O Palácio do Planalto, iluminado na noite de 10/07/2018 Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo

Leia as entrevistas dos presidenciáveis ao GLOBO

Candidatos ao Planalto falam de suas propostas e candidaturas

O Palácio do Planalto, iluminado na noite de 10/07/2018 - Ailton de Freitas / Agência O Globo

por O Globo

RIO — Em entrevistas exclusivas ao jornal O GLOBO, os pré-candidatos à Presidência da República falam de suas propostas, carreiras e polêmicas. Aqui o leitor encontra todas as entrevistas.

Jair Bolsonaro (PSL)
por Marco Grillo / Maiá Menezes / Thiago Prado

Jair Bolsonaro afirma que não entende de economia - Leo Martins / Agência O Globo

Na primeira entrevista do GLOBO com candidatos à Presidência, Jair Bolsonaro, escolhido o nome do PSL ao Planalto, admite desconhecer assuntos econômicos e diz que quem responde por ele nesta área é o consultor Paulo Guedes — o seu ‘Posto Ipiranga’. O deputado ainda provoca adversários e afirma não entender o que o movimento feminista quer.

Em declarações públicas recentes, o senhor gerou desconforto ao dizer que não entende de economia. Não é um problema para um candidato que mira o Planalto?

Não entendo mesmo. Não entendo de medicina, de agricultura, não entendo um montão de coisa. Acho que temos que ter bom senso para governar. Foi o que falei para a equipe do Paulo Guedes (economista responsável pelo programa econômico do presidenciável). O que a gente quer: inflação baixa, dólar compatível para quem importa e exporta, taxa de juros um pouco mais baixa e não aumentar mais impostos. Só pedi coisa boa.

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Mas a economia vai ser um eixo relevante da campanha...

Esse é o bê-a-bá, precisa saber mais do que isso? Estou indo para o vestibular ou para campanha política?

Por exemplo, qual seria a sua política de combate à inflação?

É com ele ( Paulo Guedes ). Mas acho que tem que manter a meta que está aí, de 4,5%. Agora, é importante dizer que a inflação está muito mais baixa, não pelo trabalho da equipe econômica, mas sim pelo desemprego e empobrecimento da população.

O senhor é favorável à autonomia ou até mesmo a independência do Banco Central?

O Goldf... Como é o nome dele? (um assessor diz o nome de Ilan Goldfajn, presidente do Banco Central). A ideia do Paulo Guedes é mantê-lo. Outro dia, o Paulo deu uma declaração importante: devemos manter alguns integrantes da equipe econômica atual. Até alertei: “Paulo, não fala em manter alguns da equipe, fala o nome dos caras, para não me vincular com o Temer.” Daqui a pouco, a imprensa vai dizer que apoio o governo Temer.

Qual a sua proposta de reforma tributária?

O deputado Luiz Carlos Hauly está bastante avançado em um projeto. Não vi ainda, mas as informações que tenho são de que, sendo aprovada, vai trazer um grande alívio. O Marcos Cintra (economista) tem fixação em imposto único. Eu, como leigo, acho que é legal, mas também uma utopia. Se conseguir diminuir 15 ou 20 impostos, já seria excelente. É igual à reforma da Previdência: vamos devagar, que a gente chega lá.

Taxação de grandes fortunas?

Sou contra.

E taxar dividendos?

Quem aplica no mercado financeiro, é isso? Aí eu vou para o Posto Ipiranga. Perguntar para o Paulo Guedes. Não tenho vergonha de falar isso não.

Tudo o senhor joga para o Paulo Guedes?

Sobre isso aí (taxar dividendos), eu vou ouvir a opinião dele.

O senhor é contra aumentar imposto, mas pode assumir um governo com problema de caixa. Onde vai cortar?

Se para salvar o governo, tem que quebrar os trabalhadores, vamos morrer juntos abraçados. Ninguém aguenta mais pagar imposto. Podemos também diminuir a quantidade de ministérios. Fundir Agricultura e Meio Ambiente. Transformar o Ministério da Cultura só em uma secretaria.

A negociação durante meses com o PR, liderado pelo Valdemar Costa Neto, condenado no mensalão, não contraria seu discurso contra as práticas da velha política?

Minha negociação era apenas com o senador Magno Malta. O Valdemar abriu para que eu colocasse quem eu quisesse de vice: do meu partido, do dele ou até mesmo um terceiro. Ele coligaria conosco desde que nós fechássemos aliança no Distrito Federal, Rio e São Paulo. Mas acabou, PR já morreu.

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A aliança do centrão em torno de Geraldo Alckmin preocupa o senhor?

O centrão diz que vai bater mesmo o martelo lá para o dia 4 de agosto. Podem acontecer problemas entre eles, e alguém vir para o nosso lado. O atrativo que eu tenho é a popularidade. Mas estou muito tranquilo. Se der zebra, eu vou para a praia. Não estou preocupado com isso.

O senhor quer mesmo ser presidente da República?

