milhões de seguidores em menos de 24 horas. No caso de Gugu Liberato, o número de novos usuários na sua conta passou de 1 milhão. A conta de Rita Lee, por exemplo, cresceu em 220 mil no dia em que sua morte foi noticiada.

“Pela própria lógica das redes, quer dizer, que são pautadas pela ideia de desfazer as fronteiras entre o público e o privado, é um efeito natural e até esperável que os usuários se interessem pelo trágico que acomete tanto o vizinho quanto o famoso”, afirma Leonardo Goldberg.

Autor do livro “Das Tumbas às Redes Sociais”, no qual examina as atitudes das pessoas diante da morte a partir do advento das redes sociais, Leonardo Goldberg aponta que as redes sociais atualizam a noção humana de tanatografia (que são as escritas sobre a morte).

“Quando alguém amado morre, é comum que a gente escreva notas fúnebres, epitáfios, elogios e até críticas ao morto. Nas redes sociais, os perfis acabam servindo para a realização do rito fúnebre, através dessas mensagens ao morto ou à comunidade, que têm como função a elaboração, o trabalho de luto que seus fãs precisam realizar”, pondera.

E não basta dar um follow nos perfis oficiais dessas personalidades. Muitas mensagens de adeus e homenagens são deixadas como registros nos últimos posts, mas também nos mais antigos. “É um fenômeno interessante. As redes sociais têm esse papel de escapismo da realidade”, sugere a psicóloga sobre uma possível ação justificada como válvula de escape.

“O fato do perfil ainda existir, mesmo após a pessoa ter falecido, e existir a possibilidade dessa ‘interação’, pode dar essa falsa sensação de que ainda é possível se comunicar com essa pessoa. O efeito disso é muito pessoal, pode ser que ajude a minimizar o luto para algumas pessoas, enquanto para outras, torne ainda mais difícil processar a perda”, avalia.

Fim de namoro, traições, polêmica, morte de famosos… O que explica o fenômeno de novos seguidores nas redes sociais após anúncios dramáticos? — Foto: Reprodução/Instagram

Envolvimento com as dores dos famosos pode afetar a saúde mental?

É importante ter atenção se as dores, crises e problemas pessoais compartilhados e repercutidos nas redes sociais pelos famosos não estão afetando o seu emocional de maneira muito intensa. E não é o caso de ser indiferente à dor do outro, conforme esclarece a psicóloga.

“O escapismo deixa de ser apenas um entretenimento e passa a ser mais uma fonte de sofrimento para pessoas que, muitas vezes, já estão lidando com diversos problemas em suas vidas pessoais e, agora, precisam administrar mais essa demanda que está totalmente fora do seu controle. Esse turbilhão de informações, com certeza, tem contribuído para problemas de saúde mental”, alerta Alana Anijar.

Leonardo Goldberg acrescenta que, nos casos de mortes e despedidas, esse comportamento pode ser visto como uma forma positiva para amenizar a dor. “Esse interesse e essas mensagens servem para elaborar o luto, criar novas redes, com outros enlutados, por exemplo, e apaziguar o sofrimento diante da morte. Toda forma de escrever sobre a dor, endereçar aos outros, pode ser bastante importante nesse momento de luto”, avalia o escritor.

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