Marcelo Ninio
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Marcelo Ninio

Repórter desde 1989, passou por O GLOBO, Jornal do Brasil, EFE e Folha de São Paulo.

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Marcelo Ninio

Passou pelas redações do Jornal do Brasil, Agência EFE e Folha de S.Paulo. Tem mestrado em relações internacionais pela Universidade de Jerusalém.

Por Marcelo Ninio — Pequim

Quando o G7 organizou sua primeira reunião de cúpula, em 1975, 70% do PIB mundial estavam concentrados ali, no clube de economias mais avançadas. O eixo girou e a fatia encolheu. No encontro deste ano, marcado para o fim de semana no Japão, os números são testemunha da transformação do mundo desde então. Hoje, a participação do G7 no PIB mundial é de 30%, virtualmente empatada com a do Brics, o grupo de economias emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.

A comparação talvez não fizesse sentido uns anos atrás, dada a disparidade entre os países. Afinal, o “G2” de EUA e China compõe metade do total de cada lado. Mas ela ganha visibilidade em meio à competição entre Pequim e Washington, que tende a empurrar as peças do tabuleiro para a formação de blocos. Ainda que as duas potências neguem a intenção de fomentar divisões, a disputa tem sido marcada pela busca de parcerias.

A China promove a ideia de ampliar o Brics, como um contraponto do mundo em desenvolvimento ao G7. Mas é cautelosa para não forçar demais a mão e diminuir o espaço de manobra de países que mantêm boas relações com os dois lados como o Brasil, que este ano volta a participar da cúpula do G7 como convidado. Para os americanos, a divisão é mais explícita, entre democracias e autocracias. Cabe aos demais países do G7 pressionar os EUA a repensar a hostilidade contra a China para evitar a formação de dois blocos, aconselhou o Nobel de Economia Joseph Stiglitz.

A guerra na Ucrânia obviamente estará no topo da agenda do G7, por sua urgência e proximidade geopolítica dos membros — EUA, Alemanha, França, Canadá, Itália, Japão e Reino Unido. Mas é a rivalidade com a China a real preocupação sistêmica do G7. A palavra do momento é “de-risking”, que indica o desejo de diminuir os riscos econômicos associados ao poderio chinês. O vocabulário teve de ser adaptado à realidade.

Não se fala mais tanto em “decoupling” (desacoplamento) porque o tamanho da China na economia mundial tornou a meta quase impossível, além de um golpe que os países do G7 não querem absorver. Todos têm elos significativos com o mercado chinês. Em tese, a interdependência econômica seria um freio contra uma escalada entre potências rivais, por elevar o custo de um confronto. É o que se pensava no início da globalização.

Mas o efeito também pode ser o oposto, como demonstrou um estudo feito por Dale Copeland, da Universidade de Virgínia, nos EUA. No livro “Interdependência econômica e guerra”, de 2015, ele analisou 30 conflitos entre 1790 e 1991 e concluiu que a integração comercial pode ser um fator de instabilidade se houver expectativa de que os fluxos serão obstruídos, interrompendo o acesso a matérias-primas e mercados. Esse temor turbinou a política agressiva do Japão em 1941, lembra Copeland, após o embargo ao petróleo aplicado pelos EUA.

De volta ao conceito em artigo recente na revista Foreign Affairs, Copeland alerta que a escalada de sanções americanas ao suprimento de chips avançados para a China cria o risco de forçá-la contra a parede a ponto de deflagrar um conflito, assim como ocorreu em 1941. Para ele, os EUA devem lembrar a lição de que “destruir as expectativas de um Estado sobre o futuro do comércio pode levar à guerra”. Hiroshima, sede da cúpula do G7 deste ano, é um local tragicamente apropriado para esse tipo de reflexão.

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