Segredos do crime
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Segredos do crime

Histórias policiais, investigações e bastidores dos crimes

Informações da coluna

Vera Araújo

Jornalista investigativa há 30 anos e autora de "Mataram Marielle" e "O Plano Flordelis: Bíblia, Filhos e Sangue". Passou por "Jornal do Brasil" e "O Dia"

RESUMO

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GERADO EM: 09/09/2024 - 04:30

Assassinato de advogado no Rio: conexões perigosas e poder paralelo em investigação.

Advogado é assassinado no Centro do Rio e DH investiga grupo de PMs de Caxias. Audiência revela ligação do crime com jogos de apostas online. Juiz destaca gravidade da situação e suspeita de recado para concorrentes. Caso expõe conexões perigosas e presença de poder paralelo. Audiência de instrução com 23 testemunhas prevista para durar até sexta-feira.

Menos de sete meses do assassinato do advogado Rodrigo Marinho Crespo, no Centro do Rio, na calçada da sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), começa, nesta segunda-feira a audiência de instrução e julgamento do caso no 3º Tribunal do Júri da Capital. Até o momento, a polícia prendeu três acusados do homicídio, mas ainda falta chegar aos executores e mandantes. Ao puxar o fio do novelo para investigar a morte de Rodrigo, a Delegacia de Homicídios da Capital (DHC) se deparou com um grupo de extermínio formado, em sua maioria, por policiais militares do 15º BPM (Caxias).

Com as mortes ou prisões de integrantes do Escritório do Crime, formado por matadores de aluguel, uma nova organização criminosa ganhou força para atuar em seu lugar, a serviço do jogo do bicho, da máfia de cigarros e, possivelmente, de políticos. O delegado responsável pelo caso, Rômulo Assis Coelho Caldas, nomeado titular da Delegacia de Homicídios da Capital (DHC) na última sexta-feira, incluiu em seu relatório que o crime está relacionado aos jogos de apostas on-line.

"Por motivo torpe, demonstração de força e poder, haja vista que a atuação profissional da vítima, como advogado, vinha incomodando interesses escusos de organização criminosa atuante, dentre outras atividades, na exploração de jogos de apostas online... O crime foi executado para assegurar a execução e vantagem de outros crimes praticados pelos denunciados e seus asseclas, interligados a jogos de azar".

Segundo a decisão do juiz-auxiliar Cariel Bezerra Patriota, do 3º Tribunal do Júri, o caso é de "gravidade extrema, dada a execução de um advogado sem aparente ligação com atividades ilícitas".

Advogado executado no Centro do Rio foi alvo de pelo menos 18 disparos

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Diz o magistrado, num trecho de sua decisão: "É extremamente preocupante a presente investigação que revela a participação de vários policiais militares da ativa em um grupo de execução/extermínio, um verdadeiro grupo de sicários que se aproveita do poder estatal para criar um poder paralelo e ainda se infiltrar no poder estatal, indo dos mais baixos aos mais altos postos de poder. Este grupo não apenas executa pessoas, mas também obstrui investigações e destrói evidências, comprometendo também a reputação da instituição da Polícia Militar, a qual é repleta, na sua grande maioria, de bons e honestos policiais".

O crime ocorreu em 26 de fevereiro, às 17h15, na Rua Marechal Câmara, próximo às sedes da OAB, da Defensoria Pública e do Ministério Público. Rodrigo foi assassinado na calçada por um homem encapuzado, que saiu de um carro branco, em plena luz do dia. Nem as câmeras do local inibiram a ação dos criminosos. No mês seguinte, a Delegacia de Homicídios da Capital (DHC) conseguiu identificar e prender os acusados de monitorar a vítima.

A audiência será dos réus: o policial militar Leandro Machado da Silva, conhecido como Cara de Pedra; Cezar Daniel Mondêgo de Souza, o Russo; e Eduardo Sobreira de Moraes. Os dois últimos foram flagrados por imagens de câmeras, obtidas pelos investigadores, vigiando e monitorando o advogado por dias seguidos, até momentos antes do assassinato.

De acordo com as investigações, houve divergências nas versões dos acusados, mas as provas obtidas pela polícia, como imagens, depoimentos de testemunhas e perícias nos celulares dos investigados, trouxeram evidências suficientes para refutar as falsas declarações de Machado, Mondêgo e Sobreira.

Na decisão do juiz Cariel Bezerra Patriota, ficou claro que o crime foi um recado para quem tentasse entrar no ramo de jogos de apostas on-line.

"O assassinato de Rodrigo Marinho Crespo, por sua função profissional e por seu interesse de empreender na exploração legal de jogos online (como destacado pelo MPRJ e pela autoridade policial), estabelece um precedente alarmante que evidencia a infinita audácia da organização criminosa, que mescla atividades aparentemente legais com ilegais (como jogos de azar e comércio de cigarros), com a intenção de eliminar, de maneira direta ou indireta, seus concorrentes."

E prossegue:

"Esses fatos sugerem fortemente que o grupo responsável pela execução tinha a intenção de enviar uma mensagem clara, um "recado" significativo aos concorrentes, bem como de afronta ao próprio Estado Democrático de Direito. Essa forma de execução demonstra uma ausência de receio da atuação das instituições estatais responsáveis pela persecução penal ou, ainda, a demonstração de infiltração de seus agentes no próprio Estado, com a intenção de capturar a estrutura estatal", concluiu o magistrado.

A previsão é de que audiência comece nesta segunda-feira (08/09) e termine na sexta-feira (13/09). Serão ouvidas 23 testemunhas, além do interrogatório, ao final, dos três réus. Por se tratar de um caso de repercussão nacional, o magistrado pediu reforço na segurança do tribunal, ela suspeita de os réus terem vínculos com o crime organizado.

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