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O ritmo da opinião pública

Informações da coluna

Vera Magalhães

Jornalista especializada na cobertura de poder desde 1993. É âncora do "Roda Viva", na TV Cultura, e comentarista na CBN.

Pablo Ortellado

Professor de Gestão de Políticas Públicas na USP

Por Flávio Tabak — São Paulo

Uma das principais apostas para alavancar os índices de popularidade do presidente Jair Bolsonaro, o programa Auxílio Brasil já é compreendido pela ampla maioria da população como uma obra do pré-candidato do PL à reeleição. E isso não quer dizer que essa percepção será convertida, nos próximos três meses, em votos. A pesquisa “A cara da democracia” revela que, em respostas espontâneas (quando não são apresentadas opções aos entrevistados), 74% afirmam que Bolsonaro é o “responsável pela criação do Auxílio Brasil”. Outros 3% dizem que foi o ex-presidente e também pré-candidato Lula (PT), que lidera todas as pesquisas de opinião, e um quinto dos eleitores (21%) diz não saber.

Por outro lado, quando questionados sobre quem criou o Bolsa Família, 55% dos eleitores afirmam ter sido Lula, seguido por Fernando Henrique (10%), Bolsonaro (4%) e Dilma (2%). Um quarto da população (26%) diz não saber, número que revela um desconhecimento, ou esquecimento, mais acentuado do programa criado por Medida Provisória em 2003.

Transferência de renda e reconhecimento — Foto: Arte
Transferência de renda e reconhecimento — Foto: Arte

O Auxílio Brasil é visto pelo governo como um grande desafio de comunicação política para convencer milhões de beneficiários de que o Bolsa Família, após quase duas décadas e fortemente vinculado aos governos do PT, mudou de nome. Ele agora tem as digitais de um novo presidente e será parte de uma estratégia maior que inclui a PEC aprovada pelo Senado para ampliar o estado de emergência, autorizando gastos extras de mais de R$ 40 bilhões a poucos meses das eleições. Há ainda novas modalidades de auxílio, como para caminhoneiros e taxistas.

Medidas inócuas

Discussões sobre o design do cartão magnético, as cores impressas e o próprio nome do programa fazem parte dos esforços para essa transição, mas a pesquisa “A cara da democracia” mostra, no entanto, que a população já entendeu quem criou o Auxílio Brasil, e os esforços daqui em diante terão de lidar muito mais com a memória relacionada ao Bolsa Família do que com um esforço para carimbar o nome de um político sobre outro na concessão de cartões magnéticos carregados com dinheiro para lidar com a alta da inflação.

— O que Bolsonaro fez do ponto de vista político é muito perspicaz. O Bolsa Família é marca registrada do PT, mais do que um programa de Estado. E o governo Bolsonaro tentou interromper isso de alguma maneira. Com esses resultados aliados à corrida eleitoral, fica claro que o Bolsa Família está na memória da população. É simbólico, é marca do combate à desigualdade e que a população associa ao PT — analisa Lucio Rennó, professor de Ciência Política da UnB ao avaliar os resultados da pesquisa feita pelo Instituto da Democracia (INCT/IDDC).

O percentual dos que não sabem quem criou o Bolsa Família (um quarto) é maior do que o do Auxílio Brasil (um quinto) e isso reflete, segundo Rennó, uma certa perda de memória com o passar do tempo, aliada a críticas que o programa sofreu ao longo do tempo, como conotações de que era clientelista ou que não dava “a vara para pescar”, por mais que fosse majoritariamente aprovado pela população.

Apoio incondicional

Segundo a mesma pesquisa, 88% dos entrevistados apoiam o Bolsa Família, e 85%, o Auxílio Brasil. Portanto, na campanha eleitoral, Lula e Bolsonaro não terão o que discutir sobre a validade desses programas federais. Na avaliação de especialistas, o que vai contar é a forma como cada eleitor entende o benefício e, principalmente, com qual intuito cada um foi criado.

— Durante a pandemia, o auxílio emergencial foi importante para sustentar a popularidade de Bolsonaro, mas, em princípio, o Auxílio Brasil não necessariamente recaptura eleitores de baixa renda que o presidente vem perdendo desde a eleição — aponta o cientista político da UnB, acrescentando. — A aposta agora é massificar essa estratégia com a Proposta de Emenda Constitucional que amplia os projetos sociais. Apesar de fazer sentido politicamente, a ação pode ter sido apresentada tardiamente pela pré-campanha do presidente Bolsonaro.

Para Fábio Kerche, professor de ciência política da Uni-Rio, o alto reconhecimento do Auxílio Brasil como obra de Bolsonaro não substitui a ideia de que outros governos distribuíram renda:

— Eleitores podem até reconhecer que é uma iniciativa do atual governo, mas não a ponto de mudar a intenção de voto. Existe uma discussão sobre a credibilidade e compromisso de cada candidato com essa pauta. No caso de Bolsonaro, há desconfiança. Muitos podem se perguntar: “Por que não fez antes?” Reconhecer ou saber de quem veio não significa aderir.

Kerche aponta uma hipótese que pode estar presente na cabeça de muitos eleitores sobre o caráter “eleitoreiro” de medidas tão repentinas para distribuir renda.

— No fundo, muitos eleitores veem medidas aprovadas como tentativas de reverter as coisas na última hora. Essa carestia não vem de hoje. É uma hipótese, mas há um sentimento de ação eleitoreira, ao final dos 45 minutos do segundo tempo. Uma pessoa pode buscar o dinheiro por achar que é seu, que tem direito. E isso não necessariamente resulta em voto em Bolsonaro porque existe uma memória de que, no tempo do Lula, havia mais emprego. E o auxílio vem para quem está desemprego.

A pesquisa “A cara da democracia” foi feita pelo Instituto da Democracia (INCT/IDDC), com 2.538 entrevistas presenciais em 201 cidades, em todas as regiões do país. A margem de erro total é de 1,9 ponto percentual, e o índice de confiança é de 95%. Participaram as universidades UFMG, Unicamp, UnB e Uerj, com financiamento do CNPq e da Fapemig.

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