Malu Gaspar
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Malu Gaspar

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Informações da coluna

Por Johanns Eller

Dois gestos exibidos ontem na Câmara dos Deputados ajudam a entender o significado da tumultuada negociação que acabou com a aprovação da MP dos Ministérios, por ampla maioria, no final da noite de quarta-feira.

O primeiro foi o silêncio que imperou após a vitória folgada. Não houve comemorações nem na base lulista mais fiel, o que seria natural após um dia inteiro de sufoco.

O segundo foi a declaração do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a respeito da votação de que agora “o governo vai ter que andar com suas pernas” e que “não haverá nenhum tipo de sacrifício” da parte da Casa.

O recado não poderia ser mais claro, e traduz a aposta corrente no Congresso: para evitar novas crises, o petista terá que acolher Lira como sócio de seu governo.

Segundo três fontes de diferentes segmentos políticos ouvidas pela equipe da coluna, a crise da MP dos Ministérios colocou o governo Lula em uma nova e imprevisível fase, na qual o Centrão deverá assumir cargos-chave e um maior controle sobre o orçamento de emendas discricionárias.

O custo dessa sociedade deverá ficar claro nos próximos dias, mas é certo que a partir desta quinta-feira “tudo vai mudar”.

Segundo o próprio Lira contou em entrevista, uma das promessas de mudança feita pelo próprio Lula é na articulação política, embora não tenha mencionado trocas nos ministérios do Palácio do Planalto.

Os deputados reclamam que suas emendas não são liberadas e de que tanto a Casa Civil de Rui Costa como a Secretaria de Relações Institucionais de Alexandre Padilha passam por cima de acordos fechados com os líderes partidários. Reclamam, ainda, de não serem avisados de visitas dos ministros a seus estados de origem, para que possam faturar politicamente com a entrega de obras e melhorias.

A relação do Planalto com o Congresso estava tão esgarçada que nem mesmo a liberação de R$ 1,7 bilhão em emendas pela articulação política do Planalto sensibilizou parlamentares, que passaram a questionar a credibilidade desses ministros para negociar em nome de Lula.

"A partir de hoje, se a coisa não mudar, não se vota mais nada", diziam Lira e seus aliados na Câmara, na noite de ontem.

O resultado da votação — 337 votos contra 125 – demonstra que Lira pode cumprir a ameaça. Sem ele, o governo amanheceria nesta sexta-feira com a Esplanada dos Ministérios de Jair Bolsonaro. Com o Planalto sem crédito na praça e desorientado quanto às suas agendas prioritárias, o presidente da Câmara, por óbvio, não foi movido pela benevolência.

Lula, por sua vez, entrou em cena porque não lhe restava outra opção. O impacto que a derrubada dos ministérios traria à credibilidade de um mandato que ainda nem completou seis meses seria desastroso.

A vitória com gosto de derrota reflete, nas palavras de uma fonte ligada ao Centrão, a estratégia do bloco de surfar em crises para vender soluções. Depois de todo o tumulto de um dia que teve ameaças, reuniões, telefonemas e muito estresse, o PP de Lira entregou 34 votos favoráveis e apenas nove contrários. O Republicanos, outra sigla do Centrão que mantém o discurso de independência, teve 31 deputados a favor e sete contra.

Embora não se conheça totalmente o tamanho da recompensa negociada nos bastidores dos palácios ao longo da quarta-feira, é certo que ela envolverá, mais cedo ou mais tarde, uma troca de guarda nos ministérios em que os próprios partidos aliados têm assento. Ao longo da noite de quarta e nesta manhã, falava-se que Lula nomearia novos ministros para o União Brasil.

Já se sabe, ainda, que a Câmara pretende votar ainda hoje uma emenda devolvendo à estrutura dos ministérios a Funasa – feudo do Centrão que o governo extinguiu logo na posse.

Não é exagero dizer que a crise das MPs marcou um divisor de águas na relação entre a Casa e o Palácio do Planalto. A dúvida é se Lula, que disse na semana passada que o jogo político havia apenas começado, já compreendeu o tamanho da enrascada.

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