Não estou com obsessão, mas sigo em frente. Acabei de chegar de uma viagem barra pesada. Sozinho, por Goiânia e Rio Verde (GO).

Está cansado da pré-campanha?

Eu digo que sou “imbroxável”, mas estou meio broxa sim.

O senhor vai participar dos debates?

Vou, mas sem ficar preso à agenda, no joguinho de discutir besteira. Vou dar um tranco de dez segundos e falar o que interessa. Não adianta querer me amarrar numa pauta. Vou responder o que eu quero.

O senhor imagina algum adversário caso passe para o segundo turno?

Acho que não enfrento ninguém. A gente ganha no primeiro turno. O Alckmin acabou de me ajudar com a aliança com o centrão. Vou mandar um beijo para ele. Um beijo hétero.

Ele tem tentado provocar o senhor nas redes sociais. Vai responder?

Não vou entrar na pilha dele. Ele perde em casa (São Paulo) para mim em toda pesquisa. Ele tem que se explicar, crescer um pouquinho mais.

Marina e Ciro também já alfinetaram o senhor publicamente...

Não sou psiquiatra para responder o Ciro. Já a Marina me chamou de hiena em entrevista a um programa de rádio. Imagina se fosse o inverso. A hiena é um animal que só faz amor uma vez por ano, come porcaria o tempo todo...

Sabe quanto a sua pré-campanha gastou até agora?

Não. Fico em casa de amigos. São caras que me convidam, alguns parlamentares. Há uma briga de foice para me levar a qualquer estado do Brasil. Minhas viagens são com o dinheiro do partido. Antes, viajava, em média, uma vez e meia por mês. Agora é quase toda semana.

Tem empresário ajudando o senhor no empréstimo de jatinhos ou na produção de vídeos?

Já tive oferecimento de jatinho e helicóptero e não aceitei. Sobre os vídeos, tem gente que faz no amor e manda para cá. As mídias sociais, sou eu que posto.

Há páginas no Facebook impulsionando postagens favoráveis ao senhor, além de outdoors espalhados pelo Brasil. É tudo espontâneo?

Eu não tenho nada a ver com isso. Não conheço 99% desses caras. Deve ser gente que tem dinheiro. Tem vaquinha também. Por que está acontecendo tudo isso aí? Porque sou diferente dos outros.

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O senhor propôs aumentar o número de ministros do Supremo, medida tomada no passado pela ditadura militar no Brasil e por Hugo Chávez na Venezuela. Não é autoritário?

Não. Tem que propor emenda à Constituição, e os nomes seriam acolhidos pelo Senado. Eu indicaria dez. Ninguém em sã consciência acha que o Supremo, em especial a Segunda Turma, está fazendo um trabalho à luz da Constituição.

Pelos cálculos, o senhor poderá indicar dois ministros do STF se for eleito. Por que quer indicar dez?

Você tem que ter maioria independente no Supremo.

Seria dependente do senhor essa maioria, certo?

Não. Nós sabemos como são indicados os ministros. Em especial, quando começou o mensalão, o critério foi mais politizado e ideologizado. E o Supremo está numa situação de querer legislar. O Conselho Nacional de Justiça também, e o Executivo e Legislativo não tomam providência.

O senhor defende pontos fora da lei brasileira, como uma espécie de carta branca para policiais matarem em operações nas favelas. Por quê?

A lei permite só para o lado do crime. Imagina um soldado na rua em missão da GLO (Garantia da Lei e da Ordem). É surpreendido, tem troca de tiros e acaba morrendo um inocente. É justo levar esse garoto para uma Auditoria Militar para uma condenação de 12 a 30 anos de cadeia? Ele tem que ser responsabilizado por tudo isso? Estamos vivendo em guerra, e nela os dois lados atiram. Eu topo manter como está se os especialistas e a imprensa participarem com os policiais de uma operação e mostrarem como têm que fazer.

Em entrevista para a revista Playboy, em 2011, o senhor disse a seguinte frase: “Prefiro que um filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí”. Voltaria atrás?

Negativo. Não foi do nada. Naquela época, o governo estava com um programa para combater a homofobia e apareceu o kit gay (forma como Bolsonaro chama uma cartilha que seria distribuída pelo Ministério da Educação para debater sexualidade no ambiente escolar). Minhas frases foram importantíssimas para combater a questão de ensinar sexo para criancinha a partir de seis anos de idade.

O senhor acha que é possível ensinar a ser gay?

Não é ensinar, mas estimular. Se você passa um filme na escola de dois meninos se beijando, o Joãozinho no intervalo pode dar uma bitoquinha no Pedrinho. O garoto, até uma certa fase, imita.

Um garoto não poder ver um beijo gay mas pode fazer gestos como se estivesse com armas? (Bolsonaro foi fotografado simulando o uso de uma pistola)

Pelo amor de Deus, você quer comparar beijo gay com isso? Essa foto foi tirada de maneira totalmente espontânea, o pai autorizou e tudo. Ontem fiz mais uma. Chega de frescura, quando eu era criança brincava de arma o tempo todo. Nas favelas, tem gente de fuzil por todo o lado. Um filho vê o pai policial armado todo dia. Não vejo maldade nenhuma nisso. As crianças do Brasil têm que ver as armas como algo ligado à responsabilidade e de proteção à vida.

