O exemplo dos cidadãos de Santana de Acaraú na semana em que os bárbaros atacaram a democracia nos EUA

Na mesma semana que a maior e mais longeva democracia do mundo era atacada por bárbaros que, seguindo as ordens de seu grande líder, invadiram de forma violenta o Capitólio, bem distante de lá, aqui no Hemisfério Sul, um grupo de cidadãos ocupava seu espaço no Palácio Legislativo Vereador José Ananias Vasconcelos —- o  título de palácio soa exagerado diante do tamanho do imóvel que abriga a Câmara Municipal de Santana de Acaraú, apesar de sua fachada em pedras escuras que destoam do padrão na cidade, mas segue o protocolo político no Brasil em que as casas que recebem os três poderes  tendem a ser assim reconhecidas.

Santana de Acaraú fica ao Norte do estado do Ceará, distante 228 quilômetros da capital, Fortaleza, e bem mais próxima de Sobral. Por lá moram cerca de 30 mil pessoas que, em novembro do ano passado elegeram o prefeito e seus 13 vereadores —- todos já empossados e trabalhando. Foi na sessão de sexta-feira, dia 8, único dia da semana em que o parlamento se reúne, provavelmente para não atrapalhar as funções profissionais que os vereadores seguem exercendo, quatro cidadãos santanenses se apresentaram na Casa e pediram direito a fala.

De máscara —- não para se esconder; para cumprir o protocolo sanitário —- o professor da rede pública Paulo Roberto, escolhido para falar em nome do grupo, foi ao púlpito, sacou do bolso um roteiro feito em papel e usou da arma mais poderosa que ele e seus colegas têm à disposição: a palavra. Sim, foi com palavras ponderadas ao mesmo tempo que firmes, respeitosas mas sem serem subservientes, que ele apresentou aos parlamentares o movimento cidadão que planejavam implantar desde o fim das eleições em novembro.

Inspirados no Adote um Vereador, criado em 2008 na cidade de São Paulo, os santanenses —- 16 deles até aqui —- se reuniram e assumiram o compromisso de fiscalizar os vereadores desta legislatura que se inicia em 2021 e vai até 2024. A intenção é que, coletivamente, monitorem os projetos apresentados, discutidos e aprovados, cobrem a presença efetiva dos parlamentares nas sessões em plenário e nas reuniões das comissões permanentes, observem se os vereadores estão exercendo seu principal papel, que é o de fiscalizar o Executivo ou estão apenas se beneficiando do próprio; e fiquem de olho se o dinheiro do Legislativo está sendo usado ou abusado. Aplaudido pelos vereadores ao fim da fala, o grupo ouviu mensagens de apoio e colaboração com o trabalho que estão iniciando.

Foi um encontro amistoso, como se espera continue sendo a relação entre os legisladores e seus representantes. Moderação é uma das quatro virtudes que Platão entende que devem ser harmônicas para que a justiça seja alcançada. Aos integrantes do Adote, em Santana de Acaraú — os que estão com o grupo desde o início e os que ameaçam juntar-se a ele —,  caberá exercitar as outras três virtudes da mesma forma, para que superem os obstáculos que virão —- tenham certeza, eles sempre aparecem. Coragem, sabedoria e a própria justiça também serão necessárias para o momento em que o interesse fiscalizador do grupo entrar em choque com os interesses paroquiais de vereadores.

Digo isso, porque a reação inicialmente positiva dos parlamentares não deve iludir os integrantes do Adote —- nem em Santana de Acaraú nem em qualquer outro canto deste país. A medida que se começa a expor a maneira como os temas de interesse da cidade são debatidos e votados, as intenções que movem as escolhas feitas pelos vereadores e, principalmente, como eles se comportam no exercício da função, haverá de surgir represálias, críticas e tentativas de divisão. É do jogo político, no qual os profissionais da política conhecem bem as regras e as artimanhas. Nós cidadãos estamos em processo de aprendizado. 

Uma questão que poderia ser debatida na cidade do interior do Ceará —- e levada a todos os demais municípios —- é o vencimento dos parlamentares que por lá beira os 7 mil reais, levando a Câmara a gastar cerca de 96 mil reais por mês somente com a folha de pagamento dos vereadores, conforme levantamento publicado no site da casa. Esse valor está muito acima da média salarial da cidade e supera o PIB per capita do município, que é de R$ 6.550,00, de acordo com dados do IBGE. Se o assunto vai para a pauta ou não, é uma decisão dos cidadãos santanenses, mas é um bom exemplo de como nem sempre os interesses pelo que é melhor para a cidade e as pretensões dos parlamentares estarão sintonizados nessa jornada.

