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O passado com um pé no presente.

Informações da coluna

William Helal Filho

Jornalista formado pela PUC-Rio em 2001. Entrou na Editora Globo pelo programa de estágio, foi repórter e editor. Hoje é responsável pelo Acervo.

Maria Auxiliadora Rosalino e Jairo Braule já tinham dois filhos quando o caçula Pedrinho nasceu, em 20 de janeiro de 1986. Treze horas depois do parto, a mãe estava sozinha com o bebê no quarto 10 do Hospital Santa Lúcia, em Brasília, e uma mulher apareceu se identificando como assistente social. Ela foi gentil e disse que precisava levar o recém-nascido para exames. Auxiliadora não impediu. Ainda era recente a perda de um filho anterior, que morrera dois dias depois de vir ao mundo. Então, todo cuidado era bem-vindo. Ela só não podia imaginar que, na verdade, Pedrinho estava sendo roubado.

Os pais da criança passaram anos procurando, mas o filho só foi localizado de novo em 2002, quando já era um adolescente. Tanto o crime em 1986 quanto o reencontro motivaram reportagens em toda a imprensa e comoveram o Brasil. Nesta segunda-feira, o nome do menino ganhou destaque mais uma vez, ao se tornar pública a notícia de que o hoje advogado Pedro Júnior Rosalino, de 38 anos, pai de dois filhos, integra a equipe de defensores do ex-jogador de futebol Robinho, condenado a nove anos de prisão no Brasil por um estupro coletivo acontecido na Itália em 2013.

Formado em Direito pelo Centro Universitário de Brasília (UniCeub), o "Doutor Pedrinho" já tinha recebido a atenção da imprensa em 2017, quando circulou a notícia de que ele integrava a defesa do hoje deputado federal Aécio Neves (PSDB-MG), investigado numa ação da Operação Lava-Jato.

Pedrinho’, que foi roubado da maternidade em 1986, atualmente é advogado da equipe de defesa de Robinho — Foto: Reprodução
Pedrinho’, que foi roubado da maternidade em 1986, atualmente é advogado da equipe de defesa de Robinho — Foto: Reprodução

Em 1986, quando ficou claro que Pedrinho havia sido levado, a família e a maternidade acionaram a polícia. Segundo investigadores, a sequestradora tinha entrado em outros quartos e conversado com as mães, antes de escolher sua vítima e sair com o bebê pela porta do hospital sem ser questionada. Em seguida, a polícia começou a monitorar estradas e fronteiras, mas, desde o início, o delegado responsável pelo caso acreditava que o recém-nascido não havia deixado os arredores de Brasília.

Nas semanas seguintes, várias pessoas foram consideradas suspeitas, mas a polícia não encontrou a responsável pelo crime e nem o bebê. Com o tempo, as investigações foram interrompidas, mas Maria Auxiliadora nunca parou de acreditar que veria seu filho de novo. Numa entrevista ao GLOBO em 1989, a então funcionária do Banco do Brasil estava seguindo pistas desprezadas pela polícia e escrevendo um livro, que seria publicado com o título "Devolvam meu filho: O caso Pedrinho". Entretanto, muito tempo ainda se passaria até novembro de 2002, quando, afinal, o menino foi encontrado.

Aos 16 anos de idade, Pedrinho se chamava Osvaldo Borges Júnior e vivia em Goiânia com Vilma Martins Costa, sem saber que a mulher que ele chamava de mãe o havia roubado da maternidade.

No dia 8 de novembro de 2002, um exame de DNA confirmou que o menino era filho de Auxiliadora e Jairo. O rapaz e a mãe de criação foram ao encontro dos pais biológicos num escritório de advocacia e, em seguida, saíram todos para almoçar numa churrascaria. Até então, Vilma jurava inocência., A certa altura da refeição, puxou Auxiliadora pelo braço e disse: "Você sabe que não fui eu".

Maria Auxiliadora e Jairo, os pais de Pedrinho, três dias após ele ser levado — Foto: Juan Carlos Gomez/Agência O GLOBO
Maria Auxiliadora e Jairo, os pais de Pedrinho, três dias após ele ser levado — Foto: Juan Carlos Gomez/Agência O GLOBO

A sequestradora sustentava que Pedrinho fora levado a ela, quando bebê, por um gari que o achara no lixo. Mas a polícia não comprou a versão e passou a interrogar pessoas próximas a Vilma. No dia 14 daquele mês, a própria mulher confessou o crime. Mais tarde, os investigadores descobriram que ela criava também uma menina tomada de outro casal quando bebê, em 1979. Nenhum dos "filhos" tinha ideia de suas origens reais. Por esses crimes, Vilma seria condenada a 15 anos de prisão.

Pedro foi encontrado graças a uma jovem de 19 anos, parente de Vilma. Após a morte de Osvaldo Borges, marido da sequestradora, a menina ouviu os pais dela falando sobre a hipótese de o garoto ser o bebê raptado em 1986. Fuçando na internet, a moça encontrou referências sobre o crime e uma foto de Jairo Braule aos 10 anos de idade e percebeu nítidas semelhanças faciais com o garoto. A jovem, então, procurou o instituto SOS Criança, que acionou a polícia e fez contato com os pais biológicos de Pedrinho. O teste de DNA, autorizado pela Justiça, trouxe a confirmação das suspeitas.

No dia do reencontro, Pedrinho contou ao GLOBO que a situação era muito difícil, mas que tentava lidar com tudo de forma simples. Disse ainda que tinha adorado conhecer seus pais biológicos. "Eles são gente boa demais", afirmou o garoto, que, no entanto, em um primeiro momento, seguiu vivendo com Vilma. "Vou continuar morando com a minha mãe, mas vou estar sempre com meus novos pais. Nosso relacionamento vai ser o melhor possível". O casal se frustrou por não levar o filho para casa, mas entendeu que os laços entre eles seriam construídos com o tempo. Foi o que aconteceu.

Em julho de 2003, o rapaz se mudou para a casa dos pais biológicos e adotou o nome de Pedro Júnior Rosalino Braule Pinto. Mas manteve contato com Vilma e a irmã de criação, Roberta. Em novembro daquele ano, O GLOBO publicou uma entrevista com o adolescente. "Não condeno, nem absolvo minha mãe. O que importa é o amor que ela me deu", disse o então estudante, que se mostrou bem à vontade vivendo com Auxiliadora e Jairo. "Nunca imaginava que isso fosse acontecer comigo. Mas fiquei feliz de saber minha história. Nunca tive medo da verdade, para mim a verdade é sempre melhor".

Vilma Martins após confessar o sequestro de Pedrinho, em 2002 — Foto: Reprodução/TV Globo
Vilma Martins após confessar o sequestro de Pedrinho, em 2002 — Foto: Reprodução/TV Globo
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