Guga Chacra
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Guga Chacra

Colunista do Globo e comentarista de política internacional da Globonews.

Informações da coluna

Por Guga Chacra — Nova York

Não é um problema o Brasil restabelecer relações com a Venezuela. Trata-se de uma nação vizinha e existe a necessidade de um diálogo. O regime ditatorial no país não deve ser encarado como um empecilho já que o Brasil, assim como todos os outros países do mundo, mantém relações com ditaduras. Basta dizer que a China é a principal parceira comercial da maioria dos países do planeta, incluindo os EUA e os próprios brasileiros. Os americanos vão além e são aliados da Arábia Saudita e concedem uma mesada bilionária para o Egito. O grave na recepção do presidente Lula a Nicolás Maduro está na celebração de um ditador e no tom quase eufórico do seu discurso.

Maduro não é uma liderança democrática, diferentemente de outros líderes de esquerda da América do Sul como o presidente do Chile, Gabriel Boric, e o da Colômbia, Gustavo Petro. Reprime a oposição e não joga pelas regras da democracia. A Venezuela possui apenas 15 pontos no ranking de democracia da Freedom House, que vai de 0 (ausência de democracia) a 100 (máximo de democracia). Apenas para ter um parâmetro, o país está mais próximo do Irã (12) e do Egito (18) do que da Bolívia (66). O Brasil tem 72 pontos, enquanto Finlândia, Suécia e Noruega gabaritam com 100. No ranking de liberdade de imprensa dos Repórteres Sem Fronteiras, os venezuelanos estão 159º lugar.

Cerca de 7 milhões de venezuelanos deixaram país diante da crise econômica, segundo o Human Rights Watch. O presidente Lula argumenta que seriam as sanções econômicas impostas pelos EUA. Embora seja legítimo criticar a estratégia dos EUA, isso não se sustenta porque o Irã, alvo de sanções incomparavelmente maiores, não vê o mesmo fluxo de saída. A organização humanitária também condena a repressão a dissidentes. A Anistia Internacional afirma que as forças de segurança usam “força excessiva e outros métodos repressivos contra protestos envolvendo diferentes setores da população que demandam direitos sociais e econômicos, incluindo o direito à água. Persiste ainda a impunidade de execuções extrajudiciais". Uma missão da ONU indica que o regime segue reprimindo a mídia, sociedade civil e líderes sindicais.

Quando dividimos o mundo entre direita e esquerda, Maduro costuma ser encaixado na esquerda, apesar de sua agenda reacionária em questões comportamentais estar bem distante do que um europeu ou americano classificaria como progressista (ou liberal, no sentido da palavra nos EUA). Trata-se de um líder que não concede todos os direitos para a comunidade LGBTQ+, já fez uma série de declarações homofóbicas no passado e é contra o direito ao aborto, além de ter uma economia focada no petróleo, indo totalmente contra uma agenda ambiental.

Quando dividimos o mundo entre democracias e ditaduras, certamente Maduro está no segundo grupo. É um ditador. Lula deveria ter consciência de que está celebrando um líder ditatorial e não somente um colega da esquerda latino-americana.

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