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Por Thomas Rogers, The New York Times — Oslo

Durante décadas, Oslo viveu à sombra das outras duas capitais escandinavas: Estocolmo, na Suécia, e Copenhague, na Dinamarca. A cidade norueguesa, situada às margens de um fiorde pitoresco pontilhado de ilhotas rochosas, geralmente era tida como monótona e excessivamente cara, muitas vezes servindo apenas de conexão para os turistas rumo às montanhas ou prestes a embarcar em um dos navios que contornam a costa.

De uns anos para cá, porém, os governos federal e municipal vêm investindo pesado para tentar mudar essa imagem. Como parte do projeto conhecido como Cidade do Fiorde, as autoridades transformaram a orla em uma região badalada de arranha-céus, praças pontilhadas de chafarizes e amenidades culturais, incluindo a ópera e a sede nova e imponente do Museu Munch, dedicado ao pintor Edvard Munch.

Visitantes em fila para entrar no Museu Nacional, novo complexo na capital norueguesa — Foto: David B. Torch/The New York Times
Visitantes em fila para entrar no Museu Nacional, novo complexo na capital norueguesa — Foto: David B. Torch/The New York Times

Em 11 de junho, depois de anos de atrasos e brigas, a atração mais ambiciosa dessa iniciativa finalmente abriu as portas: o Museu Nacional, construção gigantesca, coberta por ardósia cinza, abrigando as coleções de quatro instituições que, juntas, registram o patrimônio artístico nacional. É também o maior da região nórdica.

Espera-se que ele seja o precursor da transformação de Oslo em uma capital cultural mundial.

— A Noruega é muito mais do que apenas fiordes e montanhas; acho que as pessoas ficam surpresas quando vêm pela primeira vez. Estou me gabando, claro, mas é verdade — garante a diretora do museu, Karin Hindsbo.

Há motivos históricos para que a Noruega, país de cinco milhões de habitantes, tenha sido ofuscada culturalmente pelos vizinhos. Um deles é o fato de ter sido governada pela Dinamarca durante a União Dano-Norueguesa, entre o século XVI e o XIX. Tornou-se nação independente em 1814, com direito a Constituição própria, mas permaneceu unida à Suécia, sob o rei daquele país, até 1905.

Com a riqueza gerada pelo petróleo, porém, tornou-se uma força econômica há algumas décadas, com produções culturais que chamam cada vez mais a atenção internacional. Graças a programas generosos de apoio, a contribuição dos artistas noruegueses enriquece o cinema (incluindo "A pior pessoa do mundo", indicado ao Oscar em 2021), a música (como Sigrid e Girl in Red) e a literatura (Karl Ove Knausgaard, Vigdis Hjorth).

Obras no interior do Museu Nacional, em Oslo — Foto: David B. Torch/The New York Times
Obras no interior do Museu Nacional, em Oslo — Foto: David B. Torch/The New York Times

Entre os 6.500 itens em exibição no Museu Nacional está aquela que talvez seja a obra de arte local mais conhecida: "O Grito", de Munch, bem como as mostras estilosas dos chifres que os vikings usavam para beber, tapeçarias medievais e móveis modernos. Também inclui o que Ingvild Krogvig, curadora especializada em arte contemporânea, descreveu como "a primeira exposição ampla e permanente da arte norueguesa pós-guerra em um museu de Oslo".

— A instituição organizou a coleção de forma a gerar uma discussão sobre o cânone artístico do país. Talvez haja uma confiança maior hoje, já que fazemos parte do discurso internacional — afirma ela.

Em certas ocasiões, o projeto chegou a ser ofuscado por disputas públicas. A inauguração, que deveria ter sido em 2020, foi adiada por problemas com as empresas terceirizadas, revoltando muitos moradores já privados havia anos do acesso às coleções. Klaus Schuwerk, arquiteto que projetou a sede, criticou publicamente a decoração e a escolha da sinalização interna. Em entrevista à NRK, emissora estatal, comparou desdenhosamente o local da exposição de arte contemporânea a um "mercado de pulgas".

