Guga Chacra
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Guga Chacra

Colunista do Globo e comentarista de política internacional da Globonews.

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Guga Chacra

Mestre em Relações Internacionais pela Columbia University de Nova York. É colunista do Globo e comentarista de política internacional da Globonews.

Por — Nova York

Em inglês, a palavra “fome” tem mais de uma tradução para distinguir importantes estágios de insegurança alimentar. “Hunger”, por exemplo, ocorre quando uma pessoa ou um grupo de pessoas em uma comunidade não ingerem a quantidade necessária de nutrientes. “Starvation” já envolve uma escala maior, quando a falta de alimentos pode provocar a morte de uma pessoa ou de um grupo de pessoas. Caso “hunger” e “starvation” atinjam níveis catastróficos em uma ampla área, como em um território ou país, falamos de “famine”.

Cerca de 1,1 milhão de palestinos na Faixa de Gaza estão em risco iminente de “famine”, ou fome em níveis catastróficos, segundo o Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas. O número equivale à metade da população do território. Mais grave: de acordo com a Human Rigths Watch, uma das mais importantes entidades de direitos humanos do planeta, Israel tem usado a imposição da fome como arma de guerra nesse conflito ao restringir a ajuda humanitária. Tedros Adhanom, diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, afirma que crianças palestinas estão morrendo por falta de alimentos, além daquelas que já morreram vítimas do conflito — segundo o Save the Children, são mais de 14 mil menores mortos nas ações militares israelenses desde o início da guerra, após o atentado terrorista do Hamas em 7 de outubro. A Médicos Sem Fronteiras fala em mais de mil crianças com ao menos um membro amputado. Outras milhares ficaram órfãs. Dezenas de escolas foram destruídas.

Depois de ser alvo do ataque terrorista, Israel possuía o direito de se defender. Poucas nações questionaram isso naquele 7 de outubro. Mas sempre ficou claro que os israelenses precisavam respeitar as Convenções de Genebra. Não é o que vem ocorrendo em uma série de episódios, como no uso de bombas de uma tonelada contra edificações civis e bombardeios aleatórios como o que resultou na morte de sete trabalhadores humanitários da World Central Kitchen, que levavam alimentos para os palestinos que passam fome na Faixa de Gaza.

Ao longo dos primeiros seis meses do conflito, o governo de Benjamin Netanyahu impôs obstáculos à entrada de alimentos no território, segundo a ONU e uma série de agências humanitárias. O cenário melhorou um pouco depois de os EUA ampliarem a pressão sobre a administração israelense no último fim de semana. O aumento, no entanto, ainda é insuficiente segundo o presidente Joe Biden, uma rara crítica a Israel do maior aliado militar do país.

Israel já controlava a entrada de ajuda humanitária em Gaza mesmo antes do conflito. Mantinha há quase duas décadas um bloqueio terrestre (com a ajuda do Egito), marítimo e aéreo sobre a Faixa de Gaza. Agora, com a operação militar, controla o território internamente. O país tem, portanto, a obrigação de permitir a entrada de ajuda humanitária internacional, que vem de uma série de países e de entidades independentes. Não existe argumento para não liberar o ingresso de mais alimentos que podem ao menos amenizar a fome dos palestinos.

Vale acrescentar que havia fazendas em Gaza, mas a imensa maioria das plantações foi destruída nas ações militares israelenses, segundo a Oxfam, uma organização internacional de combate à desigualdade e à pobreza. Os alimentos produzidos eram fundamentais para a população palestina.

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