Janaína Figueiredo
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Janaína Figueiredo

Foi correspondente do GLOBO em Buenos Aires e desde 2019 é repórter especial.

Informações da coluna

Janaína Figueiredo

Colaborou com a GloboNews, CBN e La Nación. Foi correspondente do GLOBO em Buenos Aires e hoje é repórter especial. Escreveu o livro “Qué pasa, Argentina?”

Por — Buenos Aires

A eleição do outsider de extrema-direita Javier Milei como presidente não tem, apenas, consequências para a Argentina. Nas últimas semanas, na Colômbia, onde o governo do esquerdista Gustavo Petro enfrenta dificuldades em várias frentes — entre elas um processo judicial contra um de seus filhos, acusado de enriquecimento ilícito — um nome se instalou com força nos debates públicos sobre os cotados e cotadas para disputar o comando do Palácio de Nariño em 2026: o da jornalista Vicky Dávila, diretora da revista Semana, uma das mais importantes do país.

O tema foi tratado por outra jornalista, Jimena Duzán, que apresenta um dos podcasts sobre política de maior audiência, A Fondo (A fundo, em tradução livre), disponível na plataforma Spotify, e tem 1,4 milhão de seguidores na rede social X (ex-Twitter). Na apresentação do episódio, Duzán diz que recentes pesquisas indicam que Dávila arrasaria num eventual segundo turno, por exemplo, numa disputa com a ex-prefeita de Bogotá Claudia López. E faz a seguinte pergunta: se aconteceu na Argentina, com Milei, e nos Estados Unidos, com Donald Trump, por que não aconteceria na Colômbia?

Uma pergunta mais do que válida em momentos de crise dos partidos políticos tradicionais em quase toda a América Latina. O vertiginoso fenômeno Milei mostrou que, nas atuais circunstâncias políticas na região, nada pode ser descartado. Se um economista que era famoso por opinar — aos gritos e agredindo seus adversários — na TV conseguiu eleger-se presidente sem um partido forte e sem estrutura política alguma, é porque os eleitores estão em busca de outros perfis de candidatos. Milei soube interpretar uma mudança de época.

Na Colômbia, a diretora da revista Semana segue os passos do argentino. Em sua conta na rede X, Dávila afirmou que “as pessoas gostam de mim porque eu desafio este governo nefasto e o deixo em evidência”. Enquanto isso, Claudia López é uma política profissional que acabou com Bogotá e será a herdeira de Gustavo Petro, que também quer acabar com a Colômbia”.

A jornalista não importou literalmente o discurso contra a “casta política”, pilar da campanha eleitoral de Milei, mas, com outras palavras, mandou o mesmo recado. Dávila se posiciona como uma alternativa antissistema, antipolítica e, o que considero mais importante em seu discurso, com a coragem para enfrentar a política tradicional que, em sua narrativa, é a culpada pelos fracassos da Colômbia.

Como Milei, a jornalista nunca governou nada. Sua experiência em política é entrevistar e investigar políticos. Mas, para um eleitorado ávido por mudanças, isso basta. Bastou na Argentina, e poderia bastar na Colômbia, onde Petro parece destinado a fracassar na promessa de liderar uma profunda transformação.

O problema é o que fazem estes outsiders da era da inteligência artificial e das redes sociais quando chegam ao poder. Na Argentina, Milei continua atuando como se fosse um candidato, e não um presidente. O chefe de Estado libertário cresce na confrontação, passa horas nas mesmas redes que impulsionaram sua candidatura, e nelas promove linchamentos midiáticos de críticos e adversários.

O diagnóstico é claro: a política tradicional precisa se reinventar. A questão é que as opções que estão surgindo com força e, em alguns casos, ganhando eleições, na América Latina causam outros danos, desafiam os sistemas democráticos e, em alguns países, os ameaçam.

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