Moderação, coragem, sabedoria e justiça serão virtudes a serem praticadas  diariamente para que a política — não aquela só feita por partidos e poderosos — se realize em comunidade.  A presença do cidadão na “praça pública” que deve ser a Câmara Municipal sinaliza que podemos exercitar a política de uma forma diferente, distante da intolerância que tem dividido o Brasil e resultou na violência contra a democracia americana. O Adote um Vereador em Santana de Acaraú é um sopro de esperança a todos que acreditamos na ideia de que o homem não se basta a si mesmo, está destinado a viver em sociedade, porque somos animais políticos por natureza —- como nos ensinou Aristóteles.

Alecir, um cidadão que reclamava por amor

Lá se foi nosso Alecir. Companheiro de primeira hora no Adote um Vereador, perdeu a batalha contra Covid-19. O coração sempre apaixonado pela mulher Virgínia e pela sobrinha Amanda tanto quanto pelas lutas em favor da cidadania não resistiu o esforço para respirar e o tempo de internação. Nesta madrugada, morreu aos 62 anos, em São Paulo.

Alecir Macedo esteve na primeira reunião do Adote, mais ou menos nesta mesma época do ano, em 2008, quando sentamos juntos em torno das mesa do Centro Cultural São Paulo. Eram lá os encontros presenciais que surgiram por iniciativa daqueles que aceitaram o convite para que atuássemos no controle do trabalho dos vereadores da nossa cidade. 

Depois fomos para o Pateo do Collegio. E o Alecir foi junto com a gente. Muitos ficaram pelo caminho. Desistiram da luta, mudaram o foco de atuação, desacreditaram no nosso trabalho ou tinham mais o que fazer na vida. O Alecir, não. Todo segundo sábado do mês costumava ser o primeiro a chegar depois de uma longa jornada de ônibus e metrô que se iniciava na Vila Nova Cachoeirinha, na zona norte de São Paulo, onde morou por mais de 40 anos —- na época em que desembarcou na Cachoeirinha ainda existia a água correndo que dava nome ao bairro, me contou uma vez.

Alecir é de Jaguariaíva, interior do Paraná, onde também existem  cachoeiras. Chegou a São Paulo, em 1978. Sem dinheiro nem conhecimento e apenas com o convite de um cunhado, deixou a mulher e o filho pequeno na casa da mãe e se bandeou para a capital paulista. Aqui tinha apenas a indicação do parente: “desce perto do hospital da Vila Nova Cachoeirinha, atravessa a avenida e pergunta por mim no bar do outro lado”. Eram seis da manhã. O bar estava fechado. Sorte que o cunhado havia comentado que para chegar no endereço dele, bastava atravessar a avenida nova — a Inajar de Souza —- e procurar a casa verde, no alto de um barranco: “é a quarta casa”. Na divisa com a favela da Divineia.

O instinto de sobrevivência o fez encontrar o lugar, e do lugar arrumou emprego de auxiliar do departamento pessoal em uma transportadora, na avenida Marques de São Vicente. Lá trabalhou por 12 anos até chegar ao cargo de gerente de filial. Nem enchente nem todo tipo de encrenca que encontrou pelo caminho — e desde novo fazia questão de denunciá-las —, atrapalhou a construção de uma relação que se transformou em paixão pelo bairro.

Nosso amigo era um tipo curioso: poucos reclamavam tanto quanto ele; mas sempre reclamou por amor. Pelo verde da praça que os “nóias” ocupavam na frente de casa; pelo meio ambiente que os carros poluíam e as pessoas desrespeitavam; pela calçada que as concessionárias tornavam irregular; pelo céu que os prédios encobriram; pela cidade, que os políticos não cuidavam.

Ah, os políticos! 

Controlá-los e cobrá-los era seu esporte preferido. Enquanto pode, foi a Câmara para assistir às sessões, fuçou nas reuniões de comissões e tomava a palavra nas audiências públicas. De casa, monitorava os parlamentares pelo computador, gravava as imagens geradas pela TV Câmara na internet, editava vídeos, denunciava abusos e absurdos ditos em plenário, reproduzia brigas e publicava tudo no blog que levava o nome da Vila Nova Cachoeirinha. Quando percebia a ausência de algum vereador no trabalho, mandava e-mails e cobrava a resposta.  Na rua, fotografava a falta de semáforo, de luz, de cuidado e de respeito — enviava para jornais e vereadores.

