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O passado com um pé no presente.

Informações da coluna

William Helal Filho

Jornalista formado pela PUC-Rio em 2001. Entrou na Editora Globo pelo programa de estágio, foi repórter e editor. Hoje é responsável pelo Acervo.

Adriane Galisteu tinha 19 anos quando conheceu o maior ídolo brasileiro do automobilismo, Ayrton Senna, numa festa na boate Limelight, em São Paulo, para celebrar a vitória do piloto no GP de Interlagos, em março de 1993. O tricampeão de Fórmula 1 ficou tão encantado com a modelo que a convidou para um fim de semana na sua mansão em Angra dos Reis, no Litoral Sul Fluminense.

O novo casal, então, passou a ser perseguido por fotógrafos e cinegrafistas, que foram até Angra dos Reis e ficaram cercando a propriedade do atleta, na enseada de Portogalo. Um dos paparazzi chegou a capturar imagens de Adriane e Ayrton a distância, se balançando, e caindo, de uma rede na praia.

Um dia depois de voltar de Angra dos Reis, a modelo retomou a vida normal e participou de uma ação promocional da agência Elite, do empresário americano John Casablancas, para distribuir chocolates de Páscoa entre motoristas no engarrafamento da Avenida Paulista. Hoje uma famosa apresentadora de TV, a então jovem manequim não passaria despercebida pela imprensa. Enquanto estava no sinal abordando motoristas, ela foi fotografada e entrevistada por uma equipe do GLOBO.

Adriane Galisteu durante ação de Páscoa na Avenida Paulista, em 1993 — Foto: Daniel Augusto Jr/Agência O GLOBO
Adriane Galisteu durante ação de Páscoa na Avenida Paulista, em 1993 — Foto: Daniel Augusto Jr/Agência O GLOBO

"Foram dias gostosos e muito descontraídos, mas somos só amigos!", disfarçou Adriane, com um sorriso, no trânsito perto do Museu de Arte de São Paulo (Masp), há 30 anos. "Tinha mais conhecidos do Ayrton lá na casa, e outras modelos que foram comigo. Não aconteceu nada entre a gente".

Melhor primeira volta da história

Alguns dias depois, Senna venceu o GP da Europa, no Reino Unido, de forma brilhante. Nitidamente inspirado, o brasileiro largou no quarto lugar e, logo, caiu para a quinta posição. Mas, debaixo de chuva, ele reagiu logo e completou a primeira volta já na primeira colocação, deixando para trás rivais como Alain Prost e Michael Schumacher. Aquela foi considerada a "melhor primeira volta da história".

No retorno ao Brasil, o piloto foi visto de novo com Galisteu, em São Paulo. A partir de então, eles não se desgrudaram mais. A modelo acompanhava o namorado em provas internacionais, eventos sociais e até durante entrevistas. Autor do livro "Uma estrela chamada Senna", o jornalista Lemyr Martins disse, num documentário da BBC, que Galisteu foi o grande amor de Senna e "poderia ter sido mãe de seus filhos", não fosse o acidente que matou o atleta, há 30 anos, no GP de Ímola, na Itália.

Ayrton Senna após acidente em Ímola, socorrido por médicos — Foto: Reprodução
Ayrton Senna após acidente em Ímola, socorrido por médicos — Foto: Reprodução

No dia da tragédia, 1º de maio de 1994, a modelo estava no Algarve, em Portugal, onde encontraria o namorado depois da prova na Itália. Numa entrevista ao GLOBO, em Lisboa, dois dias dias depois do acidente, ainda muito abalada, Adriane descreveu sua reação ao assistir à colisão ao vivo, pela TV. "Quando vi que ele não saiu do carro, fiquei apavorada", disse ela. "A primeira coisa que ele fazia era se soltar e se mandar do carro. Vi a cabeça dele meio caída para o lado e me deu um pânico tão grande que, na hora, percebi que ele tinha se machucado".

