Boa Viagem
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Por Maria Cramer, The New York Times

Fazia apenas um dia que o Carnival Valor estava no mar quando dos alto-falantes veio o pedido de que determinado passageiro se apresentasse ao setor de atendimento ao público. A família do homem em questão, um norte-americano de 28 anos, tinha dado por sua falta naquela manhã. Era Dia de Ação de Graças, e o navio de cruzeiro, com capacidade para 3.756 pessoas, que saíra de Nova Orleans na véspera, seguia rumo a Cozumel, no México.

Em seguida, os tripulantes começaram a dar busca nas cabines, como contou Shant'a Miller White, de 48 anos, que viajava com a família:

— Um funcionário entrou na da minha prima dizendo que tinha de conferir para saber se estava tudo bem. Àquela altura, ninguém sabia o que estava acontecendo; foi só na hora do jantar que anunciaram que haveria uma mudança na rota para a execução de uma operação de busca e resgate. Comecei a pensar no pobre sozinho na água e senti um aperto no peito. Será que tinha ido para o fundo? Será que tinha sido pego pelos tubarões? Comecei a rezar.

Segundo a Guarda Costeira, o passageiro era James Grimes, de 28 anos, que estava no cruzeiro de cinco dias com os pais e os irmãos.

— Os familiares o tinham visto por volta das 23h da noite anterior, mas às 10h45m de Ação de Graças, como não tinham tido sinal dele ainda, resolveram avisar a tripulação — explicou um porta-voz.

Às 20h10m, mais de nove horas depois do alerta, um navio-tanque viu Grimes perto da foz do Rio Mississippi e alertou as autoridades. Os resgatistas o encontraram boiando com dificuldade, acenando freneticamente e tentando manter a cabeça acima da superfície da água.

— Quando o pessoal do MH-60 Jayhawk o resgatou, percebeu que ele estava em choque, com hipotermia leve, mas extremamente desidratado; entretanto, estava vivo e em condições estáveis — informou o tenente Seth Gross, responsável pela operação.

Grimes, descrito pela família como "nadador excepcional", resistiu a horas na água com temperaturas entre 18°C e 21°C, debaixo de chuva, com ventos de quase 40 quilômetros por hora e ondas entre um metro e meio e dois metros e meio, onde a presença de tubarões cabeça chata e galha preta é comum.

— Sem dúvida, é um caso extraordinário. O instinto de sobrevivência e a vontade de viver são insanos — comentou Gross.

Com que frequência isso acontece?

O Carnival Valor, navio de cruzeiro para 3.756 pessoas, do qual o passageiro James Grimes caiu no último Dia de Ação de Graças. Ele foi resgatado com vida — Foto: Reprodução / Wikimedia Commons
O Carnival Valor, navio de cruzeiro para 3.756 pessoas, do qual o passageiro James Grimes caiu no último Dia de Ação de Graças. Ele foi resgatado com vida — Foto: Reprodução / Wikimedia Commons

Cair de um navio em pleno alto-mar pode ser o pior pesadelo em um navio de passageiros. Embora as chances sejam remotíssimas, segundo a Associação Internacional de Empresas de Cruzeiros (Clia, na sigla em inglês), o resultado normalmente é trágico. Em 2019, 25 pessoas caíram, mas apenas nove foram resgatadas.

Em fevereiro, uma passageira do mesmo Carnival Valor pulou do décimo deque para fugir dos seguranças que tentaram detê-la depois de um bate-boca; seu corpo nunca foi encontrado. Em dezembro de 2016, um homem de 22 anos caiu do 12º deque de uma embarcação da Royal Caribbean depois de passar a noite bebendo. Seus pais entraram na justiça, mas a decisão do júri foi a favor da companhia.

Segundo Ross Klein, professor de assistência social da Universidade Memorial da Terra Nova e Labrador, no Canadá, que estuda a questão da segurança a bordo, o consumo de bebidas alcoólicas é responsável por pelo menos 11% das quedas nos cruzeiros, que normalmente oferecem pacotes all-inclusive, encorajando os excessos.