Por amor, esteve com a gente até quanto pode. Até ser superado pelo desânimo há cerca de um ano. Mesmo assim, nos falávamos por telefone e trocávamos mensagens. Ele me ajudava a manter o site do Adote um Vereador que criou lá no início da nossa história. Até recentemente dava seus pitacos. Dia desses li e me ri: “político fazendo campanha de máscara economiza óleo de peroba…”, escreveu em uma rede social. Foi na rede que encontrei, também, como ele se definia: “cidadão brasileiro, com muito orgulho, cansado de sofrer nas mãos de políticos inescrupulosos”. 

Alecir se foi. Era um amigo. Sincero como devem ser os amigos. Engraçado de tanto que reclamava. Um daqueles caras que deixará saudade eterna pelo abraço que me dava, pelo carinho que sempre demonstrou e pelos puxões de orelha diante da minha desatenção a algo dito no rádio —- sim, além de tudo era um ouvinte frequente dos meus programas, desde os tempos do CBN São Paulo.

Se o Adote perdeu uma referência e São Paulo, um cidadão, posso lhe garantir que Deus arrumou sarna para se coçar. Mas não se incomode, Senhor: quando ele reclamar vai ser por amor!

Ouça o Conte Sua História de São Paulo, escrito por Alecir Macedo, que foi ao ar em abril de 2013

Adote um Vereador: “o eleitor esquece em quem votou e os eleitos esquecem por que foram escolhidos”

“O eleitor esquece em quem votou e os eleitos esquecem por que foram escolhidos”

A frase é de Edson Vismosa, presidente do Instituto ETCO, em artigo escrito para a Bússola, boletim informativo da agência de comunicação FSB, e está sintonizada com o que pensamos no Adote um Vereador, desde que esta ideia surgiu, em 2008.

No fim de semana, virtualmente, voltamos a nos encontrar para troca de percepções sobre o resultado da eleição administrativa, na qual foram conhecidos os 55 vereadores da cidade de São Paulo.

Já conversamos com você sobre a renovação no parlamento paulistano: 40% dos eleitos não ocupavam cargo no legislativo no mandato em vigor. Além de o índice estar muito próximo do que costuma ocorrer nas eleições municipais, também não significa que possamos falar em renovação da casa legislativa. Alguns dos eleitos já tinham ocupado uma cadeira na Câmara Municipal em legislaturas anteriores.

Independentemente dessas figuras carimbadas que retornaram após um período “sabático” e do fato de que outros eleitos são ligados a famílias de políticos paulistanos, o começo de uma legislatura sempre desperta interesse e curiosidade do cidadão —- do cidadão engajado, claro, que é uma minoria no Brasil. A maior parte age como Vismosa descreve na frase que destacamos na abertura deste texto.

O advogado que já ocupou o cargo de secretário da Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo vai além na sua preocupação quanto aos parlamentares eleitos — e não apenas na capital paulista:

“E, para piorar, se constata o avanço da ação de organizações criminosas que vão deixando as chamadas “franjas” da sociedade e procuram não só influenciar as decisões políticas mas exercê-las diretamente, dominando territórios, se financiando com o mercado ilegal e procurando assumir o poder político.

Essas eleições municipais demonstraram, como nenhuma outra, a luta política exercida de modo violento por milícias e organizações criminosas para garantir a eleição de seus cooptados.

Temos assim outros candidatos a “donos do poder”, que se entrelaçam, ameaçando o Estado Democrático de Direito e influenciando nossos destinos sem qualquer preocupação com valores e princípios da cidadania. O ideal republicano fica distante, a defesa do interesse nacional parece uma utopia, e a garantia de privilégios é o objetivo”

A renovação meia-boca que o eleitor proporcionou; a conivência de parlamentares com o Executivo, esteja na mão de quem estiver; e o avanço do crime organizado em cargos de poder —- como relata Vismosa — tornam ainda maior o desafio dos cidadãos interessados em transformar o ambiente urbano em lugares mais justos e generosos. 

O grande risco é que após cada eleição, a percepção de que não temos força suficiente para mudar o cenário político, afaste ainda o cidadão, e crie um vazio que será ocupado por quem sobrepõe o interesse pessoal à causa pública.

A nos esperançar estão as palavras de renovação de entusiasmo dos integrantes do Adote um Vereador, sábado passado. Eram poucos os reunidos no cenário virtual, mas muitos os desejos de uma vida melhor para a nossa cidade.

Os vereadores eleitos de SP: quem são e o que dizem

Os 55 vereadores de São Paulo já são conhecidos e foram resultado da escolha feita por 6.354.100 eleitores, que nas urnas votaram em legendas, nomes, em branco ou anularam —- podemos colocar nesta conta também mais 2.632.587 pessoas que não compareceram às urnas, registrando recorde no índice de abstenção: 29,29%. Todos que fizeram suas escolhas ou abriram mão de fazê-la deixando que os outros decidissem por eles, são responsáveis pelos nomes que assumirão o legislativo.

