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Política João Doria

Doria tenta reverter efeitos do excesso de exposição na pandemia

Após quase 200 entrevistas coletivas, governador deve aparecer menos, focar em anúncios positivos e mudar visual
Postura. Sem paletó, Doria participa de entrevista coletiva: governador vem tentando dar mais leveza à imagem Foto: Zimel / Agência O Globo
Postura. Sem paletó, Doria participa de entrevista coletiva: governador vem tentando dar mais leveza à imagem Foto: Zimel / Agência O Globo

SÃO PAULO - Após 198 coletivas de imprensa em que apresenta dados da pandemia do coronavírus em São Paulo e medidas para tentar mitigar seus efeitos, o governador João Doria (PSDB) está tentando mudar sua comunicação. A equipe do tucano, que planeja concorrer à Presidência da República, identificou que a exposição em excesso pode fazer mal à sua imagem e atrapalhar, inclusive, os ganhos políticos da CoronaVac, vacina produzida pelo Instituto Butantan, de São Paulo, e responsável por 90% da imunização de todo o país até agora.

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Assessores próximos identificaram que as entrevistas coletivas frequentes, com críticas ao presidente Jair Bolsonaro, ajudaram Doria a se tornar mais conhecido fora de São Paulo. Ao mesmo tempo, porém, esses eventos lhe trouxeram desgaste, já que ele costuma ser portador de más notícias, como número de mortos e adoção de medidas mais rígidas de distanciamento.

A avaliação de seu grupo é de que a exposição não traz danos quando ligada à vacina. Não à toa, Doria deu duas coletivas no Butantan na semana passada. A avaliação, no entanto, não é unânime: aliados e até tucanos ligados à direção nacional dizem que pesquisas qualitativas internas mostram que mesmo essas aparições são exageradas e causam rejeição, o que explicaria por que a CoronaVac não surtiu efeitos positivos para a imagem de Doria nesses levantamentos. Parte dos encontros semanais agora fica a cargo do vice, Rodrigo Garcia (DEM), cotado para ser candidato ao governo de São Paulo no ano que vem.

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Além de aparecer menos, Doria tenta focar suas declarações públicas em agendas positivas, como imunização, projetos que propiciem geração de emprego ou ajudem famílias vulneráveis — na quarta-feira, ele anunciou campanha de doação de comida ligada à vacinação.

A mudança de estratégia não é só no conteúdo. O tucano deixou de lado o paletó e passou usar camisa para fora da cintura e calça jeans. A mudança no vestuário ocorre pouco mais de um mês depois de o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso dizer que Doria deveria ser mais brasileiro e “menos paulista".

Bom humor nas redes

Nas redes sociais, no lugar do mote do “João trabalhador”, que o alçou à prefeitura de São Paulo em 2016, apareceu o “João vacinador” . Ao rebater ataques de opositores, Doria adotou o bordão “vou vacinar você também”, como fez ao falar com o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) na última semana. Ainda na linha de dar leveza à sua comunicação, o tucano assumiu o apelido “calça apertada”, alcunha criada por bolsonaristas.

Para o cientista político Carlos Melo, a mudança na imagem do tucano busca o eleitorado de centro.

— Doria tem rejeição de parte da direita por romper com Bolsanaro e da esquerda por ser anti-PT. Agora quer amenizar a imagem com o perfil “zoeiro”, que não é tão conservador, pois sabe rir de si mesmo. Ao mesmo tempo, tenta reduzir sua exposição, mas sua ansiedade não o impede de ir ao Butantan dar inúmeras coletivas.

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A exposição excessiva também pode levar a “escorregões”. O exemplo mais recente foi o lançamento da vacina Butanvac, no dia 26. Doria alardeou que seria o primeiro imunizante 100% nacional. Horas após o anúncio, o jornal “Folha de S.Paulo” revelou que a tecnologia para o imunizante foi desenvolvida nos Estados Unidos. Ainda assim, a produção ocorrerá 100% no Brasil, sem necessidade de importação de matéria-prima. Na segunda-feira, o governador disse que não sabia da pesquisa americana.

No PSDB, o episódio alimentou a oposição que Doria enfrenta na sigla.

A direção nacional do partido sustenta que o candidato à Presidência será escolhido por prévias. Além de Doria, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, pretende concorrer. Não está descartada a hipótese de a legenda abrir mão da candidatura, caso o nome escolhido não consiga aglutinar outras forças do centro. Nesse sentido, a mudança na postura de Doria é bem vista, mas há desconfiança se há tempo hábil para reverter sua rejeição.