— Esse tipo de viagem é considerado idílico e seguro, e essa ideia é reforçada pela propaganda e pelas declarações na imprensa, mas o público precisa ter consciência dos riscos, inclusive de ser empurrado, cair ou ficar tentado a pular — diz.

Como as embarcações podem prevenir esses acidentes?

Ainda de acordo com Klein, obrigatoriamente o parapeito tem de ter, no mínimo, um metro de altura:

— Quando o Congresso começou a pensar em elaborar uma lei que reforçasse a segurança a bordo, em 2005, a sugestão foi de que a proteção tivesse pelo menos meio metro a mais, mas em 2010 acabou aprovando o Cruise Vessel Security & Safety Act com o requisito de altura no padrão atual, que foi mantido.

— O objetivo de uma proteção com essa altura é manter o passageiro no passadiço. A grande maioria dos acidentes é resultado de comportamento inconsequente ou ato intencional. Não dá para cair de um cruzeiro sem querer — garantiu Brian Salerno, vice-presidente de políticas marítimas da Clia.

Klein sugeriu:

— Os navios poderiam perfeitamente reduzir os riscos se limitassem o consumo etílico, aumentassem a altura das grades e instalassem equipamentos com tecnologia para detectar a queda de objetos pesados.

Segundo Salerno, a lei de 2010 estimulou as empresas a desenvolver e instalar esse tipo de tecnologia:

— Foram anos para criar um sistema que fosse sensível a ponto de detectar a queda de uma pessoa e fazer soar o alarme, mas que não fosse estimulado por outros objetos, como uma gaivota voando nas proximidades, por exemplo. Algumas embarcações já contam com o equipamento.

Robert Kritzman, um dos sócios da Clyde & Co., firma de advocacia de Miami que presta serviço para as empresas de cruzeiros, explicou que os bartenders são treinados para detectar o consumo excessivo:

— A política geral é a mesma de outros estabelecimentos: quando a pessoa começa a ficar muito bêbada, é parar de servir.

De acordo com a Carnival Corp., a única forma de cair do navio é escalando a barreira de proteção intencionalmente. "Os cruzeiros têm barras de segurança que seguem os padrões da Guarda Costeira e impedem qualquer tipo de queda. O passageiro jamais deve escalar as grades", declarou a companhia na nota de agradecimento ao órgão e aos mergulhadores que localizaram e resgataram Grimes. O porta-voz da Carnival não respondeu às nossas perguntas posteriores sobre o incidente e seus protocolos de segurança.

O que acontece quando a tripulação fica sabendo que alguém caiu?

— Os protocolos são bem claros sobre como agir em caso de queda; assim que a tripulação fica sabendo ou percebe que alguém caiu, imediatamente informa a Guarda Costeira, para a embarcação e volta para ajudar a encontrar o passageiro. Além disso, é comum usar barcos menores e mais velozes nas buscas — informou Kritzman.

Ainda não se sabe as circunstâncias do incidente recente do Carnival Valor, incluindo a hora exata em que Grimes caiu, e a Guarda Costeira diz que continua a investigação.

— Depois que foram informadas do incidente, as autoridades enviaram um barco-patrulha de 13 metros, um helicóptero e um avião rastreador para a busca, definida em uma área de 24 mil km², o que equivale aproximadamente à área do estado de Massachusetts, além de alertar os mergulhadores no Golfo do México da presença de um homem — explicou Gross.

O graneleiro Crinis foi quem viu Grimes cerca de 32 quilômetros ao sul do Southwest Pass, canal na foz do Rio Mississippi.

— Eu mesmo liguei para a mãe e o padrasto para informar que o rapaz estava bem; quando contei que tinha sido levado para o hospital e sua condição era estável, só ouvi os gritos e a choradeira — acrescentou Gross.

A passageira Shant'a Miller White, que mora em Hampton, na Virgínia, e dirige uma ONG antibullying, disse que ficou muito aliviada quando o navio anunciou que Grimes fora encontrado com vida:

— Foi graças a Deus que ele sobreviveu.

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