Para conhecer um pouco mais quem são esses vereadores — 60% deles já ocupavam cargo no legislativo municipal —, abaixo relacionamos os 55 eleitos, com nome, número de votos, partido, idade, gênero, raça, estado civil, grau de instrução e profissão.  19 dos vereadores que estão na lista também responderam a pergunta que havia sido feita pelo jornal O Globo, em plataforma para o eleitor identificar com quais candidatos estava mais sintonizado. Tem o espectro político do candidato, uma mensagem e três prioridades do mandato.

Veja a lista, identifique quem é quem, e esteja consciente de que independentemente de serem aqueles que nós escolhemos, são eles que nos representarão entre 2021 e 2024 e temos o dever de fiscalizar o que fazem, pois quando o fazem tanto podem influenciar na qualidade de vida na cidade em que moramos quanto o fazem com o nosso dinheiro. Então, olhe a lista e adote um vereador (saiba como neste site).

(a lista está separada por partidos, na ordem da maior para a menor bancada)

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Adote um Vereador: acreditamos em você e na Democracia!

Por Mílton Jung

Do Adote um Vereador

Texto escrito originalmente para o site Adote Um Vereador

Ao surgir em 2008, o Adote um Vereador era pretensioso, queríamos mudar a política da sua cidade. Sonhávamos com grupos de pessoas controlando cada um dos nossos vereadores, compartilhando informações sobre o trabalho de fiscalização que realizamos e influenciando as decisões no parlamento. Queríamos construir uma grande rede de cidadãos com força e competência para chacoalhar a maneira de se atuar no legislativo municipal. Imaginávamos vereadores respeitando a opinião publica —- pelo medo ou pelo convencimento. Aceitando conchavos —- no seu sentido maior, de entendimento com as partes, de união, de combinação —- apenas com os moradores da cidade, jamais mancomunados intramuros. 

Nos primeiros anos, tínhamos o entusiasmo dos novatos, a crença dos inocentes e a certeza de nossa força. Lembro que logo no início passamos a ser procurados por vereadores recém-eleitos, uma gente que não entendia bem o que queríamos. No plenário houve quem nos “acusasse“ de ter a intenção de controlar os vereadores “legitimamente eleitos pelo voto popular”. Confessamos nossa culpa. Era esse mesmo o nosso querer, até porque eles foram legitimamente eleitos pelo voto popular.

Fui convidado para dar explicações em uma das salas de evento do Palácio Anchieta, em São Paulo. Sentei-me diante de uma plateia em uma mesa grande, antiga, quase tão antiga quanto os maus hábitos  de fazer política naquela casa. Queriam saber quem nos financiava, o que estava por trás de nosso trabalho, por que fiscalizar se os vereadores não eram bandidos? Como não tínhamos um tostão movimentado nem para o cafezinho dos amigos, não havia o que temer. Apenas expliquei que o que queríamos era algo ainda mais antigo do que aquela Casa em que estava, aliás, mais antigo até do que a primeira casa de pilão que sediou a Câmara Municipal, em 1787: fazer Política.

(você sabia que na primeira sede também funcionava a cadeia — e um açougue?)

Com o tempo, assistimos a mudanças bem importantes na Câmara Municipal de São Paulo: avançou-se na transparência, teve-se acesso facilitado às contas dos gabinetes; ganhou-se o direito de assistir pela internet às sessões das comissões parlamentares, entre outras mudanças —- acredite, era bem pior. Também aprendemos muito: como tramitava o projeto, como se emperrava uma votação; como se pedia uma informação; porque até hoje aprovam muito mais comendas, prêmios e nomes de rua do que qualquer coisa mais importante para a cidade; e como, sendo tão poucos, incomodávamos os vereadores.

O passar do tempo também nos ensinou como é difícil manter uma massa de pessoas mobilizada e garantir o engajamento de cidadãos, por mais indignados que sejamos. Com a proximidade das eleições municipais —- tem sido assim desde o início dos tempos do Adote —-, a procura por informações do nosso projeto aumenta; assim que o nome dos eleitos é anunciado, muitos se dispõem a fiscalizar o trabalho deles; quando discutem projetos como aumento do IPTU ou qualquer medida que possa mexer no bolso do morador da cidade, tendemos a ser mais assediados por contribuintes indispostos com a Câmara Municipal. A febre baixa, a gripe se vai e o vírus da política que parecia ter contaminado as pessoas é inoculado.

De vez em quando, surge um sopro de esperança: um grupo lá longe, em uma cidade para a qual nunca fomos apresentados, se inspira na nossa ação e passa a olhar para o legislativo com uma lupa. É revigorante. Passamos acreditar que é possível. Que vale a pena! Que fizemos algo pela sociedade.

