Lula errou feio ao comparar a tragédia da guerra em Gaza com o Holocausto. A situação na Palestina se insere na lista de grandes atrocidades presenciadas pela humanidade, mas não chega perto do genocídio promovido por Adolf Hitler contra os judeus, como o presidente brasileiro sugeriu.
- Tensão diplomática: Governo Lula cogita expulsar embaixador de Israel no Brasil
- Despedida do Senado: Flávio Dino sugere que pode voltar à política após deixar o STF
O governo Benjamin Netanyahu também errou ao tentar encurralar a diplomacia brasileira com uma emboscada diplomática e ataques destrambelhados — que podem até ter atraído algum dividendo político interno, mas não alteram o status de Israel no mundo.
Dois erros não produzem um acerto, mas parece ser isso o que pretende fazer o assessor especial do Palácio do Planalto para questões internacionais, Celso Amorim. Na última terça-feira, ele declarou que a fala de Lula “sacudiu o mundo e desencadeou um movimento de emoções” que pode ajudar a solucionar o conflito em Gaza.
Os fatos demonstram que ela sacudiu no máximo os dois países envolvidos — no Brasil, serviu para aliviar a pressão sobre Jair Bolsonaro e piorar a imagem de Lula junto aos evangélicos.
Nenhum líder mundial relevante veio em auxílio de Lula, assim como nenhum presidente de potência aliada de Israel — nem Joe Biden — apoiou a ofensiva virtual e diplomática de Netanyahu.
Veja imagens dos tanques de Israel posicionados ao norte de Gaza
![Tanques de Israel posicionados em Ashkelon, ao norte da Faixa de Gaza — Foto: Thomas COEX / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/0wsTlkoMlDh6PzjRFKvIbxfYzJ0=/0x0:1500x1000/648x248/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/H/U/gUHDkrQtG0tDUtRNaQ8g/104680815-editors-note-graphic-content-topshot-israeli-troops-in-tanks-and-other-armoured-ve.jpg)
![Tanques de Israel posicionados em Ashkelon, ao norte da Faixa de Gaza — Foto: Thomas COEX / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/o26lzdWioPxMuheIw0tCFJcfyP0=/1500x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/H/U/gUHDkrQtG0tDUtRNaQ8g/104680815-editors-note-graphic-content-topshot-israeli-troops-in-tanks-and-other-armoured-ve.jpg)
Tanques de Israel posicionados em Ashkelon, ao norte da Faixa de Gaza — Foto: Thomas COEX / AFP
![Soldados e tanques de Israel próximos ao kibbutz Beeri, no sul de Israel — Foto: Thomas COEX / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/4P7Z4K-dQxVxE3I_QukpKVIWv9w=/0x0:1316x878/323x182/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/q/g/F0OAAgQjKsjS9Jq1oS7Q/104676574-israeli-troops-and-tanks-gather-in-a-field-near-the-kibbutz-beeri-in-southern-israel-o.jpg)
![Soldados e tanques de Israel próximos ao kibbutz Beeri, no sul de Israel — Foto: Thomas COEX / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/ydgNyjIA8VUndtGwwladXzPnf-c=/1316x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/q/g/F0OAAgQjKsjS9Jq1oS7Q/104676574-israeli-troops-and-tanks-gather-in-a-field-near-the-kibbutz-beeri-in-southern-israel-o.jpg)
Soldados e tanques de Israel próximos ao kibbutz Beeri, no sul de Israel — Foto: Thomas COEX / AFP
Publicidade
![Soldados e tanques de Israel próximos ao kibbutz Beeri, no sul de Israel — Foto: Thomas COEX / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/a8x1vxokFfsaFZW1CVsQG49aRDk=/0x0:1190x793/323x182/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/h/a/Uayb39Tee3LXhQnR4O9g/104676560-israeli-troops-and-tanks-gather-in-a-field-near-the-kibbutz-beeri-in-southern-israel-o.jpg)
![Soldados e tanques de Israel próximos ao kibbutz Beeri, no sul de Israel — Foto: Thomas COEX / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/CqefZTFATTWdD7k-nSKQZaxBNP0=/1190x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/h/a/Uayb39Tee3LXhQnR4O9g/104676560-israeli-troops-and-tanks-gather-in-a-field-near-the-kibbutz-beeri-in-southern-israel-o.jpg)
Soldados e tanques de Israel próximos ao kibbutz Beeri, no sul de Israel — Foto: Thomas COEX / AFP
![Soldados e tanques de Israel próximos ao kibbutz Beeri, no sul de Israel — Foto: Thomas COEX / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/g_jjbIqRC1SjFtwC0F3cFgEDPN8=/807x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/S/x/9iznafTx6udMqoqB2qqg/104676554-israeli-troops-and-tanks-gather-in-a-field-near-the-kibbutz-beeri-in-southern-israel-o.jpg)
Soldados e tanques de Israel próximos ao kibbutz Beeri, no sul de Israel — Foto: Thomas COEX / AFP
Publicidade