Outra questão envolveu Hindsbo, a diretora, criticada na imprensa pelo estilo corporativo e pelos critérios de compra para a coleção. Além disso, foi acusada de conseguir o cargo graças às conexões do marido, ex-integrante do Partido Conservador:

— Acho esses comentários um tanto misóginos. Tenho certeza de que fui indicada por méritos próprios. Além do mais, eu mal tinha conhecido meu marido na época.

Ela prossegue:

— Eu já estava preparada para as críticas em relação à minha origem dinamarquesa, dada a importância do projeto para a identidade norueguesa e dado o status histórico da Dinamarca como poder dominante sobre a Noruega. Uma vez um conhecido chegou a cuspir em mim por causa de um desentendimento relacionado à iniciativa, mas prefiro não falar sobre isso. Só digo que poderia ter sido muito pior. Além do mais, hoje tenho cidadania norueguesa.

Karin Hindsbo, diretora do Museu Nacional, em Oslo: alvo de críticas — Foto: David B. Torch/The New York Times
Karin Hindsbo, diretora do Museu Nacional, em Oslo: alvo de críticas — Foto: David B. Torch/The New York Times

Apesar da comoção, as primeiras resenhas do projeto na imprensa nacional foram positivas. Um jornalista do "Aftenposten", jornal impresso de maior circulação no país, descreveu-o como "um museu consciente de sua responsabilidade e sua tradição". O crítico do "Dagsavisen", diário de viés esquerdista, prevê que o museu "se tornará um atrativo para o público internacional", acrescentando que a arte norueguesa "finalmente ganhou uma casa".

As autoridades esperam que essa abordagem assertiva de divulgação da cultura nacional se traduza no crescimento do turismo internacional. Além do Museu Nacional e da ópera, a orla da capital ainda ganhou uma biblioteca nova e espetacular, o Museu Astrup Fearnley de arte contemporânea e a nova sede do Museu Munch. Ainda em junho, também foi inaugurada em um dos píeres do fiorde uma escultura em bronze monumental retratando uma mulher ajoelhada, da artista britânica Tracey Emin.

Mas o projeto também foi marcado por algumas polêmicas — como a decisão de tirar o Museu Munch do bairro de Toyen, mais residencial e menos acessível, criticada por sacrificar as necessidades dos moradores em favor das dos visitantes. Sem contar que o novo prédio, construção imensa com fachada cinzenta e irregular criada pela firma de arquitetura espanhola Estudio Herreros, também não caiu bem entre a população local. Embora a nova sede permita a organização de mostras mais ambiciosas, um crítico da NRK o descreveu como "uma cicatriz na face de Oslo".

Para Gaute Brochmann, editor-chefe da "Arkitektur N", revista arquitetônica norueguesa, o museu "não tem nada de inspirador", além de ter feito "péssimo uso dos materiais" e "lembrar muito um aeroporto por dentro".

Apesar de tudo isso, Stein Kolsto, planejador urbano responsável pelo projeto, destaca que a mudança do museu já conquistou um de seus principais objetivos: fazer crescer o número de visitantes. Nos primeiros três meses seguintes à inauguração, recebeu mais gente do que a sede conseguiu em vários anos:

— Reunir todas essas instituições culturais públicas em um único local vai atrair muito mais gente.

Raymond Johansen, prefeito de Oslo, mostra-se otimista, apostando que com o tempo as críticas vão diminuir:

— O Museu Munch vai se tornar um marco, mas isso vai levar tempo, como deve ser. A inauguração do Museu Nacional e a implantação das outras iniciativas culturais do projeto valorizaram a cidade, pois é importante ser uma capital cultural com visibilidade. Estamos fazendo de tudo para colocar Oslo no mapa internacional.

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