Em geral, é o barulho dos viajantes que incomoda os moradores de cidades turísticas mundo afora. Mas em Pienza, na região da Toscana, Itália, aconteceu o contrário. As autoridades locais decidiram interromper a tradição de badaladas noturnas de uma torre centenária depois de viajantes estrangeiros reclamarem do barulho na hora de dormir. Uma medida que desagradou parte dos habitantes.
Antes mesmo de Pienza se tornar um popular destino turístico - graças ao filme "Romeu e Julieta" de Franco Zeffirelli, de 1968, em parte rodado na cidade - os moradores já estavam habituados às badaladas da torre do relógio do Palazzo Comunale, um dos principais edifícios da Praça Pio II, a principal da cidade. O sino da construção, considerada uma joia da arquitetura renascentista, tocava a cada meia hora, inclusive durante a madrugada, preenchendo o silêncio das estreitas ruas de pedra.
A trilha sonora, no entanto, vinha causando uma série de reclamações por parte de hóspedes de hotéis e pousadas da região mais central da cidade. De acordo com o prefeito de Pienza, Manolo Garosi, a maioria das queixas partiam de visitantes da América do Norte, e se eram mais frequentes nos meses de verão, quando boa parte deles deixava as janelas abertas durante a noite.
Para agradar aos visitantes, e também ao setor hoteleiro local, que lida diretamente com a insatisfação dos hóspedes, Garosi determinou que, a partir desta temporada de verão (no Hemisfério Norte), os sinos da torre não devem mais tocar no período das 22h às 7h. Uma medida que parece razoável, mas desagradou parte dos pouco mais de dois mil cidadãos de Pienza.
À agência de notícias italiana ANSA, um morador, sem se identificar, protestou pelo fato de a prefeitura não ter consultado a população antes de silenciar o tradicional sino. "Nascemos aqui e sempre ouvimos as badaladas no meio da noite. No silêncio absoluto dá sinal de vitalidade, por que desligar o relógio?", questionou.
Entre as reclamações dos eleitores e a dos visitantes, o prefeito Garosi preferiu ouvir estas. Ao jornal britânico "Telegraph", ele disse: "Não somos os únicos a fazer isso. Outras cidades que têm campanários fizeram exatamente a mesma coisa".
Como é Pienza
A torre, assim como todo o complexo de edifícios, igrejas e palácios do centro histórico, foi construída em meados do Século XV, num projeto comandado pelo arquiteto italiano Bernardo Rosselino. Ele havia sido contratado pelo papa Pio II, o filho mais ilustre de Pienza, para transformá-la numa "cidade ideal", dentro dos padrões da época. Até o nome atual da cidade (antes conhecida como Corsignano) vem do papa.
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Da prancheta de Rosselino saiu o desenho do centro da cidade, a partir da Piazza Pio II. Nesta praça estão alguns dos principais edifícios, como o Palazzo Comunale (o da torre silenciada), o Palazzo Piccolomini (inspirada no Palazzo Rucellai de Florença), o Palazzo Borgia, o Palazzo Ammannati, o Palazzo Gonzaga e o Palazzo del Cardinale Atrebatense, além, claro, da catedral da cidade, marcada com o emblema de Pio II.
O conjunto arquitetônico de Pienza, bastante preservado ao longo dos séculos, teve sua importância histórica reconhecida em 1996, quando entrou para a lista de patrimônios da humanidade da Unesco. Mas vale se afastar da praça central e caminhar pela cidade, sem rumo, por ruas estreitas onde casas de pedra ainda resistem, mais de 500 anos depois. Em diversos pontos há mirantes que permitem apreciar a região do Val d’Orcia, no sul da Toscana. E não deixe de provar, nas lojas ou restaurantes, um dos tesouros da cidade, seu queijo Pecorino, bastante reconhecido a nível nacional.
Ter servido de cenário para o filme de Zeffirelli, baseado numa das obras mais conhecidas de William Shakespeare, ajudou a tornar Pienza uma das cidades preferidas pelos viajantes na Toscana. O romantismo de Romeu e Julieta está presente no visual das ruazinhas estreitas, cheias de flores - muitas delas, aliás, com nomes como Via dell'Amore (“Rua do Amor”), Via del Bacio ("Rua do Beijo"), Via della Rosa ("Rua da Rosa") e Via della Fortuna ("Rua da Sorte").