Míriam Leitão
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Míriam Leitão

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Por Míriam Leitão

O presidente do Banco Central na entrevista concedida ao "Roda Viva", ancorada pela jornalista Vera Magalhães, foi conciliador, tentou explicar sua visão da economia, e quando perguntado sobre a possível intimação para ir ao Congresso, afirmou que quer ir,e já até procurou o presidente da Comissão de Assuntos Econômicos. “É meu trabalho, vou quantas vezes for necessário”.

Se valer a ditado que o presidente Lula usou recentemente, “quando um não quer dois não brigam”, o conflito criado pelo governo vai se dissolver. Campos Neto tratou como normal as divergências de opinião nesse primeiro teste do Banco Central independente.

Ele mandou vários recados de pacificação diante das perguntas feitas pela bancada de jornalistas de economia. E contornou as dificuldades que de fato tem. Vera perguntou logo na abertura sobre o grupo de Whatsapp de ministros dos quais participava e a camisa da seleção no dia de votar. Ele tentou escapar, mas foi insistentemente perguntado sobre esses fatos, que parecem pequenos mas são reveladores.

Negou atuação política do BC e justificou sua participação no grupo de WhatsApp de ministros do ex-presidente Bolsonaro, alegando que se limitava a dar informações técnicas e de conjuntura para os integrantes. Falou que fez amigos no governo Bolsonaro e espera também fazer no governo Lula.

Sobre ter usado a camisa da seleção brasileira nos dias de eleição, vestimenta que acabou sendo símbolo dos apoiadores de Bolsonaro, argumentou que isto não influenciou as decisões da política monetária. Mas o fato é que como presidente do Banco Central independente, isso foi um erro dele. Mas ele não fugiu das perguntas espinhosas.

Explicou diversas vezes porque a taxa de juros é 13,75% e como funciona a economia. Nem toda a dívida pública é corrigida pela Selic, apenas algo em torno de 25%, e o restante é formado por títulos de médio e longo prazo. E quem forma isto são as expectativas dos agentes econômicos, financeiros ou não.

– Eu não consigo simplesmente falar ‘vamos cair os juros porque precisa cair os juros’. Os juros são determinados pelo mercado, o BC determina uma parte, mas para isso se propagar para a curva de médio e longo prazo é preciso credibilidade.

Esse ambiente de crise criado pelo governo, pelo presidente da República e pelo PT só aumenta a tensão e a expectativa de que haja uma intervenção no Banco Central. Ou seja, se os juros caissem por isso não haveria a credibilidade da qual Campos Neto falou.

Nesse esforço de pacificação, ele fez elogios ao ministro Fernando Haddad e disse que foi importante a proposta de ajuste fiscal apresentada pelo ministro. E disse que não seria elegante da parte dele fazer sugestões de propostas de mudanças fiscais.

Em outro trecho da entrevista, Campos Neto disse que considera que a mudança na meta de inflação pode gerar o efeito contrário ao desejado. Mas se o Comitê Monetário Nacional (CMN) alterar a meta, ele vai cumprir.

– A gente segue, o BC tem autonomia operacional somente, a gente segue uma lei, e a lei hoje estipula o sistema de metas e a meta é determinada pelo governo. O BC tem autonomia operacional para executar a meta com os instrumentos que existem.

Apesar de Campos Neto ter explicado que mudança da meta pode ter o efeito contrário, eu acho que o governo vai continuar batendo nessa tecla. Na minha opinião, a reunião do CMN na quinta pode elevar a meta. Se for um um aumento pequeno será indolor. Por exemplo, se for de 3,25% para 3,5%, o teto vai para 5%, que é praticamente a inflação atual (5,77% em janeiro). Mas se tentar passar a meta 4,5%, número já falado pelo presidente Lula, acho um erro muito grande.

Campos Neto disse que é contra a mudança, mas lembrou que ele é minoritário dentro do Conselho. E que tentaram fazer uma mudança para que as decisões do CMN precisassem ser unânimes e ele discordou, ainda que isso o favorecesse.

– Eu fui contactado ‘vocês apoiariam o projeto’, eu disse que não. ‘Uai, mas esse projeto é melhor para você porque eles não conseguirão mudar a meta sem autorização de vocês’. Eu disse: o arcabouço de meta de inflação foi votado em lei, funciona, na primeira vez que tem autonomia e que ela vai ser testada é importante não ter mudança de regra no meio do jogo.

O governo Lula certamente vai continuar na sua agenda. Será um erro. Melhor é ouvir mais de uma vez a entrevista de Campos Neto. Lá há recados, conselhos e explicações importantes.

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