Eu, em especial, recebo uma pequena dose de entusiasmo todo segundo sábado do mês, quando percebo que ainda somos alguns dispostos a se reunir e discutir a política na cidade. Pena que neste 2020, a pandemia nos fez distantes, mesmo que mantidas as reuniões online — o que talvez explique um pouco do desânimo que me marcou nesta temporada em que completamos 12 anos de Adote um Vereador.

Sou menos pretensioso do que fui em 2008 —- o que não significa que o Adote tenha deixado de sê-lo. Ainda nesses dias, um dos nossos escreveu: “temos credibilidade e conhecimento”. Fiquei feliz em ver que há os que creem na nossa capacidade, mesmo que eu seja um eterno desconfiado da força das palavras. 

Se tenho algo a comemorar é que entre o ânimo que chega a conta-gotas e a desilusão que cai como ducha de água fria, persistimos. E se o fazemos é porque acreditamos nesta jovem democracia brasileira, tantas vezes interrompida. Que apesar das restrições ao voto, tentava se expressar na Primeira República —- essa que comemoramos neste domingo, 15 de Novembro. Que escapa pelas mãos na Revolução de 30 com a suspensão das eleições; que tenta se reerguer mas é incapaz de resistir em pé por mais de três anos; que sofre até o fim do Estado Novo e volta a ser atacada na Ditadura Militar. Acreditamos na Democracia reescrita na Constituição de 1988, que dá o direito a mais de 147 milhões de eleitores seguirem, hoje, o caminho das urnas para renovar o seu voto, em 5.568 cidades brasileiras.

Se acreditamos na Democracia, é porque acreditamos em você que a mantém firme e forte — a despeito dos antidemocratas de plantão. Acreditamos no cidadão que ao sair de casa neste domingo o fará consciente da sua responsabilidade e da importância que é escolher seu representante no Executivo e no Legislativo.

Renove nossa crença: vote! Vote consciente!

Leia outras informações sobre como votar neste domingo

Adote um Vereador: por que vereadores aprovam leis inconstitucionais mesmo sabendo que são inconstitucionais?

Texto escrito originalmente para o site Adote um Vereador SP

Nós já sabemos para que serve o vereador, não sabemos? Ok, não custa lembrar: criar leis, fiscalizar o Executivo e promover discussões que levem a melhoria da sua cidade. Para cumprir esses compromissos que assume no momento em que toma posse —- eu diria até antes, pois se vai pedir o seu voto está subentendido que ele se comprometera em exercer corretamente a função para a qual foi escolhido pelo cidadão —- é necessário que algumas regras e limites sejam levados em consideração: todos devidamente escritos na lei.

Nem todo projeto de lei cabe ao vereador —- mesmo que todos os projetos de lei municipal tenham de ser aprovados pela maioria deles para se transformar em lei. Assim como nem todas as leis cabem ao município — mesmo que muitas delas impactem o cotidiano do cidadão.

Por exemplo, há regras que são federais e outras estaduais. Lei de trânsito é uma delas: se a União decide que todos temos de usar cinto de segurança para dirigir automóvel, não pode o prefeito e a Câmara Municipal votarem projeto de lei que libera os moradores a circularem de carro sem o cinto. 

Outro fator limitante para as ideais defendidas pelo vereador é que os projetos de lei devem indicar a fonte de receita para arcar com os custos do que foi aprovado. Ou seja, não cabe ao vereador isentar setores da economia de pagamento de impostos ou obrigar a prefeitura a contratar funcionários.

Apesar disto ser sabido e alertado, reportagem de O Globo, publicada no domingo, mostra que os vereadores de Rio e São Paulo têm passado dos limites: 267 leis aprovadas nas câmaras municipais foram declaradas inconstitucionais desde 2009 —- 177 no Rio e 90 em São Paulo. 

Para ter ideia: na capital paulista, o órgão Especial do Tribunal de Justiça considerou inconstitucional uma lei de 2015 que proibia veículos particulares de fazerem transporte de passageiro por meio de aplicativos; na capital fluminense, foi derrubada nos tribunais a lei que proibia cobrança de pedágio para taxistas.

O que é interessante saber disso tudo para que se tenha um olhar crítico mais apurado sobre o trabalho e o caráter do vereador:

Primeiro, que o projeto de lei para chegar ao plenário e ser votado passa pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Municipal. Ali, todos esses projetos que são claramente inconstitucionais deveriam ser barrados para evitar que se perca tempo e dinheiro com a discussão e ainda pressionar os tribunais com mais processos. O problema é que a comissão não cumpre sua função: os projetos passam para atender interesses de um ou outro vereador.

