Diretor-geral da OMS rebate Bolsonaro e reafirma política de isolamento
Tedros Adhanom Ghebreyesus afirmou que defendeu que os que ficaram em casa sem renda devem ser beneficiados por políticas sociais dos governos de proteção econômica, para que possam permanecer no isolamento
Alice Cravo
31/03/2020 - 16:38
/ Atualizado em 31/03/2020 - 22:10
O diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, durante entrevista coletiva sobre o novo coronavírus Foto: FABRICE COFFRINI / AFP
RIO — Após o presidente
Jair Bolsonaro
omitir e distorcer um trecho do pronunciamento do diretor-geral
da Organização Mundial de Saúde (
OMS
), Tedros Adhanom Ghebreyesus, para alegar que, agora, até a entidade internacional estaria defendendo o retorno ao trabalho, a OMS e o próprio diretor-geral vieram à público para reafirmarem a importância do isolamento social de quem pode ficar em casa e cobrar políticas sociais de proteção econômica aos que não podem trabalhar neste período.
Após a repercussão da fala de Bolsonaro, Tedros defendeu no Twitter que os que ficaram em casa sem renda devem ser beneficiados por políticas sociais dos governos de proteção econômica, para que possam permanecer no isolamento social e impedir o avanço do novo coronavírus. Essa informação, que constava no discurso repercutido por Bolsonaro, foi omitido nas declarações do presidente da República.
"Pessoas sem fonte de renda regular ou sem qualquer reserva financeira merecem políticas sociais que garantam a dignidade e permitam que elas cumpram as medidas de saúde pública para a Covid-19 recomendadas pelas autoridades nacionais de saúde e pela OMS. Eu cresci pobre e entendo essa realidade. Convoco os países a desenvolverem políticas que forneçam proteção econômica às pessoas que não possam receber ou trabalhar devido à pandemia da covid-19. Solidariedade”
A OMS foi questionada pela TV Globo se as palavras do diretor-geral podem justificar a afirmação do presidente Jair Bolsonaro de que, para o diretor da OMS, "os informais têm que trabalhar".
Em sua resposta, a Organização afirmou que o diretor-geral não disse ser contra as medidas de isolamento e que reafirmou a importância do apoio do governo àqueles que perderam renda por causa da Covid-19. A OMS continua a reforçar que a política de isolamento é a mais eficaz contra o avanço do novo coronavírus.
A entrevista
A fala de Tedros Adhanon mencionada por Bolsonaro foi uma resposta a uma pergunta sobre os impactos das medidas impostas pelo governo da Índia, que impôs restrições de movimentação e fechamento de comércio no país.
— Sou da África e sei que muita gente precisa trabalhar cada dia para ganhar o seu pão. E governos devem levar essa população em conta. Se estamos limitando os movimentos, o que vai acontecer com essas pessoas que precisam trabalhar diariamente? Cada país deve responder a essa questão — disse Tedros, acrescentando:
— Precisamos também ver o que isso significa para o indivíduo na rua. Venho de uma família pobre e sei o que significa sempre preocupar-se com o pão de cada dia. E isso precisa ser levado em conta. Porque cada indivíduo importa. E temos que levar em conta como cada indivíduo é afetado por nossas ações. É isso que estamos dizendo.
Em outro trecho da entrevista, omitido por Bolsonaro, o diretor-geral deixa claro que quem deve assistir às populações mais carentes, em caso de isolamento e quarentena, são os governos.
Rua vazia em Wuhan, na província central de Hubei, na China, primeiro epicentro do novo surto de coronavírus Foto: STR / AFP
A Praça Sergels, em Estocolmo, na Suécia Foto: JONATHAN NACKSTRAND / AFP
Ônibus públicos estacionados em uma estação, em Bogotá, na Colômbia Foto: RAUL ARBOLEDA / AFP
O vazio Kungstradgarden, em Estocolmo, Suécia Foto: JONATHAN NACKSTRAND / AFP
Barqueiros à espera de passageiros, atracados na margem de um rio durante confinamento imposto pelo governo em Daca, Bangladesh Foto: MUNIR UZ ZAMAN / AFP
Praça Plaza Grande vazia, com o palácio presidencial de Carondelet, em Quito, no Equador Foto: RODRIGO BUENDIA / AFP
Ponte do rio Wuhan Yangtze vista à noite, em Wuhan na China Foto: STR / AFP
Praia de Miami Beach, Flórida, deserta em 20 de março Foto: CHANDAN KHANNA / AFP
Pessoas que ainda desfrutam da Praia do Diablo, no Rio de Janeiro, Brasil Foto: MAURO PIMENTEL / AFP
Motoristas atravessam o México dos Estados Unidos através do ponto de entrada El Chaparral, durante a pandemia de coronavírus, em San Diego, Califórnia Foto: Sean M. Haffey / AFP
Mesquita Omar Ali Saifuddien, em Bandar Seri Begawan Foto: DEAN KASSIM / AFP
Estradas desertas durante um bloqueio nacional imposto pelo governo como medida preventiva contra a COVID-19, em Nova Délhi Foto: PRAKASH SINGH / AFP
Praça de touros de Santamaría, em Bogotá Foto: RAUL ARBOLEDA / AFP
A Plaza de Armas, em Santiago, Chile Foto: MARTIN BERNETTI / AFP
Ponte das Sete Milhas, em Key West, Flórida. Maioria dos turistas deixou a cidade , que fechou fechou hotéis ou aluguéis de férias de curto prazo e pediu que os restaurantes apenas servissem comida para viagem. Praias e parques também foram fechados Foto: JOE RAEDLE / AFP
