Guga Chacra
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Guga Chacra

Colunista do Globo e comentarista de política internacional da Globonews.

Informações da coluna

Guga Chacra

Mestre em Relações Internacionais pela Columbia University de Nova York. É colunista do Globo e comentarista de política internacional da Globonews.

Por — Nova York

Israelenses dormiram na sexta-feira sem imaginar que poderiam ser acordados no dia seguinte como alvos da maior ofensiva militar de uma organização palestina na História. A magnitude dos ataques terroristas do grupo extremista armado Hamas é inédita. Ninguém previa que o grupo, e seus aliados, possuíssem a capacidade de atacar os israelenses de uma forma tão bem planejada e sucedida. É um divisor de águas. Entre outras vitórias dos militantes estão milhares de foguetes contra múltiplos alvos, invasão ao território de Israel e relatos de soldados e civis reféns.

Ao mesmo tempo, houve enorme falha na área de segurança e de Inteligência de Israel. A avaliação era de que as forças israelenses controlavam a fronteira com Gaza. Ataques a partir do território palestino não iriam além do lançamento de foguetes contra vilas fronteiriças, sem provocar muitos estragos. Como foram pegos de surpresa desta forma? É algo que não ocorria desde a Guerra do Yom Kippur, há 50 anos — mais um motivo para os israelenses ficarem mais atentos. Uma vulnerabilidade gigantesca.

Israel já iniciou uma dura resposta aos ataques. Bombardeios começaram. Uma ação terrestre é mais complicada porque não está clara a quantidade de armadilhas em Gaza, além de precisar levar em consideração o risco para soldados e civis que capturados. Há informações de 57 israelenses reféns — ao longo dos anos, houve apenas um israelense capturado, em 2006, pelo Hamas, Guilat Shalit, trocado, cinco anos mais tarde, por mais de mil palestinos presos em Israel.

Mapa mostra ataques do Hamas contra Israel — Foto: Editoria de arte
Mapa mostra ataques do Hamas contra Israel — Foto: Editoria de arte

Para complicar, existe o risco de uma nova frente ser aberta a partir do Líbano com o Hezbollah, embora ainda não haja indicação de que isso vá ocorrer.

Há enormes diferenças entre o grupo libanês e o Hamas. O Hezbollah é baseado no Líbano, composto por libaneses de religião xiita. É incomparavelmente mais bem armado do que o Hamas e com capacidade bélica superior. Ao mesmo tempo, um braço do grupo integra o espectro político em Beirute. Conta com forte apoio dos xiitas libaneses, cerca de um terço da população. Mas cristãos de diferentes denominações, sunitas e drusos adotam postura contrária ao grupo, que ficou mais impopular nos últimos anos. Um dos temores é sugar o Líbano para um conflito desnecessário com Israel.

Não podemos descartar também uma escalada da violência na Cisjordânia, com embates entre palestinos e colonos israelenses. É um cenário distinto de Gaza porque a região tem uma presença militar israelense forte, além de centenas de milhares de colonos que habitam assentamentos. A administração das cidades está nas mãos da Autoridade Palestina, controlada pelo Fatah, rival do Hamas.

Ataque do Hamas em Israel:

No contexto de Gaza, não há a menor possibilidade de cessar-fogo. O premier israelense, Benjamin Netanyahu, precisará provar para a população que Israel está seguro. Neste momento, o ideal seria a formação de um governo de coalizão nacional, com a inclusão da oposição, como parece ser o caminho a ser seguido pelo primeiro-ministro em suas declarações. Todas as medidas de política doméstica, como a tentativa de enfraquecimento da Suprema Corte, devem ser suspensas. Uma vez terminado o conflito, e não temos ideia de quando isso poderá ocorrer, Israel precisará investigar como pode ter ocorrido uma falha tão grande de Inteligência e segurança.

No campo militar, a estratégia israelense em outros conflitos em Gaza, o “aparar a grama”, reduzindo o poderio bélico do Hamas em bombardeios até o grupo, anos depois, conseguir recompor o seu arsenal, não funcionou. A organização demonstrou estar mais poderosa do que nunca.

A tendência de Israel é partir para mudança de regime na Faixa de Gaza. Para atingir este objetivo, e diante de uma Autoridade Palestina enfraquecida, os israelenses precisariam reocupar o território de onde se retiraram em 2006, o que produzirá enormes efeitos colaterais. Ainda assim, no Oriente Médio apenas se entende a linguagem da força. Qualquer demonstração de fragilidade pelos israelenses neste momento será usada por seus adversários.

As nações árabes que mantêm boas relações com Israel devem insistir e talvez até negociar um cessar-fogo no futuro. Neste momento, não há como ir além da retórica. É simplesmente impossível que Israel não responda aos ataques classificados por alguns como o 11 de Setembro israelense. As principais potências ocidentais estão integralmente ao lado dos israelenses e tratam como terrorismo o que aconteceu. E há sinal verde de Washington para Israel responder da forma que quiser.

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