Velório de Ayrton Senna

Adriane pretendia retornar ao Brasil junto com o corpo de Senna e queria "estar com os pais dele, na fazenda". Porém, no velório, a namorada do piloto não ocupou o lugar de uma pessoa tão próxima dele ou da família. Segundo uma reportagem publicada pelo GLOBO no dia seguinte ao enterro, o carro de Adriane foi um dos últimos do longo comboio a entrar no cemitério do Morumbi, em São Paulo, enquanto o automóvel da apresentadora Xuxa, que namorara Senna de 1988 a 1989, foi o segundo.

Chorando muito, Galisteu contou que os dois viviam um ótimo momento da relação, que ela estava muito apaixonada e não tinha a menor ideia do que iria fazer da vida. "Acho que estou vivendo um pesadelo e vou acordar. Há momentos em que estou forte, consciente de tudo, e outros em que estou totalmente fora de mim. E me vejo de repente completamente sozinha, porque perdi meu namorado", desabafou a modelo. "Eu queria voltar dois dias no tempo para fazer alguma coisa e impedir tudo", acrescentou ela. "Mas pra mim ele era intocável, sempre saía bem dos acidentes".

Adriane Galisteu chora no velório de Ayrton Senna, em 1994 — Foto: Fernando Maia/Agência O GLOBO
Adriane Galisteu chora no velório de Ayrton Senna, em 1994 — Foto: Fernando Maia/Agência O GLOBO

Quando Adriane chegou no local do sepultamento, restavam apenas duas cadeiras vazias, ambas ao lado de Xuxa. Ela se sentou à direita da apresentadora. As duas ficaram dois "longos" minutos sem nem se olhar, até que alguém ofereceu a Xuxa um lugar ao lado de Leonardo Senna, irmão do piloto.

Depois, ainda segundo a reportagem, a apresentadora entrou no carro da família, acompanhada pela irmã de Ayrton, Viviane Senna, e foi embora com eles, enquanto Galisteu teve que caminhar até a saída do cemitério e embarcar em um ônibus reservado aos convidados. Para os jornalistas que cobriam o sepultamento, ficou a nítida impressão de que Adriane não recebera a consideração que o próprio tricampeão mundial vinha dispensando à namorada.

Dois meses depois, Galisteu estava em Portugal trabalhando no livro de memórias que seria publicado naquele ano, com o título de "Caminho das Borboletas". Numa nova entrevista concedida ao GLOBO, publicada em 30 de julho de 1994, ela contou que ainda não havia absorvido a perda do namorado. Tinha engordado e voltado a fumar ("fiquei descontrolada"). Quando perguntada sobre o seu lugar no velório, a modelo mostrou que não guardava nenhum rancor da família Senna.

"Eu estava tão catatônica que só me dei conta da situação uma semana depois, quando comecei a ler os jornais e a assistir a televisão. E não sabia se era um problema da imprensa ou um problema meu", disse ela. "Para mim, foi tudo muito normal. Seria de estranhar se a Xuxa não aparecesse. Só achei que a posição dela foi um pouco duvidosa. Foi complicado para mim, para ela e para as pessoas, porque ninguém entendeu direito aquela situação".

Na opinião de Adriane, a família aprovava o seu namoro com o piloto. "A única coisa é que, com a morte, todo mundo ficou descontrolado. Depois de um mês fui ao cemitério: queria deitar naquele lugar onde ele está, ficar horas, chorar sem parar, procurar uma saída", comentou ela, sempre evitando entrar em polêmicas com os parentes de Senna. "Com as perdas você aprende a ver as coisas com outros olhos. Ganhei uma bíblia, passei a ler e a deixá-la na minha cabeceira".

Ayrton Senna e Adriane Galisteu — Foto: Reprodução / Instagram
Ayrton Senna e Adriane Galisteu — Foto: Reprodução / Instagram
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