Malu Gaspar
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Malu Gaspar

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Informações da coluna

Por Johanns Eller

Um dos cotados à indicação de Lula para a Procuradoria-Geral da República, o vice-procurador-geral eleitoral Paulo Gonet, engavetou uma representação do Ministério Público Federal (MPF) contra Jair Bolsonaro pelos ataques ao sistema eleitoral brasileiro na reunião com embaixadores, às vésperas da campanha presidencial de 2022.

A reunião, realizada em julho no Palácio do Planalto, foi justamente o que levou o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a tornar o ex-presidente inelegível.

Mas o processo contra Bolsonaro só foi aberto a partir de uma ação apresentada pelo PDT também em agosto.

Isso porque embora o subprocurador e chefe da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, Carlos Vilhena, tivesse protocolado uma notícia de ilícito eleitoral subscrita por 27 procuradores dos direitos do cidadão de todas as unidades da federação, Gonet ignorou o pedido.

A Procuradoria funciona como uma espécie de “ombudsman” do MPF na defesa dos direitos constitucionais, mas só pode fazer representações ou atos de ofício, não mover ações contra candidatos.

Só quem pode denunciar presidenciáveis em ações eleitorais é a Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE), representada no TSE justamente por Gonet.

Segundo apurou a equipe da coluna, o órgão arquivou prontamente o caso sem comunicação formal à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), autora da representação.

Só um mês depois da reunião, em agosto, é que Gonet tomaria uma providência – já movido pela repercussão do caso, mas sem mencionar a representação dos procuradores e nem as alegações falsas de Bolsonaro.

Na representação arquivada por Gonet, os procuradores listavam e desmentiam 19 alegações falsas de Bolsonaro na reunião com embaixadores e afirmavam que o então presidente agiu em “clara campanha de desinformação” ao “atacar explicitamente o sistema eleitoral brasileiro, proferindo inverdades contra a estrutura do Poder Judiciário Eleitoral e a democracia brasileira” com o objetivo de semear a desconfiança sobre as instituições democráticas e a imprensa livre.

Ao manifestar-se sobre o caso no TSE, Gonet defendeu a retirada do vídeo da reunião das redes sociais, além de multa à campanha de Bolsonaro. Os dois pedidos foram atendidos. Em setembro, a corte eleitoral aplicou multa de R$ 20 mil.

O fato de Gonet não ter tido uma atitude mais enérgica – como, por exemplo, propor uma ação de investigação judicial eleitoral (Aije), que permite a coleta de provas e pode levar à inelegibilidade – causou grande incômodo no MPF.

Na avaliação de integrantes do MPF, Gonet preferiu tomar medidas mais suaves para se eximir do ônus de enfrentar um presidente candidato à reeleição em meio a um cenário de crise institucional e optou por deixar o desgaste para os partidos, aos quais também cabe o ajuizamento dessas Aijes.

Foi o que o PDT fez no dia 19 de agosto, quando a legenda protocolou uma ação no TSE pedindo a inelegibilidade de Bolsonaro pelos ataques infundados à Justiça Eleitoral na reunião dos embaixadores.

Só em abril deste ano, com Lula já eleito e Bolsonaro na mira do Supremo e da Polícia Federal, Gonet se manifestou pela sua condenação de Bolsonaro no processo conduzido por Alexandre de Moraes.

Era um momento em que a disputa para a sucessão de Augusto Aras na PGR começava a ganhar forma nos bastidores, e o vice-procurador-geral eleitoral mudou de tom e passou a ser bem mais enfático em suas falas sobre Bolsonaro. Chegou a dizer inclusive que as ações do então presidente tinham um “infesto potencial antidemocrático”.

Bolsonaro acabou condenado pelo TSE por um placar de 5 a 2, e, por consequência, não poderá disputar eleições até 2030.

A posição de Gonet no julgamento serviu de cartão de visitas de sua candidatura à PGR frente ao Palácio do Planalto. Mas não garantiu unanimidade no partido de Lula, o PT.

Alas da sigla veem com reserva seu histórico no MPF. Gonet, crítico declarado do direito ao aborto, já foi cotado para a mesma PGR no governo Jair Bolsonaro com o apoio declarado da deputada federal Bia Kicis (PL-DF), integrante da tropa de choque bolsonarista, que o classificou na época como “conservador raiz” e “cristão”.

Além disso, nos anos 90, o subprocurador se manifestou contra o reconhecimento da responsabilidade do Estado brasileiro sobre a morte de opositores da ditadura militar em casos emblemáticos, como o da estilista Zuzu Angel e do guerrilheiro Carlos Marighella, na Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos. A posição foi repudiada por entidades de direitos humanos na época.

Esses mesmos setores temem que a eventual indicação de Gonet empodere ainda mais Moraes e Gilmar, ministros que concentraram muito poder nos últimos anos, desequilibrando o jogo de forças no Supremo.

Além de Gonet, também estão cotados para a vaga os subprocuradores Antonio Carlos Bigonha, Aurélio Virgílio Veiga Rios e Carlos Frederico Santos. Todos correm por fora, já que não participaram da votação interna da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). Confirmada a tendência, será a primeira vez que um governo petista desrespeitará a lista tríplice da entidade, que neste ano é formada por Luiza Frischeisen, Mario Bonsaglia e José Adonis.

O procurador-geral é a única autoridade com poder para denunciar criminalmente presidentes da República e demais autoridades com foro privilegiado no Supremo. Lula, por sua vez, já deixou claro nos bastidores que deseja evitar um “novo Rodrigo Janot” e indicar um PGR que não traga “surpresas”.

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