Vista aérea mostra área vazia de azulejos brancos ao redor da Kaaba na Grande Mesquita de Meca Foto: BANDAR ALDANDANI / AFP
O Kungstradgarden, em Estocolmo Foto: JONATHAN NACKSTRAND / AFP
Monumento da Revolução, na Cidade do México Foto: ALFREDO ESTRELLA / AFP
A Corniche Beirute, vazia durante toque de recolher, no Líbano Foto: - / AFP
Uma Grand Avenue quase deserta no centro de Los Angeles, Califórnia, olhando para o sul a partir do Walt Disney Concert Hall Foto: ROBYN BECK / AFP
Parque de diversões Six Flags, fechado após a decisão do governo de suspender todas as atividades não essenciais para ajudar a conter a propagação da Covid-19, na Cidade do México Foto: CLAUDIO CRUZ / AFP
Poucos carros passam pela 280 interestadual, levando a São Francisco, Califórnia Foto: JUSTIN SULLIVAN / AFP
Espalande dos Ministérios, em Brasília Foto: SERGIO LIMA / AFP
Avenida 9 de Julio vazia, em Buenos Aires Foto: RONALDO SCHEMIDT / AFP
Assentamento informal de Brazzaville, perto de Atteridgeville, em Pretória, na África do Sul Foto: PHILL MAGAKOE / AFP
Instalações esportivas e o pátio da escola primária de Jätkäsaari, Finlândia Foto: ANTTI AIMO-KOIVISTO / AFP
A rodovia A1 quase vazia perto de Muiden. A União Européia fechou suas fronteiras na quarta-feira para tentar travar a propagação feroz da pandemia de coronavírus Foto: ROBIN VAN LONKHUIJSEN / AFP
Estacionamento vazio de um shopping center em Santiago, no Chile Foto: MARTIN BERNETTI / AFP
Restaurantes fechados no centro de Tbilisi, na Geórgia Foto: VANO SHLAMOV / AFP
Praça vazia do centro da cidade de Rennes, na França Foto: DAMIEN MEYER / AFP
O Canal d'Ile-de France, no centro da cidade de Rennes Foto: DAMIEN MEYER / AFP
Praia deserta em Miami Beach, Flórida. As autoridades da cidade de Miami Beach fecharam a área da praia que é popular entre os estudantes de faculdade e pediram que se abstivessem de grandes reuniões Foto: JOE RAEDLE / AFP
A grande mesquita vazia de Baiturrahman, em meio a preocupações com o novo coronavírus, em Banda Aceh, na Indonésia Foto: CHAIDEER MAHYUDDIN / AFP
Carros estacionados no Centro de Aluguel de Carros no Aeroporto Internacional de San Diego, Califórnia. O turismo em San Diego diminuiu drasticamente devido à ameaça contínua do surto de coronavírus Foto: Sean M. Haffey / AFP
Estradas quase vazias em Wuhan, na China Foto: STR / AFP
A ponte Gálata, no centro de Istambul, deserta devido ao novo surto de Covid-19 Foto: BULENT KILIC / AFP
Rodovia vazia Buenos Aires, La Plata, na Argentina Foto: RONALDO SCHEMIDT / AFP
Praça Mauá vazia, na Zona Portuária do Rio de Janeiro Foto: MAURO PIMENTEL / AFP
Praça Sergels, em Estocolmo, Suécia Foto: JONATHAN NACKSTRAND / AFP
Visão noturna em Wuhan, na província central de Hubei, na China Foto: STR / AFP
Avenida Kennedy vazia, em Santiago, Chile Foto: MARTIN BERNETTI / AFP
Estradas vazias em Medellín, Colômbia Foto: JOAQUIN SARMIENTO / AFP
A ponte Incienso, na cidade da Guatemala Foto: CARLOS ALONZO / AFP
Torre del Reformador, na Guatemala Foto: CARLOS ALONZO / AFP
Vista deserta da via expressa Rajnagar, na Índia Foto: PRAKASH SINGH / AFP
Ruas quase vazias em Bogotá Foto: RAUL ARBOLEDA / AFP
Um estrada vazia na Cidade do Panamá Foto: LUIS ACOSTA / AFP
Interseção de Hollywood e Vine, pouco antes do pôr do sol, com tráfego mais leve que o normal, em Los Angeles, Califórnia Foto: MARIO TAMA / AFP
— Nós entendemos que muitos países estão implementando medidas que restringem a movimentação das pessoas. Ao implementar essas medidas, é vital respeitar a dignidade e o bem estar de todos. É também importante que os governos mantenham a população informada sobre a duração prevista dessas medidas, e que dê suporte aos mais velhos, aos refugiados, e a outros grupos vulneráveis. Os governos precisam garantir o bem estar das pessoas que perderam a fonte de renda e que estão necessitando desesperadamente de alimentos, saneamento, e outros serviços essenciais. Os países devem trabalhar de mãos dadas com as comunidades para construir confiança e apoiar a resistência e a saúde mental — disse Tedros.
Nesta manhã, Bolsonaro perguntou se os jornalistas viram o que o diretor da OMS falou em coletiva:
— Vocês viram o que o diretor-presidente da OMS falou, não? Alguém viu aí? Que tal eu ocupar rede nacional de rádio e TV hoje à noite para falar sobre isso? O que ele disse praticamente, em especial, tem que trabalhar — disse o presidente, completando:
— Quando eu comecei a falar isso, entraram até com processo no Tribunal Penal Internacional contra mim, me chamando de genocida. Eu sou um genocida por defender o direito de você levar um prato de comida para tua casa — comentou, apesar de não haver um processo formalizado até o momento.
Segundo Bolsonaro, Tedros estava aparentemente "um pouco constrangido, mas falou a verdade".
— Eu achei excepcional a palavra dele, e meus parabéns: OMS se associa a Jair Bolsonaro — declarou, arrancando aplausos de apoiadores que estavam em frente ao Palácio