Guga Chacra
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Guga Chacra

Colunista do Globo e comentarista de política internacional da Globonews.

Informações da coluna

Guga Chacra

Mestre em Relações Internacionais pela Columbia University de Nova York. É colunista do Globo e comentarista de política internacional da Globonews.

Por Guga Chacra — Nova York

O regime de Vladimir Putin, na semana passada, prendeu Evan Gershkovich, correspondente do Wall Street Journal em Moscou, em mais um ataque à liberdade. A acusação mentirosa da Justiça russa é de que o repórter seria um espião estrangeiro. Nenhuma prova foi apresentada, até porque inexistem. O objetivo da prisão do jornalista é usá-lo no futuro como moeda de troca para conseguir a libertação de russos prisioneiros em outros países. Trata-se de mais um episódio na deplorável história do autocrata russo, acusado de crimes contra a Humanidade na Ucrânia.

Filho de pais judeus nascidos na antiga União Soviética que imigraram para os EUA, Gershkovich cresceu em Nova Jersey, fez faculdade no Maine, é fluente em russo e fascinado pela História da Rússia. Decidiu se mudar para Moscou depois de passagens por redações como a do New York Times em Nova York. Iniciou sua carreira na Rússia no Moscow Times, um jornal em inglês publicado na capital russa. Posteriormente trabalhou na agência de notícias France Presse até chegar ao Wall Street Journal, um dos mais importantes jornais do planeta. Foi contratado semanas antes de a Rússia invadir a Ucrânia, e sua cobertura naturalmente estava focada na guerra. Aos 31 anos, realizava o sonho de ser correspondente internacional.

Graças a repórteres como Gershkovich, as pessoas podem ter acesso a informações sobre o que ocorre em regimes autoritários como o de Putin. Não é simples atuar em ditaduras como a Rússia, Arábia Saudita, Irã, Síria, China e Egito. Talvez seja um dos trabalhos mais difíceis no jornalismo.

O governo de Joe Biden pediu a libertação imediata de Gershkovich, mas é improvável que isso ocorra no curto prazo. Nos próximos meses, o repórter seguirá detido e, levando-se em consideração o histórico russo em processos envolvendo acusados de espionagem, tende a ser condenado a anos de prisão. Seu destino será similar ao da jogadora de basquete Brittney Griner, que foi presa sob a acusação de narcotráfico e acabou solta em uma troca de prisioneiros.

O caso de Gershkovich lembra também o de outros correspondentes presos fazendo seu trabalho em regimes ditatoriais, como Jason Rezaian, correspondente do Washington Post em Teerã. O jornalista foi preso em junho de 2014 junto com a sua mulher, Yeganeh Salehi, uma fotógrafa iraniana. Nenhum dos dois cometeu crimes. Foram detidos pelo simples fato de serem jornalistas trabalhando para um órgão de imprensa internacional. Obviamente, somente foi solto mediante troca de prisioneiros.

Ditaduras como as da Rússia e do Irã sabem que correspondentes internacionais, uma vez detidos, podem ser usados em troca de prisioneiros. Esses jornalistas ainda levam uma certa vantagem por serem cidadãos de um país poderoso como os EUA. Podem manter a esperança de acabarem soltos em algum momento depois de negociações envolvendo o Kremlin e a Casa Branca. Já os jornalistas russos, iranianos e mesmo turcos correm risco de serem condenados à prisão sem perspectiva de serem libertados. Pior, em muitos casos são torturados e até mortos pelos regimes de Moscou e Teerã. Na verdade, não apenas por essas ditaduras. Basta lembrar do ditador da Arábia Saudita, Mohammad bin Salman, que ordenou o esquartejamento do jornalista dissidente Jamal Khashoggi, um cidadão saudita residente permanente nos EUA. Nesse caso, o ditador sequer sofreu consequências por ordenar o assassinato, já que recebeu a visita de Biden em Riad.

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