Malu Gaspar
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Os advogados de Jair Bolsonaro pediram à Procuradoria-Geral da República (PGR) nesta sexta-feira (2) o arquivamento do inquérito que investiga a incorporação de joias recebidas de presente de um príncipe da Arábia Saudita ao patrimônio pessoal do ex-presidente. Entre os bens, avaliados pela Polícia Federal (PF) em R$ 6,8 milhões, estão relógios cravejados de diamantes e banhados a ouro, anéis e abotoaduras.

No documento, a defesa pede que seja dado a Bolsonaro o mesmo tratamento de Lula, que teve arquivado um pedido de investigação sobre relógios de luxo recebidos de presente de chefes de Estado. Dizem, ainda, que o inquérito aberto por Alexandre de Moraes para apurar o caso configura abuso de autoridade e que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) deveria ter esperado uma decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre o episódio antes de iniciar uma investigação criminal.

O inquérito concluiu que Bolsonaro, assessores e aliados montaram um esquema para desviar e vender as peças no exterior. As negociações teriam sido feitas sempre através “de pessoas interpostas e sem utilizar o sistema bancário formal, com o objetivo de ocultar a origem, localização e propriedade dos valores”.

A PF também levantou a possibilidade de que o dinheiro fosse destinado ao custeio da estadia de Bolsonaro e sua família nos Estados Unidos, para onde ele viajou na véspera da conclusão de seu mandato. No indiciamento, a corporação pediu que Bolsonaro fosse denunciado pela PGR por peculato, lavagem de dinheiro e associação criminosa.

O principal argumento usado na peça de 98 páginas apresentada pela defesa de Bolsonaro à PGR é de que o caso do ex-presidente deveria ser equiparado ao de Lula, que manteve consigo relógios de luxo recebidos de presente em seu primeiro mandato – como um Piaget recebido do então presidente francês Jacques Chirac avaliado em R$ 80 mil e um Cartier Santos Dumont de cerca de R$ 60 mil dado pela própria fabricante.

Em outubro passado, a PGR opinou pelo arquivamento da representação feita pelo deputado federal Rodrigo Valadares (União-SE), por considerar que o pedido de investigação contra Lula tinha "viés político". Alexandre de Moraes acatou o parecer do subprocurador Carlos Frederico Santos e encerrou o caso.

Para a defesa, o fato de o mesmo critério não ter sido aplicado a Bolsonaro "evidencia uma absurda e perturbadora violação dos princípios da isonomia e da obrigatoriedade penal".

Os advogados de Bolsonaro afirmam ainda que a lei sobre os presentes recebidos pelo presidente da República diz respeito apenas a itens presenteados por chefes de estado, o que não seria o caso das joias sauditas, dadas pelo príncipe Abdulaziz bin Salman Bin Abdulaziz Al-Saud, ministro de Energia da Arábia Saudita.

Segundo a defesa, o ex-presidente incorporou as joias sauditas a seu patrimônio depois de consultar o Departamento de Documentação Histórica da Presidência da República, que em ofício afirmou que os bens deveriam ser registrados como parte do acervo privado. Nesse caso, sustentam os advogados, o desvio das joias teria sido uma "falha administrativa" e não uma questão criminal.

"A conclusão, então, é óbvia: se não sabia que os bens poderiam ser públicos – e ressalte-se que até hoje não há certeza sobre a natureza dos bens, haja vista ao menos a pendência de julgamento processo 011.591/2016-1 pelo TCU –, não pode Bolsonaro ter querido deles se apropriar, logo, não houve peculato doloso", escreveu o advogado Paulo Amador da Cunha Bueno.

O fato de o caso de Bolsonaro ainda não ter sido julgado pela corte de contas também é usado pela defesa do ex-presidente para tentar convencer a PGR a pedir o arquivamento do inquérito.

"Ao menos dever-se-ia aguardar o deslinde do feito no Tribunal de Contas da União para se vislumbrar alguma possível tipicidade penal, sendo certo que a instauração e continuação de uma investigação absolutamente prematura e desprovida de plausibilidade jurídica configura inadmissível abuso de autoridade", escreveram os advogados.

Portaria do governo Temer

A defesa de Bolsonaro recorre ainda a uma portaria de 2018 publicada pela Secretaria-Geral da Presidência no governo Michel Temer, que incluía “joias, semijoias e bijuterias” entre os itens que poderiam ser incorporados ao patrimônio pessoal de presidentes da República – chamados de “bens de natureza personalíssima”.

Só que essa a portaria foi revogada pelo próprio Bolsonaro, em 2021, em linha com um acórdão do TCU de 2016 que excluía joias da relação de bens personalíssimos. Ainda assim, os advogados do ex-presidente sustentam que “a interpretação histórica” do texto de Temer merece ser levada em conta por fornecer “valioso insight sobre as diretrizes seguidas à época para garantir a integridade e a transparência na gestão de bens públicos”.

Na peça, a defesa também se queixa de não ter tido acesso à delação do ex-ajudante de ordens Mauro Cid, firmada pelo tenente-coronel do Exército junto à Polícia Federal e homologada pelo Supremo Tribunal Federal. A PGR negou no último dia 24 um pedido dos advogados do ex-presidente para conhecer o teor da colaboração, que também já tinha sido recusado pelo Supremo. A defesa alega que as negativas contrariam a jurisprudência do tribunal e o direito à ampla defesa.

Cid é um dos personagens-chave do inquérito das joias. Além de intermediar a evasão dos kits de luxo do Brasil, quando Bolsonaro partiu para um autoexílio nos EUA para não passar a faixa a Lula, ele negociou a venda de bens nos Estados Unidos junto com seu pai, o general Mauro Lourena Cid, segundo o relatório da PF.

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