Janaína Figueiredo
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Janaína Figueiredo

Foi correspondente do GLOBO em Buenos Aires e desde 2019 é repórter especial.

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Janaína Figueiredo

Colaborou com a GloboNews, CBN e La Nación. Foi correspondente do GLOBO em Buenos Aires e hoje é repórter especial. Escreveu o livro “Qué pasa, Argentina?”

Por — Buenos Aires

O presidente da Argentina, Javier Milei, chegará a seu primeiro G7 com ares de vitória e em busca de reforçar laços com aliados internacionais, entre eles a premier italiana, Giorgia Meloni, que o convidou para o encontro. A aprovação, no Senado, da chamada Lei de Bases anteontem é uma vitória importante para o líder da extrema direita argentina, embora, na prática, como reconhecem economistas aliados do governo, não permitirá a implementação de grandes reformas no país — depois das diversas concessões feitas pela Casa Rosada para finalmente obter sinal verde do Congresso. Mas essa é a foto do momento, que não reflete o complexo cenário argentino.

Para um presidente com bancada minoritária no Congresso e em pleno processo de construção de seu partido político, A Liberdade Avança, o resultado da conturbada votação no Senado é um passo importante. Mas a realidade é muito mais difícil do que o presidente admitirá em suas conversas com chefes de Estado como o francês Emmanuel Macron, entre outros.

A Lei de Bases tem uma importância essencialmente simbólica: mostrar que o governo de Milei, apesar de carecer de uma estrutura política sólida, não tem hoje um problema de governabilidade. Isso explica por que os bônus e as ações argentinas subiram no dia seguinte à votação. O mercado interpretou o resultado como um voto de confiança no governo, e, ao mesmo tempo, uma derrota de seus adversários mais ferrenhos, sobretudo o kirchnerismo. O kirchnerismo em baixa anima investidores, tanto quanto o fortalecimento do presidente.

Mas por trás do clima de celebração, na Casa Rosada há preocupação pela deterioração da economia, e, sobretudo, do humor social. Recentes pesquisas mostraram que Milei está perdendo apoio em amplos setores, entre eles em bairros pobres da Grande Buenos Aires. Na província de Buenos Aires vive um terço do eleitorado argentino, e manter o respaldo conquistado nas urnas em 2023 é essencial para que o governo consiga um bom desempenho nas legislativas de 2025 — meta traçada pelo presidente.

Uma das pesquisas divulgadas em Buenos Aires nos últimos dias, realizada pela Universidade de San Andrés, revelou que, pela primeira vez desde a posse de Milei, a desaprovação do presidente chegou a 50%, ficando acima dos 48% de aprovação. A mesma pesquisa mostrou que a inflação, até pouco tempo atrás a principal preocupação dos argentinos, caiu para o terceiro lugar, superada por baixos salários e pobreza. Entre os que aprovam o governo predominam a esperança e a percepção de que Milei é um presidente honesto. Entre os que desaprovam, surgem adjetivos como louco, ruim, nefasto e raiva.

Além do mau humor social, a Casa Rosada está preocupada com tensões internas, por exemplo entre a vice-presidente e presidente do Senado, Victoria Villarruel, e a secretária geral da Presidência, Karina Milei, irmã do chefe de Estado e considerada a segunda pessoa mais poderosa do governo. O resultado no Senado empoderou Villarruel, que preside a Casa e deu o voto de Minerva na votação, o que deverá acentuar disputas, em meio ao desgaste de ministros como a chanceler Diana Mondino.

Milei tem uma vitória e várias frentes de conflito abertas. A dúvida é se a aprovação da Lei de Bases — que ainda deverá sofrer mudanças na Câmara — conseguirá, além dos mercados, animar os argentinos e mudar uma tendência negativa na opinião pública, que poderia trazer problemas ao presidente no médio prazo.

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