Segundo, que a Câmara mesmo que seja alertada no meio do caminho de que o projeto é inconstitucional também aprova alguns projetos como troca de favor: eu aprovo o seu projeto e você aprova o meu. 

Terceiro, e mais importante: o próprio vereador que apresentou o projeto que será considerado inconstitucional, muitas vezes, sabe que é inconstitucional. Então por que apresenta? Pra jogar para a galera. É isso mesmo. Sabe que ao apresentar o projeto vai agradar determinado grupo que poderá ajudá-lo na eleição seguinte. Mesmo que depois a lei seja vetada pelo prefeito ou derrubada nos tribunais, ele mantém o discurso: eu fiz por vocês, eles é que são contra vocês.

É assim que a banda toca. Portanto, o cidadão tem de estar atento para essas manobras e antes de bater palma para algum candidato que está prometendo mundos e fundos, é bom saber se ele tem todo esse poder que acreditar ter.

Leia mais: https://www.adoteumvereadorsp.com.br/news/saiba-qual-e-o-limite-de-um-vereador/

Adote um Vereador: quanto e como o seu vereador gasta em verba de gabinete, em SP

 

Texto escrito para o site Adote um Vereador

Saber como o vereador usa o dinheiro público é uma excelente maneira de avaliar a qualidade e a produtividade do trabalho para o qual foi eleito. A conta não é objetiva, tem de cruzar com outros dados, como projetos de lei relevantes apresentados e aprovados, fiscalização efetiva do Executivo e participação ativa na transformação da cidade. Sem contar que gastar mais ou gastar menos nem sempre é prova de excelência. Há vereador que nada faz, portanto gasta pouco. Há quem seja ativo e gasta mais. Dito isso, a minha sugestão: olhe onde e como o dinheiro é usado; isso sempre nos dá alguma pista de quem é quem na Câmara.

Observatório Social Brasileiro monitorou os registros de gastos na Câmara, nos anos de 2017, 2018 e 2019. Mesmo com uma série de barreiras no caminho, por falta de transparência e acessibilidade nos dados fornecidos pelo legislativo paulistano, foi possível perceber que os gabinetes dos vereadores não têm um padrão em relação ao uso do dinheiro e têm alguns gastos difíceis de justificar. Mais do que isso: diante de dúvidas e negativas de informação sobre contrato mantido pela Câmara com os Correios, o OSB entrou com denúncia contra o legislativo no Tribunal de Contas do Município, em julho deste ano. Aguarda retorno do TCM — que seja breve.

Tem uma planilha completa à disposição do eleitor, preparada pela OSB, com a ajuda de voluntários e universitários, na qual é possível identificar o gasto médio anual de cada vereador. Em linhas gerais, a Câmara gastou cerca de R$ 12 milhões por ano com verbas de gabinete —- fora o salário dos funcionários.  Verba de gabinete que tem como nome oficial Auxílio-Encargos Gerais de Gabinete.

O  item em que boa parte do dinheiro se vai é na contratação de Pessoas Jurídicas —- em média R$ 2,7 milhões por ano —-, o que chama muito atenção pois os vereadores já tem um corpo de funcionários no gabinete, sem contar os próprios servidores do legislativo que prestam uma série de serviços e consultorias. Em muitos casos, os gastos se repetem mês a mês, em limites próximos da dispensa de licitação. Sabe como é que é, né? Melhor pagar um pouquinho menos e contratar quem eu quero do que ser obrigado a fazer uma concorrência e o serviço ficar na mão de sei lá quem.

Entendeu? Para que ninguém desconfie de que tem gente se aproveitando do dinheiro público, o OSB decidiu investigar mais a fundo esses valores e, em breve, deve apresentar o resultado deste trabalho.

Ainda se gasta muito com correio e gráfica, mesmo que boa parte da comunicação possa ser feita de forma eletrônica e mais barata. Com serviços de composição, diagramação e gráfica, se vão cerca de R$ 2,7 milhões; e com os Correios, em torno de R$ 1,3 milhão.

Quando se olha a planilha por vereador —- sem fazer nenhum juízo de valor, ok —-, alguns números que se destacam:

O vereador que mais usou verba de gabinete ao longo da legislatura foi Zé Turin, hoje no Republicanos: R$ 308.504,98 por ano, em média. Adivinha para onde foi a maior parte desta grana? Cerca de 40% para a contratação de PJ —- sempre naqueles valores que ficam no limite da necessidade de fazer licitação. Para você não perder tempo com contas de cabeça: R$ 125 mil e uns quebrados, em média, por ano.