![Soldados e tanques de Israel próximos ao kibbutz Beeri, no sul de Israel — Foto: Thomas COEX / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/35ddiofu5RiIiZOt93cK0hDob1E=/1500x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/6/t/jSaBYtTjua57n8hAh4aw/104676488-israeli-tanks-gather-in-a-field-near-the-kibbutz-beeri-in-southern-israel-on-october-1.jpg)
Soldados e tanques de Israel próximos ao kibbutz Beeri, no sul de Israel — Foto: Thomas COEX / AFP
![Soldados e tanques de Israel próximos ao kibbutz Beeri, no sul de Israel — Foto: Thomas COEX / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/Agq7i-O1ahQ6DMDy6hFVwfYOmqY=/726x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/a/n/7VQkTuSLOQijU77dvqFA/104672460-editors-note-graphic-content-israeli-troops-in-tanks-and-other-armoured-vehicles-ama.jpg)
Soldados e tanques de Israel próximos ao kibbutz Beeri, no sul de Israel — Foto: Thomas COEX / AFP
Publicidade
![Tanque de guerra de Israel posicionado na fronteira com a Faixa de Gaza — Foto: Jack Guez/AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/Crf_em2oniQUDKs1sPpRN2VrGJQ=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/A/A/OAgKInTaeciBZnYd4WSA/tanqueisraelense-jack-guez.jpg)
Tanque de guerra de Israel posicionado na fronteira com a Faixa de Gaza — Foto: Jack Guez/AFP
Ainda assim, vale a pena analisar com lupa a declaração de Amorim, hoje a pessoa mais influente na política externa do governo. Ela reflete a visão de mundo segundo a qual o Brasil deve usar sua posição de liderança no eixo dos países em desenvolvimento para conquistar um lugar na geopolítica das grandes potências.
Essa foi a tônica da atuação de Amorim quando chefiou o Itamaraty sob Lula 1 e 2, que vem expressando em entrevistas e declarações aqui e ali.
No final de janeiro, o “chanceler informal” de Lula afirmou ao Valor que o Brics (bloco capitaneado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, de que ele é o principal articulador) foi “a transformação mais importante nas relações internacionais nos últimos tempos”.
Para Amorim, a consolidação do Brics “alertou os próprios ocidentais para a necessidade de voltar a fortalecer o G20, que é o órgão principal”. “O polo pode estar se deslocando um pouco”, sugeriu, para dizer mais adiante que “todos percebem que no Brics está o futuro”, já que “o PIB do Brics é maior que o do G7”.
O professor de relações internacionais da FGV Matias Spektor, autor de estudos fundamentais sobre nossa política externa, tem uma análise interessante a respeito de como essa filosofia influencia as falas de Lula sobre a guerra em Gaza ou sobre a invasão da Ucrânia pela Rússia.
Para Spektor, elas obedecem a um padrão que pode ser assim traduzido: “Se o Brics é a melhor coisa que aconteceu nos últimos 20 anos, nada mais natural que usar essas alianças para esticar a corda e ser duro com o Ocidente, obrigá-lo a fazer concessões aos países em desenvolvimento. Porque, se o Ocidente não se sente pressionado, mantém o status quo, esse sistema internacional super-hierárquico onde o Norte manda e o Sul obedece.
É como se não houvesse outra forma de “sacudir” as potências ocidentais a não ser criando impasses que afetem não propriamente as emoções, como disse Amorim, mas a economia e a geopolítica.
Dessa constatação decorrem dois problemas e uma dúvida.
O primeiro problema é que, em nome de usar as alianças antiocidentais para sacudir o Ocidente, a “doutrina Amorim” admite dar aval tácito a Vladimir Putin, Nicolás Maduro e outros autocratas para perseguir e matar opositores, censurar a imprensa e invadir territórios vizinhos, desprezando o valor da democracia e da própria autonomia dos povos.
O segundo é que, ao usar sua posição no cenário internacional para defender aliados econômicos e ideológicos, e não princípios universais, Lula aprofunda uma linha desastrosa já traçada por Bolsonaro e vai aos poucos dilapidando o grande patrimônio de política externa do Brasil — ser um mediador equilibrado respeitável para disputas e conflitos.
Por fim, mas não menos importante, a dúvida: qual o custo real dessa estratégia? O que temos a ganhar? O Brasil tem uma agenda ampla e ambiciosa a cumprir na economia, na saúde e no meio ambiente globais, expressa na pauta da reunião de cúpula do G20 que começou ontem no Rio de Janeiro.
Entre os objetivos estão obter financiamento para a transição climática em países pobres e intermediários, conseguir doações para um fundo global contra a fome, incluir a África no G20 e, fora do G20, aprovar a reforma do Conselho de Segurança da ONU.
Pode até ser que a “doutrina Amorim” ainda venha a produzir o efeito desejado e arranque concessões das potências globais. Por ora, tudo o que temos como saldo é um constrangimento diplomático e uma chuva de memes.