True Crime
PUBLICIDADE
True Crime

Histórias, detalhes e personagens de crimes reais que mais parecem ficção

Informações da coluna

Ullisses Campbell

Com 25 anos de carreira, sempre atuou como repórter. Passou pelas redações de O Liberal, Correio Braziliense e Veja. É autor da coleção “Mulheres Assassinas”

Por — São Paulo

A dona de casa Fabiane Renata Vieira Abe, de 37 anos, é acusada de dar vários golpes no comércio de Itapetininga, uma pacata cidade do interior de São Paulo. Segundo relatado em uma dezena de ações judiciais, o modus operandi de Fabiana é simples. Ela entra nas lojas, escolhe diversos tipos de roupas para homem, mulher e criança e pede para a vendedora anotar no caderninho sob a promessa de voltar no fim do mês para quitar o débito. O mês virava e nada.

A prática de vender fiado é comum em Itapetininga. Muitos comércios pequenos mantêm o tradicional caderno de anotações no caixa com as dívidas dos clientes, que geralmente frequentam o estabelecimento há muitos anos. As lojas mais estruturadas emitem um carnê de pagamento simples com código de barras. Ainda assim, em todas os estabelecimentos, o cliente só sai com as compras se assinar uma nota promissória reconhecendo oficialmente a dívida.

No dia 7 de novembro de 2015, Fabiane entrou na loja Spacio Frida Vestuário e comprou um blazer azul turquesa, dois shorts suede western, um macacão vexty e dois vestidos viscoses, além de outras peças, somando um total de R$ 719,30 reais. No fio do bigode, ela dividiu a compra em cinco parcelas de R$ 143, 86. No ato da compra, ela pagou a primeira prestação. As demais ficaram anotadas no caderninho.

De lá, Fabiana foi a outra e mais outra loja fazer uma série de compras de roupas para toda a família. Numa delas adquiriu sapatos, camisas masculinas para seu marido e mais algumas peças para seu filho, totalizando R$ 935,43. A conta foi dividida em cinco prestações. No ato da compra, ela também pagou somente a primeira parcela.

O golpe de Fabiane se materializava a partir da segunda prestação, que simplesmente não era paga. Nas primeiras ligações de cobrança, ela falava em dificuldade financeira. No segundo contato, prometia pagar no mês seguinte. No terceiro telefonema da loja, irritada, Fabiane falava que não iria pagar, que ter dívida não era crime e ainda sugeria que o débito fosse ajuizado.

“Ela debochava, dizendo que os valores devidos eram tão baixos que não valeria a pena entrar na Justiça, pois se gastaria muito mais com advogados”, disse a vendedora Ana Carolina Macedo, responsável por uma das vendas.

O que mais irritou os comerciantes de Itapetininga é que Fabiane continuava fazendo novas compras fiado em outros estabelecimentos, mesmo com o nome sujo na praça, e dando novos calotes. Foi assim por quase uma década. E em um ponto ela tinha razão: os proprietários não acionavam a Justiça por achar os valores irrisórios para uma ação de cobrança.

A estratégia começou a desandar quando ela bateu na porta da loja de roupas infantis Cara Melada. Nessa loja, Fabiane contraiu no dia 11 de agosto de 2022 uma dívida de R$ 5.556,90. Ela comprou moletons, jaquetas jeans, tênis, casacos e diversos outros itens. Como sempre, ela parcelou, pagou a primeira prestação e sumiu, dando as desculpas de outrora.

Por meio de advogados, a loja primeiro tentou um acordo, o que foi recusado pela devedora. Em seguida, os defensores do comércio tentaram bloquear as contas bancárias de Fabiane, mas ela tinha poucos reais como saldo. O próximo passo foi encontrar outros bens da mulher, mas ela só possuía um Ford Escort velho, da década de 1980. A cada tentativa frustrada da comerciante, Fabiane debochava e continuava a fazer novas compras em lojas cujos proprietários desconheciam a sua fama.

Fabiane é casada com Luiz Henrique Abe de Oliveira, de 38 anos. Por meio dos seus defensores, os donos da Cara Melada procuraram pelo cônjuge da sua cliente, mas ele foi taxativo: a dívida era da sua esposa e não dele. Luiz Henrique já havia sido procurado por outra comerciante de Itapetininga que tentava recuperar prejuízos causados por Fabiane. “Eu e minha mulher temos CPFs diferentes. Eu não fiz compra alguma, então não me perturbe mais”, pediu o marido, irritado.

A lojista ficou indignada porque o esposo de Fabiane vestia na ocasião da cobrança uma camiseta polo comprada em sua loja e nunca paga. “Parecia que nada faria essa mulher parar de aplicar golpes”, comentou o advogado Daniel Magaldi, defensor de uma das lojistas lesadas por Fabiane. O advogado faz sucesso nas redes sociais contando os casos inusitados que defende e tirando dúvidas dos seus 84 mil seguidores.

Foi graças a Magaldi que a trajetória de Fabiane foi interrompida no fim do ano passado, quando veio à tona a sua certidão de casamento com Luiz Henrique. O advogado conseguiu o documento no 2º Cartório Cível de Itapetininga por se tratar de um documento público.

Os dois oficializaram a união em 6 de setembro de 2003 em regime de comunhão parcial de bens. Ou seja, os bens adquiridos por Luiz Henrique e Fabiane após o enlace são considerados comuns ao casal, independentemente de quem contribuiu para a aquisição.

Só que a regra também vale para os boletos atrasados. Isto é, as dívidas de Fabiane também são do marido. Foi com esse argumento jurídico que Luiz Henrique teve uma conta bancária bloqueada e dela sacada o valor exato para pagar o débito da esposa na loja Cara Melada, já aquela altura em quase R$ 7 mil reais. O marido, como era de esperar, ficou irritadíssimo.

“Eu não tenho nada a ver com isso. Eu não vou pagar. Não assinei nada. O senhor jamais vai conseguir receber um centavo de mim”, esbravejou Luiz Henrique para o advogado. Em vão. “A conta dele foi bloqueada pela Justiça e a dívida quitada”, descreveu Magaldi no seu Instagram.

Procurado pelo blog, o casal voltou desdenhar da dívida paga por meio de ações judiciais. “São dívidas muito baixas. Nunca imaginei que isso pudesse ser matéria de jornal. Não tem nada mais interessante para denunciar?”, perguntou Luiz Henrique. Em seguida, ele frisou que sua família está com o nome limpo na praça.

Mais recente Próxima Mulher que agrediu casal gay em padaria é acusada de extorsão, ameaça e golpe de R$ 200 mil em SC