O segundo nome que mais gastou dinheiro desta verba foi Noemi Nonato (PL): R$ 286.044,73, em média, por ano. Um terço deste valor (R$ 90,8 mil) para contratação de PJs. 

O Rei dos Correios — sem ofender —- foi Abu Anni (PSL). Ninguém registrou mais gastos neste item do que ele: R$ 121.093,00. O vereador foi eleito deputado federal em 2018 e, portanto, desde 2019 dá expediente em Brasília. 

Chama atenção na lista o fato de que os vereadores parecem não gostar muito de usar carros de aplicativos. Só dois vereadores usaram esse serviço até 2019: José Police Neto (PSD) que teve ressarcidos R$ 1,4 mil; e  Eduardo Suplicy (PT),  com R$ 626,30. 

Carro alugado, custos com lavagem e ressarcimento por combustível queimado gastam muito mais. E são a preferência da turma: cerca de R$ 1,9 milhão.

Antes que alguém fique com cara de bravo para gente, reforço o que escrevi antes: gastar mais ou gastar menos não é declaração de honestidade ou safadeza. No entanto, com os números reunidos sempre dá para refletir melhor sobre quais são as prioridades de cada um e como o vereador preza o respeito ao dinheiro público.

A saber: cada vereador dispõe, de uma verba de até R$ 310.612,56 (média mensal de R$ 25.884,38) destinada ao custeio de serviços gráficos, correios, assinaturas de jornais, deslocamentos por toda a cidade e materiais de escritório, entre outras despesas, no ano. O vereador paga a despesa, pega a notinha e pede o ressarcimento da Câmara. 

Muitos desses recibos estão registrados e com acesso ao cidadão. Porém, quase todos em PDF o que dificulta cruzamento de dados. Alguns você não encontra. Por isso o trabalha do OBS é tão importante. Vai que algum vereador tenha se perdido nas contas e pediu para se ressarcido por dinheiro que não foi gasto. 

Acesse aqui o site do OBS e verifique quanto o seu vereador gasta da verba de gabinete.

Leia mais: https://www.adoteumvereadorsp.com.br/news/quanto-e-como-o-seu-vereador-gasta-a-verba-de-gabinete/

Adote um Vereador: e aí, candidato, vai encarar???

Texto publicado pelo site do Adote um Vereador SP

Desde cumprir o que já está na lei até mudar comportamentos na prefeitura e na Câmara Municipal. Uma lista de compromissos, elaborada por quatro grupos de cidadãos que monitoram o trabalho dos políticos na cidade de São Paulo, será colocada à disposição dos partidos para que seus candidatos assinem e se comprometam em levar as ideias adiante ao se elegerem para a prefeitura ou para a Câmara Municipal de São Paulo. 

O “Termo de Compromisso para Candidato” foi uma iniciativa do Observatório Social do Brasil, seção São Paulo, com o apoio do Adote um Vereador, do Voto Consciente e do Movimento Contra a Corrupção Eleitoral. Os compromissos elencados são considerados relevantes para o alcance da transparência e para a preservação de irregularidades e do desperdício de recursos públicos. A intenção é colaborar com a eficiência do gasto público e dos serviços prestados à população.

Entre os 15 compromissos propostos, os candidatos a prefeito não devem nomear para cargos comissionados agentes públicos ou cidadãos que sejam réus em ações criminais ou de improbidade administrativa com condenação em segunda instância —— é a Ficha Limpa para comissionados.

Pede-se que os Conselhos Municipais tenham voz ativa nas decisões da prefeitura e a retomada do conselho participativo no Orçamento. Se eleito, o candidato também tem de tornar regra a divulgação de relatórios mensais sobre como o dinheiro público está sendo usado pelas subprefeituras em formato simples e com linguagem acessível ao cidadão —- o que reforça lei já aprovada na Câmara que exige que os textos oficiais do município sejam escritos de maneira simplificada.

Para os candidatos a vereador, o termo prevê 17 ítens, dentre os quais um que determina que o parlamentar se obriga a seguir os pareceres do Tribunal de Contas do Município em relação as contas da prefeitura. É comum os vereadores aprovarem, por interesse político, as contas do Executivo, quando técnicos do TCM identificaram irregularidade em pagamentos e repasses.

Dar prioridade às votações nominais e promover a redução da verba anual de Auxílios de Encargos Gerais de Gabinete durante o mandato também aparecem na lista de pedidos das entidades.

Um documento está sendo enviado aos partidos; mas todos os candidatos individualmente podem assinar o termo e torná-lo público em suas redes sociais. O Observatório Social do Brasil vai reunir este material para que o cidadão cobre do candidato quando eleito. 

Para ler a lista completa de compromissos propostos aos candidatos, acesse os links abaixo. 

