Malu Gaspar
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As chuvas no Rio Grande do Sul já deixaram 538.545 pessoas desalojadas desde a ocorrência dos primeiros temporais no fim de abril, segundo o boletim da Defesa Civil gaúcha divulgado no fim da manhã desta terça-feira. O número representa mais de 70% de todas as que precisaram deixar suas casas em decorrência de desastres na série histórica do Atlas Digital de Desastres do Brasil.

O levantamento da plataforma, mantida pelo Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional, contabiliza 730 mil desalojados ou desabrigados entre 1991 e 2022. Não contempla, portanto, as estatísticas da tragédia no Rio Grande do Sul.

O Atlas não conta apenas os que perderam as casas em decorrência de enxurradas, deslizamentos e inundações, como no Rio Grande do Sul. Também são computadas as vítimas de estiagens e secas, ondas de calor, incêndios florestais e rompimentos de barragens, por exemplo.

De acordo com o levantamento, 9 milhões de brasileiros tiveram que sair de onde moravam em razão dos desastres. Até as chuvas das últimas semanas, o Rio Grande do Sul era o quarto estado mais afetado.

“A análise dos dados indica que o Brasil entrou em uma nova era, a das catástrofes socioambientais”, diz Victor Marchezini, sociólogo do Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden), que pesquisa o impacto de tragédias nas populações atingidas e trabalha rotineiramente com o Atlas do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional.

“Diferente dos desastres, nas catástrofes há destruição significativa das infraestruturas públicas e comprometimento dos serviços básicos em uma bacia hidrográfica ou estado, ao mesmo tempo em que centenas de milhares de pessoas perdem suas moradias e seus meios de vida”, segue Marchezini, que também coordena o projeto de Capacidades Organizacionais de Preparação para Eventos Extremos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

“O sistema indica 1,2 milhão de deslocamentos forçados no Brasil apenas entre 2021 e 2022. É um número muito alto, muito significativo”.

Maior desastre associado a inundações

Para o sociólogo do Cemaden, o número expressivo de desalojados no Rio Grande do Sul já configura o maior desastre associado a inundações.

“Em termos de concentração de afetados em uma dada bacia hidrográfica, esse, sem dúvidas, é o maior. Supera até o do Vale do Itajaí, em Santa Catarina, em 2008”, explica Marchezini,

Em 2008, em Santa Catarina, enchentes forçaram 80 mil pessoas a abandonar suas casas.

“Uma coisa muito impressionante desse desastre no Rio Grande do Sul é que ele afeta centenas de milhares de pessoas. Ações paliativas no momento de solidariedade, como as doações, não darão conta dos efeitos que irão durar muitos anos. Serão necessários mecanismos de proteção social, profissionais da psicologia de emergências e desastres e pessoas que pensem em mecanismos para ajudar essas pessoas a se recuperar socioeconomicamente”.

O número de desalojados pode aumentar nos próximos dias em função dos fortes temporais que atingiram o estado no último final de semana, que podem desencadear novas cheias, como tem alertado o governo gaúcho. O nível do Lago Guaíba, por exemplo, ultrapassou novamente a marca de 5 metros ontem.

Na última segunda-feira, o governador Eduardo Leite (PSDB) fez um apelo para que moradores que tiveram suas casas inundadas.

“Pedimos a todas as pessoas que tiveram suas residências inundadas que não voltem para esses locais. E quem voltou, saia. Deixem essas localidades imediatamente e se coloquem em segurança”, declarou Leite.

Os reflexos da devastação em muitas das cidades a longo prazo ainda são desconhecidos. Prefeitos já admitem reconstruir municípios fora das áreas destruídas pelas chuvas, e centenas de milhares de pessoas ainda não sabem se poderão voltar para casa.

O cenário de terra arrasada levou muitas pessoas a compararem a tragédia no Sul com o furacão Katrina, que deixou quase 2 mil mortos nos Estados Unidos, em 2004. Questionado sobre a associação, o sociólogo do Cemaden lembrou que muitos moradores da cidade de Nova Orleans, a mais atingida, deixaram a região após o desastre e se espalharam por diferentes estados americanos.

“Não sabemos dizer ainda se haverá uma diáspora a partir do deslocamento provocado por essas chuvas, se teremos pessoas deixando cidades arrasadas. É algo que teremos que acompanhar”, diz Marchezini.

O pesquisador, porém, destaca que já é possível apontar uma similaridade entre as duas tragédias.

“Mas tanto no caso do Katrina como no caso do Rio Grande do Sul observamos uma série de decisões erradas por parte das autoridades sobre o uso do solo, a criação de aterros, a falta de manutenção de diques e outras coisas que potencializaram esse desastre”.

SC lidera o ranking de deslocados

O estado com o maior número de brasileiros deslocados por desastres na série histórica do Atlas é Santa Catarina, com 1,17 milhão de pessoas deslocadas, seguido do Amazonas, com 1,16 milhão, e de Minas Gerais, com 900 mil pessoas.

O Rio de Janeiro, que registrou o pior desastre natural do Brasil em número de óbitos em 2011, na Região Serrana, aparece em quinto lugar com 600 mil.

O Atlas também estima que os desastres provocaram prejuízos de R$ 502 bilhões ao longo de 30 anos e contabiliza 4.728 mortes decorrentes das tragédias.

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