Malu Gaspar
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Malu Gaspar

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Por — Brasília

A posse da ministra Carmém Lúcia na presidência do TSE , no lugar do ministro Alexandre de Moraes, que está deixando o tribunal, abre caminho para um estilo de gestão mais "centrado e equilibrado". É como integrantes da Corte resumem a expectativa em relação ao período que se inicia com a posse de Cármen Lúcia, nesta segunda-feira.

A principal aposta nos bastidores é a de que Cármen vai abandonar o estilo mais combativo e beligerante que foi a marca de Moraes no comando do TSE, especialmente em relação ao bolsonarismo.

Isso se aplicaria não apenas aos posicionamentos públicos da ministra, mas também à relação com o parlamento, e em julgamentos que devem ocorrer nos próximos meses no tribunal, como o do senador Jorge Seif (PL-SC).

Um dos integrantes da tropa de choque bolsonarista no Senado Federal, Seif é investigado por abuso de poder econômico sob a acusação de utilizar a estrutura da empresa Havan, inclusive a frota aérea, durante a campanha eleitoral de 2022. Ele nega.

Nos bastidores, Cármen deu sinais de que se preocupa com as repercussões jurídicas e políticas de decisões tomadas pelo Judiciário, seja no TSE ou no Supremo Tribunal Federal (STF) – e já sinalizou que não vê até o momento provas que justifiquem a cassação do senador catarinense.

Sua prioridade, ela tem indicado, será elaborar uma regulamentação para as eleições deste ano que iniba o uso de ferramentas de inteligência artificial para a disseminação de fake news.

O tribunal está especialmente empenhado em enfrentar o uso de tecnologias como os vídeos conhecidos como deep fakes, uma técnica que permite alterar o rosto de uma pessoa em vídeos para distorcer a realidade e atribuir a ela uma fala que ela não disse, por exemplo.

A solenidade que vai marcar a presidência de Cármen no TSE ocorrerá na noite desta segunda-feira. O mandato dela prevê que a ministra fique no comando do tribunal até agosto de 2026, às vésperas das eleições presidenciais.

“A ministra Cármen Lúcia enfrentará um grande desafio ao tentar manter avanços da gestão anterior”, diz o Adriano Alves, integrante da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), em referência à atuação de Moraes no combate às fake news.

“Mas neste momento, cabe a ela buscar um equilíbrio que, de certa forma, não foi alcançado nos últimos anos, seja por fatores midiáticos ou pelo próprio contexto político nacional.”

Diferenças de estilo

Por acumular tanto poder, à frente do TSE e da relatoria dos principais inquéritos que já fecharam o cerco contra o clã Bolsonaro, Moraes se tornou o inimigo público número 1 do ex-presidente e seus aliados, como o bilionário Elon Musk, dono da rede social X (o antigo Twitter).

Cármen, por outro lado, não é o alvo preferencial dos ataques da bancada bolsonarista, que a consideram mais ponderada e aberta ao diálogo – e avessa ao ringue político.

Fontes ouvidas pela equipe da coluna apontam que um julgamento ocorrido em fevereiro deste ano no plenário do STF deste ano dá pistas das diferenças de estilo entre Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes.

Na ocasião, o Supremo tratou das regras das chamadas sobras de vagas eleitorais, que poderia alterar a composição das bancadas da Câmara dos Deputados e fazer com que sete parlamentares perdessem o mandato imediatamente: Augusto Pupio (MDB-AP), Gilvan Máximo (Republicanos-DF), Lázaro Botelho (PP-TO), Lebrão (União Brasil-RO), Professora Goreth (PDT-AP), Silvia Waiãpi (PL-AP) e Sonize Barbosa (PL-AP).

As sobras eleitorais são as vagas que restam depois da divisão pelo quociente eleitoral — um índice que é calculado a partir do número de votos recebidos e das vagas disponíveis. Uma lei de 2021 estabeleceu que só pode disputar as sobras o partido que tiver ao menos 80% do quociente eleitoral, e os candidatos que tenham obtido votos de ao menos 20% desse quociente.

Três partidos – Rede, PSB e Podemos – alegaram ao Supremo que a mudança na regra feriu o pluralismo político e a igualdade de chances. O tema dividiu o plenário do STF, que fez duas votações para resolver a controvérsia.

Em um primeiro momento, os ministros concordaram com as alegações das legendas e declararam a lei inconstitucional por 7 a 4, por limitar o pluralismo político. Na segunda votação, decidiram se o entendimento deveria ser aplicado imediatamente ou não. Pelo apertadíssimo placar de 6 a 5, o STF decidiu preservar o mandato dos atuais parlamentares que corriam o risco de serem ejetados da Câmara.

Tanto Cármen quanto Moraes declararam a lei inconstitucional, mas a ministra ficou do lado da corrente vencedora de preservar o mandato dos atuais parlamentares, enquanto Moraes defendeu o entendimento de que eles deveriam perder o cargo imediatamente.

“Esse precedente é desastroso, com todo respeito à maioria formada. O Supremo, por maioria, entendeu que houve desrespeito à soberania popular, que houve desrespeito ao sistema representativo, e nós vamos manter sete deputados eleitorais que não foram eleitos. Nós decidimos que eles não foram eleitos (já que a lei foi declarada inconstitucional)”, protestou Moraes, sem esconder de ninguém a irritação no plenário.

Sem citar Moraes diretamente, Cármen Lúcia rebateu o colega:

“Só um esclarecimento: eu votei no sentido da invalidade constitucional da norma. No meu voto, eu não digo que não houve eleição de quem está na Câmara dos Deputados. Eu votei que a norma, sob a égide da qual foram considerados eleitos pela Justiça Eleitoral, diplomados e empossados, pela nossa interpretação e julgamento, não tinha a validade que se esperava”.

Se a posição de Moraes tivesse prevalecido, entrariam no lugar na Câmara Aline Gurgel (Republicanos-AP), André Abdon (PP-AP), Paulo Lemos (PSOL-AP), Professora Marcivania (PCdoB-AP), Rafael Fera (Podemos-RO), Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) e Tiago Dimas (Podemos-TO).

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