Marcelo Ninio
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Marcelo Ninio

Repórter desde 1989, passou por O GLOBO, Jornal do Brasil, EFE e Folha de São Paulo.

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Marcelo Ninio

Passou pelas redações do Jornal do Brasil, Agência EFE e Folha de S.Paulo. Tem mestrado em relações internacionais pela Universidade de Jerusalém.

Por — Pequim

RESUMO

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GERADO EM: 02/07/2024 - 04:30

Extrema direita na Europa e a China: impactos geopolíticos

A ascensão da extrema direita na Europa pode fortalecer laços com a China, ameaçando a democracia e mudando o equilíbrio geopolítico, com partidos como o RN de Le Pen se aproximando de Pequim.

Além de formar nuvens sobre o futuro da democracia no continente, o fortalecimento da extrema direita na Europa pode ter um impacto geopolítico inesperado, ao inclinar o balanço de forças em favor da China. Partidos de ultradireita como o de Marine Le Pen, que largou na frente na eleição legislativa da França, tendem a oferecer mais espaço de manobra ao país asiático que os de centro, a despeito das diferenças ideológicas.

Seja qual for o resultado do segundo turno na votação francesa de domingo, o pleito antecipado pelo presidente Emmanuel Macron já serviu para confirmar a tendência de alta dos partidos de extrema direita no continente, um movimento que foi marcante na recente eleição para o Parlamento Europeu. Justamente a vitória contundente nas eleições europeias do partido de Le Pen, o Reagrupamento Nacional (RN), foi o que levou Macron à arriscada decisão de antecipar a votação legislativa no país.

Para a Europa, a guerra na Ucrânia é o tema de política externa mais próximo e com possibilidade de ser afetado pelos novos ventos ultradireitistas. Alguns dos principais partidos de extrema direita europeus têm histórico de ligações com o Kremlin, como o Alternativa para a Alemanha (AfD) e o próprio RN de Marine Le Pen. Embora ela tenha endurecido o discurso contra a Rússia na atual campanha, seu partido não costuma respaldar resoluções de apoio à Ucrânia, nem na Assembleia Nacional Francesa e nem no Parlamento Europeu.

O registro de votação em Estrasburgo é também um indicador de como a ascensão da extrema direita pode beneficiar a China. Partidos ultradireitistas costumam votar sistematicamente contra decisões consideradas desfavoráveis à China no Parlamento Europeu. De olho nessa compatibilidade e em seus potenciais dividendos políticos, Pequim se aproximou da ultradireita europeia, num inusitado casamento de conveniência.

O elo chinês que mais deu o que falar foi com o AfD, partido alemão que ficou em segundo lugar nas eleições europeias do mês passado. Em meio ao triunfo, o cabeça de chapa do AfD, Maxmilian Krah, acabou sendo afastado do partido após se envolver em uma série de escândalos, entre eles a prisão de um assessor por suspeita de espionagem para a China. A acusação tocou num nervo com o governo chinês, que convocou a embaixadora alemã em Pequim para uma repreensão acima do tom de queixa protocolar.

O incidente causou ruído entre os países, mas não abalou a relação entre o AfD e a China. Pragmáticos e com uma queda por regimes autoritários, os ultradireitistas consideram um erro o governo de Berlim falar de direitos humanos na China e arriscar os interesses das cinco mil empresas alemãs com negócios no país asiático. O conhecimento sobre a China vem do topo: uma das líderes do AfD, Alice Weidel, viveu seis anos na China com uma bolsa acadêmica e fala mandarim fluentemente.

Assim como o AfD, o RN de Marine Le Pen também mantém relações amistosas com a China, marcadas por “um fascínio pelo caráter autoritário do governo e a ausência de críticas a seus excessos totalitários”, na descrição do semanário L’Express. Mesmo que a coalizão do presidente Macron seja derrotada no próximo domingo, ele continuará encarregado da política externa, como prevê o semipresidencialismo francês. Mas estará bem mais enfraquecido para guiar as relações europeias com a China.

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