Guga Chacra
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Guga Chacra

Colunista do Globo e comentarista de política internacional da Globonews.

Informações da coluna

Guga Chacra

Mestre em Relações Internacionais pela Columbia University de Nova York. É colunista do Globo e comentarista de política internacional da Globonews.

A pergunta que mais tenho recebido nas últimas horas é sobre o possível envolvimento do Hezbollah na guerra entre Israel e o Hamas que começou depois de o grupo palestino realizar um gigantesco atentado no território israelense no sábado, matando mais de 700 pessoas, ferindo milhares e capturando cerca de 200 reféns, incluindo crianças e idosos, no maior ato terrorista no mundo desde o 11 de Setembro.

Há duas visões sobre o que pode acontecer pelo que venho conversando com pessoas no Líbano, Israel e também aqui nos EUA e Brasil. Vou delinear os motivos de cada uma delas abaixo. Antes, porém, preciso explicar rapidamente o Hezbollah. O grupo é xiita e tem como base o Líbano. Surgiu nos anos 1980 no sul do libanês, uma região do país com maioria xiita e minoria cristã.

Conflito em Israel:

Três fatores contribuíram para a sua formação. Em primeiro lugar, a ocupação do território por Israel que atuava, em parceria com uma milícia cristã libanesa chamada Exército do Sul do Líbano, para eliminar os grupos palestinos na área. Em segundo lugar, a Revolução Islâmica no Irã em 1979 levou ao poder um regime teocrático xiita que passou a apoiar xiitas no Oriente Médio. Terceiro, a marginalização dos xiitas na sociedade libanesa, historicamente dominada por cristãos e muçulmanos sunitas.

O Hezbollah conseguiu derrotar Israel e seus aliados libaneses, com as forças israelenses se retirando do Sul do Líbano em 2000. Hoje possui tanto o braço militar, com cerca de 100 mil mísseis e uma capacidade bélica bem superior à do Hamas, e um braço político, com membros no Parlamento e no gabinete ministerial. Possui alguns aliados entre partidos cristãos libaneses e poucas facções sunitas. A maioria dos libaneses, no entanto, se opõe ao grupo e isso inclui muitos cristãos de diferentes denominações (maronitas, ortodoxos, armênios, melquitas, siríacos), muçulmanos sunitas, drusos e até uma minoria xiita.

O temor maior dos opositores ao Hezbollah é justamente o grupo sugar o Líbano para uma nova guerra como a de 2006, quando a organização enfrentou em Israel ao longo de 33 dias. Não houve vencedor, mas o Líbano foi devastado. Desde aquele ano, os dois lados seguem um acerto informal para evitar escaladas militares. São as chamadas regras do jogo. Basicamente, se enfrentam apenas em áreas disputadas, como as Fazendas de Shebaa, que o Líbano considera libanês e Israel diz ser uma área síria anexada pelos israelenses – a ONU diz ser Síria, mas o regime de Bashar al Assad mantém um discurso dúbio sobre se é sírio ou libanês. O mesmo se aplica à vila de Ghajjar.

São nestas áreas que escutamos supostos confrontos hoje. Mais importante, não sabemos se membros do Hezbollah ou de grupos palestinos com base no Líbano que teriam feito incursões em áreas sob controle israelense. Não dá, pelo menos enquanto escrevo este texto, para dizer que o Hezbollah já entrou no conflito. Quando entrar, tenham certeza, será com uma magnitude muito maior.

Mas pode entrar. Portanto, vamos ver os argumentos de quem avalia que o grupo abrirá uma nova frente contra Israel e quem acha que não.

Argumentos de quem acha que o Hezbollah entrará no conflito

  • Foi aberta uma janela de oportunidade com a ação do Hamas e o grupo aproveitaria a vulnerabilidade de Israel
  • A entrada já teria sido planejada em coordenação com o Irã e o Hamas para uma segunda etapa do conflito
  • O risco de uma escalada nas regras do jogo, com uma ação mal calculada, na qual o conflito se torne inevitável, como em 2006

Argumentos de quem acha que o Hezbollah não entrará na guerra

  • Israel já sofreu um gigantesco golpe com o ataque terrorista do Hamas. O Irã conseguiu acabar com a possibilidade de um acordo entre Arábia Saudita e Israel em um futuro próximo, humilhou Benjamin Netanyahu, consolidou o Hamas como principal grupo palestino e ainda há as dezenas de reféns. O Hezbollah seguiria, neste caso, como poder de dissuasão do regime iraniano para um futuro conflito que envolva bombardeios de Israel ou dos EUA a instalações nucleares no Irã
  • Não existe mais o elemento surpresa, como no ataque do Hamas. Israel já está preparado para uma ofensiva pelo Norte. Caso o Hezbollah fosse se envolver, já teria atacado junto com o grupo palestino em uma operação coordenada
  • Existe enorme pressão interna no Líbano para o Hezbollah não atacar. O país já enfrenta um colapso econômico, falta de eletricidade, de água, ainda tenta se recuperar da explosão do porto, não consegue eleger um presidente, o atual governo é interino e precisa lidar com cerca de 2 milhões de refugiados sírios

Mais recente Próxima Estratégia de Israel deve ser derrubar regime do Hamas

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