Pulso
PUBLICIDADE
Pulso

O ritmo da opinião pública

Informações da coluna

Vera Magalhães

Jornalista especializada na cobertura de poder desde 1993. É âncora do "Roda Viva", na TV Cultura, e comentarista na CBN.

Pablo Ortellado

Professor de Gestão de Políticas Públicas na USP

Por Janaína Figueiredo

O Peru é hoje motivo de preocupação regional e seu presidente, Pedro Castillo, um recordista em matéria de opinião pública negativa. Este mês, pesquisas divulgadas no país mostraram que o índice de desaprovação do chefe de Estado — que chegou ao poder por uma aliança de esquerda, está envolvido em escândalos de corrupção e vive em permanente tensão com o establishment político e econômico — oscila entre 67% e 76%, o mais alto já registrado por um presidente peruano com apenas um ano de gestão.

De acordo com Instituto de Estudos Peruanos (IEP), que realiza pesquisas de opinião pública mensais sobre a imagem do chefe de Estado e outros poderes, após um ano de governo os ex-presidentes Pedro Pablo Kuczynski e Martin Vizcarra, antecessores de Castillo, tinham 58% e 43% de aprovação, respectivamente. Ambos foram destituídos pelo Congresso antes de completarem seus mandatos.

Depois de uma eleição conturbada, um posterior pedido de auditoria por parte da ex-candidata presidencial Keiko Fujimori, filha do ex-presidente Alberto Fujimori (1990-2000), o atual presidente assumiu o poder em meados do ano passado com entre 41% e 45% de rejeição. Castillo fora eleito com 50,12% dos votos, superando por apenas 44 mil votos sua adversária.

Uma sucessão de denúncias de corrupção, trocas permanentes de gabinete e duas tentativas de impeachment fracassadas provocaram uma deterioração em sua imagem positiva, sobretudo na região metropolitana de Lima. Poucos acreditam no Peru que Castillo conseguirá completar os cinco anos de mandato. A grande dúvida que paira sobre o país — e que preocupa governos da região, entre eles o de Jair Bolsonaro, que se aproximou de Castillo no início deste ano — é até quando o presidente conseguirá sobreviver a disputas políticas, investigações judiciais e uma intensa campanha opositora através de redes sociais e meios de comunicação.

— Em geral, os presidentes peruanos perdem popularidade muito rápido, mas o caso de Castillo é excepcional. O interessante é que o presidente mantém entre 20% e 25% de apoio e, até agora, não houve uma reação em massa nas ruas, algo que as elites peruanas não entendem — afirma Patrícia Zárate, pesquisadora do IEP, e especialista em opinião pública.

Eleição inesperada e rompimento

Castillo foi eleito, em grande medida, pelo apoio do interior pobre e vulnerável do Peru e, em contrapartida, apesar da expressiva oposição dos eleitores da capital — tradicionalmente de direita. O presidente iniciou sua carreira política no sindicato de professores e chegou ao poder de uma maneira inesperada, sem experiência política e impulsionado por um partido de esquerda, o Peru Livre, com o qual rompeu este ano. As suspeitas de corrupção, afirma o jornalista Angel Paez, à frente da equipe de reportagens especiais do jornal La República, “pesam muito no desgaste de Castillo, mas também é verdade que no Peru existe quase uma concorrência para ver quem é mais corrupto, se o governo ou o Congresso”.

— Os três principais partidos que controlam nosso Congresso estão envolvidos em denúncias de corrupção e, veja que surpresa, votam juntos na hora de frear projetos que possam prejudicá-los. Temos uma pessoa investigada por suposta lavagem de ativos como presidente da comissão de orçamento — comenta Paez.

Para o jornalista, que conhece como poucos os esquemas de corrupção que dominam a política peruana há pelo menos três décadas, “os congressistas de oposição estão esperando que algumas das seis investigações contra o presidente avancem na Justiça e sejam contundentes, para tentar novamente a destituição”.

— Eles querem que caia Castillo e não cair juntos — frisa o jornalista.

De acordo com pesquisa da Datum, o índice de desaprovação do Congresso peruano atingiu este mês 88%. Em meados do ano passado, o índice era de 44%. Já dados da Ipsos mostram que 81% dos peruamos rejeitam a atuação do Legislativo, e apenas 13% a aprovam. A mesma pesquisa indica que 61% dos entrevistados defendem a renúncia do presidente.

“Diante de cada revelação sobre indícios de corrupção, muitos acreditam, ou acreditavam, que a sociedade sairia às ruas para pedir a antecipação de eleições e, embora 42% acreditem que antecipar as eleições faria o país estar melhor, 47% acham que continuaríamos igual ou pior, especialmente os jovens — 51% deles acreditam que estaríamos igual ou pior“, aponta relatório do IEP.

Fios que não se arrebentam

Ou seja, Castillo parece estar permanentemente por um fio, mas esse fio não arrebenta, entre outros fatores porque os que poderiam precipitar a queda do presidente também são suspeitos de corrupção. E, a esta altura do campeonato, muitos peruanos já começam a suspeitar que Castillo é dos males o menor. As denúncias contra Vizcarra levantadas pelo Congresso para aprovar seu impeachment, confirma Paez, até hoje não foram judicialmente provadas.

Apoiador de Castillo montado num lápis, um dos símbolos da campanha do atual presidente, em 2021 — Foto: GIAN MASKO AFP
Apoiador de Castillo montado num lápis, um dos símbolos da campanha do atual presidente, em 2021 — Foto: GIAN MASKO AFP

A última eleição presidencial no Peru, em 2021, mostrou uma fragmentação nunca vista. Foram 18 candidatos e Castillo foi o mais votado no primeiro turno com menos de 20%. Isso explica o fato de o presidente ter assumido o poder com, de cara, 45% de rejeição.

— Castillo venceu pelo voto antifujimorista e mostrou ser um presidente incapaz, uma pessoa muito limitada intelectualmente, que não entende de política e não tem jogo de cintura. Além disso, seu governo é pouco transparente — explica Luis Benavente, diretor da Vox Populi.

Ele lembra que, além de ter se distanciado de seu próprio partido, o chefe de Estado brigou com a chamada “esquerda caviar” (no Peru, a esquerda considerada mais moderada e sofisticada), com a Igreja e o Judiciário.

— Castillo não sabe governar nem armar um governo. Temos ex-ministros e ex-funcionários foragidos pelas denúncias de corrupção. O que sustenta Castillo é que o Congresso ainda não conseguiu os 87 votos necessários para destituí-lo (de um total de 130), e não conseguiu porque os políticos negociam seus votos — assegura Benavente.

Para o analista, a única saída para Castillo seria “optar por rupturas democráticas, com apoio militar”.

— É o que alguns temem, mas não é tão simples, porque a origem de Castillo é de esquerda e isso não combina com nossos militares — conclui o diretor da Vox Populi.

Mais recente Próxima