Você pode nos ajudar a fazer com que os candidatos assumam esses compromissos.

Copie os termos de compromisso e envie para os candidatos que você conhece. Depois, envie para o e-mail [email protected]

Copie aqui o Termo de Compromisso para candidatos a vereador 

Copie aqui o Termo de Compromisso para candidatos a prefeito

Leia mais: https://www.adoteumvereadorsp.com.br/news/entidades-pedem-que-candidatos-assumam-compromissos-com-transparencia-e-eficiencia-do-servico-publico-antes-das-eleicoes/

Adote um Vereador: STF decide que Câmara tem o direito de criar os Conselhos de Representantes

Imagem: arquivo STF

 

Texto originalmente escrito pelo site Adote Um Vereador

Os Conselhos de Representantes nas Subprefeituras têm o direito de participar dos processos de planejamento da cidade e são instrumentos legítimos de fiscalização dos atos da prefeitura, segundo decisão do Supremo Tribunal Federal.  Uma decisão que se estende para todos os municípios brasileiro.

A Câmara Municipal de São Paulo havia aprovado lei para implantação dos conselhos, que foram criados e iniciaram atividades, tendo ficado em segundo plano, seja por falta de estrutura e de interesse da prefeitura seja pelos questionamentos jurídicos à decisão do legislativo. 

O Tribunal de Justiça de São Paulo havia declarado a inconstitucionalidade dos artigos 54 e 55 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, que cria os Conselhos de Representantes, e a Lei Municipal 13.881/2004, que trata da criação, composição, atribuição e funcionamento dos conselhos. Entendia que houve interferência indevida pela Câmara em atividade da Prefeitura. Ou seja, quem tinha de propor a criação dos Conselhos era o Executivo e não o Legislativo.

A Procuradoria da Câmara Municipal de São Paulo recorreu ao STF. Em julgamento virtual, encerrado no dia 9 de outubro, os ministros decidiram por 6 votos a 5 que é legal, constitucional, a possibilidade de o Poder Legislativo editar lei para criar conselhos compostos pela sociedade civil para fiscalizar as atividades do Executivo. O voto de desempate foi um dos últimos do decano Celso de Mello, ministro que se aposentou semana passada do cargo ocupado há 31 anos.

“A cidade só tem a ganhar se o cidadão tem mais mecanismos para acompanhar a política local, seja na Câmara ou na Prefeitura”,  disse a chefe da Procuradoria da Câmara Municipal de São Paulo, Maria Nazaré Lins Barbosa.

Eis aí mais um elemento a ser cobrado dos candidatos à prefeitura de São Paulo:

Como seu candidato pretende criar estrutura e apoiar o funcionamento dos Conselhos de Representantes, agora que a atuação é considerada legal?

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Adote um Vereador: o Chico da Cueca e a lição que não aprendemos

Senador Chico na foto da Agência Senado

 

Texto publicado originalmente para o site Adote um Vereador

O 15 de outubro, tão querido no nosso calendário por ser o Dia do Professor transformou-se neste estranho ano de 2020 em Dia do Deboche …. Não houve uma santa alma, por mais santa que tenham sido nossas professoras na infância para aguentar os diabinhos que fomos, que escapou de fazer alguma referência ao Chico da Cueca em todas as suas versões.

Graças à parte, é preciso olhar o caso com a devida seriedade para como bons alunos aprendermos a lição. Chico, o Senador da Cueca, que publicou nota dizendo que sempre teve uma vida limpa e se afasta da vice-liderança do Governo para provar sua inocência, não é neófito em escândalos de corrupção.

Já teve o mandato de Governador cassado no TRE de Roraima, em 2014;   quando foi deputado federal se envolveu na Farra dos Combustíveis. Para cobrir gastos de almoço, jantar e outros quetais dava baixa como gastos de combustível e assim tinha o direito de ser ressarcido pela Câmara dos Deputados —- sim, nós pagamos os quetais.

Na época, disse que o ato não era legal, mas era o único jeito de ser ressarcido pelos custos do mandato:  “o deputado é obrigado a fazer uma verdadeira alquimia, ginástica para conseguir ressarcimento. É culpa da Câmara …”

Em todos esses casos, seja porque passaram pano nas denúncias seja porque demoraram para denunciar, o agora senador saiu ileso, eleito e reeleito — da última vez ao cargo mais alto do legislativo republicano 

Quando nós eleitores vamos aprender a lição?!?

Em tempo: o Chico da Cueca mesmo não sendo um iniciante em política e em corrupção, também não aprendeu a lição. Dinheiro sujo se guarda no gabinete do Congresso, lá onde o ministro Dias Toffoli alega não podem haver buscas e apreensões pela polícia.

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