Malu Gaspar
PUBLICIDADE
Malu Gaspar

Análises e informações exclusivas sobre política e economia

Informações da coluna
Por e

A manutenção do veto de Jair Bolsonaro a trechos da Lei de Segurança Nacional que criminaliza as fake news, decidido na Câmara dos deputados por por 317 votos a 139, foi encarada em Brasília como uma demonstração de força do ex-presidente contra a articulação política do governo Lula. Mas Bolsonaro esteve perto de perder a queda de braço.

O episódio demonstra como governo e oposição se organizaram desde o início de maio, quando foi feito um acordo de líderes partidários que adiou pela terceira vez a análise de uma série de vetos presidenciais, entre os quais o de Lula à saidinha de presos e o de Bolsonaro à punição de fake news.

Naquele momento, o governo não tinha votos suficientes para manter os vetos de Lula, mas calculava ser capaz de derrubar um veto de Bolsonaro ao artigo que tipificava o crime de disseminação de notícias falsas. O líder do governo Randolfe Rodrigues (sem partido-AP). ameaçou: se votassem os vetos de Lula naquele momento, colocariam também as fake news para votação.

A oposição recuou na hora. O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho mais velho do ex-presidente e líder da minoria no Congresso, admite que aceitou o acordo porque havia um risco real de derrota. "“Nossa base não sabia, na realidade, do que se tratava a lei. Iam votar sem saber”, disse Flávio à equipe da coluna.

O acerto visava dar ao Palácio do Planalto mais tempo para evitar uma derrota no caso das saídas temporárias, mas acabou dando também a Bolsonaro a chance de virar o jogo.

Nos 19 dias que se passaram desde o adiamento dos vetos, Flávio e o pai deflagraram uma força-tarefa que envolveu reuniões de Jair Bolsonaro entre lideranças das frentes parlamentares da agricultura, segurança pública e a evangélica.

Nesses encontros, ele pediu aos deputados que gravassem vídeos para redes sociais com o objetivo de, segundo ele, “criar uma onda” a favor da preservação do veto para pressionar outros colegas a votar a favor de Bolsonaro.

De acordo com o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), um dos integrantes da frente evangélica, ficou claro nessas reuniões que os deputados estavam desarticulados.

Vários vídeos foram postados pelas lideranças, incluindo um publicado por Flávio em suas redes no qual o senador pediu aos seus seguidores que pressionassem parlamentares a votar pela manutenção do que ele chamou de "veto da liberdade".

“Cada dia fica mais claro que a real intenção é censurar quem fala algo que os desagrada ou é contra o atual governo. Eles não suportam quem tem uma opinião diferente deles”, disse o filho mais velho de Bolsonaro.

“Essa votação vai acontecer na próxima terça-feira e talvez seja uma das mais importantes que vamos enfrentar. A liberdade de expressão corre sério no Brasil. Cobre dos deputados e senadores”.

A estratégia funcionou. Foram 60 votos a mais do que o mínimo necessário para manter a supressão do trecho que incomodava o bolsonarismo por prever a tipificação do crime de “comunicação enganosa em massa”, ou seja, a disseminação de informações falsas a ponto de comprometer a legitimidade das eleições.

Bolsonaristas argumentam que a redação do texto era vaga e abria caminho para a “censura” de apoiadores do ex-presidente e opositores do governo Lula e favorecia até o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST).

Após o resultado da votação na Câmara, o senador e líder da minoria comemorou nas redes e declarou que, com o veto mantido, “a democracia ainda respira”.

Pauta de costumes

No mesmo período em que o bolsonarismo se reagrupou e se organizou para a votação da terça, o governo perdeu a vantagem que tinha nas fake news e não avançou nas outras votações.

O Planalto perdeu todos os embates ligados à chamada "pauta de costumes" — além das saidinhas e das fake news, também foram derrubados vetos à instalação de clubes de tiro em locais próximos a escolas e à restrição do empenho de recursos do orçamento em temas que contrariem a pauta conservadora, como o financiamento do MST e cirurgias de mudança de sexo em crianças.

Só o acordo em torno das emendas parlamentares foi mantido. Os deputados queriam R$ 5 bilhões, mas o governo conseguiu segurar os R$ 3,6 bilhões combinados no início do mês.

"O governo ficou relaxado, achando que a questão estava resolvida, e a gente trabalhando", disse Flávio.

Mais do que preocupação com questões ideológicas, o esforço dos Bolsonaro visa mostrar que ele ainda está no jogo e com condições de movimentar peças no xadrez de Brasília em um ano eleitoral e a oito meses da eleição para a presidência da Câmara.

O resultado deixou os bolsonaristas animados, mas Lula pretende reagir, organizando pessoalmente seus líderes e as bancadas para votar pelo governo. A queda de braço vai mostrar quem tem mais força: a máquina partidária ou as redes sociais da direita.

Capa do audio - Malu Gaspar - Conversa de Bastidor
Mais recente Próxima Lula vai retomar encontros com partidos da base para evitar novas derrotas no Congresso