Caso eleito, haverá preocupação de gênero na formação da sua equipe?

Não vai ter essa preocupação de afro, mulher ou gay. Quero gente que dê conta do recado. Pode ter 14 mulheres até.

O senhor repetiria hoje a declaração de que a deputada Maria do Rosário “não merece ser estuprada, por ser muito feia”?

Exemplo: estou jogando futebol contigo. Você me dá um carrinho por trás, eu xingo você e dou uma cotovelada. Chama-se ato reverso. Estávamos discutindo o caso Champinha. Ela perdeu os argumentos, me chamou de estuprador, e eu respondi no reflexo.

O movimento feminista reagiu fortemente às suas falas...

Cada um faz o que quer da sua vida. Não estou preocupado com movimento de mulher com braço cabeludo. Não interessa. Quer depilar, depila; não quer, não depila.

O movimento feminista não é sobre depilação.

Mas o que o movimento feminista quer? Não sei. Não estou preocupado com isso.

Guilherme Boulos (PSOL)
por Flávio Tabak / Fernanda Krakovics

O pré-candidato do PSOL à Presidência, Guilherme Boulos, em entrevista exclusiva ao GLOBO - Marcio Alves / Agência O Globo

Pré-candidato à Presidência pelo PSOL, Guilherme Boulos , de 36 anos, defende uma política econômica voltada para o combate a “ privilégios ” e desigualdades. Seus pilares são uma reforma tributária que taxe fortunas, heranças e lucros, além de uma redução das desonerações fiscais a empresas.

Apesar de repetir que o ex-presidente Lula foi condenado sem provas e criticar a Lava-Jato, o coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) diz não ter “compromisso com o erro de ninguém”.

Formado em psicanálise, Boulos diz que não só a esquerda, mas o sistema político brasileiro como um todo precisa fazer uma autocrítica para evitar a repetição de erros. E conclui: “O Brasil precisa de um psicanalista”.

O GLOBO entrevistará todos os presidenciáveis.

Por que a esquerda tem quatro pré-candidatos?

Nós temos construído uma unidade na esquerda em defesa da democracia e dos direitos sociais. Agora, existem pontos de diferença. Na esquerda não existe pensamento único, felizmente.

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Qual é a diferença do senhor para o PT, Ciro Gomes (PDT) e Manuela D’Ávila (PCdoB)?

A nossa candidatura representa um projeto de enfrentamento a privilégios. Não vamos avançar em direitos sociais no Brasil sem enfrentar a república dos bancos que manda neste país. E não dá para fazer alianças com o campo político que representa o governo Temer, com os partidos do centrão e o MDB.

Como pretende governar sem compor com outros partidos?

A sociedade brasileira está cansada de toma lá, dá cá. Isso não quer dizer que não vamos dialogar com os partidos políticos, com o Congresso. O que não nos dispomos a fazer é troca de cargos por voto, é negociar princípios no balcão. Para que a gente possa mudar o sistema político brasileiro, temos um duplo movimento: a renovação do Congresso e a mobilização da sociedade em torno de causas, e com participação em plebiscitos e referendos.

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Essa democracia direta, com plebiscitos, não diminui o papel do Congresso?

O Congresso tem seu papel e o presidente da República também. Nenhum deles tem poder supremo.

Qual seria o primeiro plebiscito, se eleito?

No dia 1º de janeiro de 2019, um plebiscito para revogar os atos desse governo Michel Temer: reforma trabalhista, teto de gastos sociais, entrega do pré-sal para empresas estrangeiras. A autorização da venda da Embraer para a Boeing é de um entreguismo sem tamanho, ameaça 17 mil empregos aqui no Brasil, sem contar a questão da soberania nacional.

O senhor aparece com 1% nas pesquisas. Como pretende crescer?

Essas são as eleições mais imprevisíveis dos últimos 30 anos, é um cenário totalmente aberto. Essa mesma pesquisa diz que 58% não sabem em quem vão votar ou vão votar nulo ou branco. O jogo nem começou.

Mas será que o senhor não está falando só para a militância do PSOL?

Na pré-campanha, a nossa candidatura foi a única que pisou em favela. Não estamos pregando para convertido, não. Quando tivermos oportunidade de fazer isso nos debates de TV, quando o interesse das pessoas se voltar para a campanha, seguramente vai ficar clara a amplitude da nossa candidatura.

Lula disputou quatro vezes e só venceu quando fez a Carta ao Povo Brasileiro. É possível chegar lá sem levar seu discurso para o centro?

A História não se repete. Os desafios colocados hoje não são os mesmos. O sistema da nova República, em que o PT e o Lula atuaram, faliu. Estamos diante de um desafio de refundação democrática no Brasil, estamos diante de uma crise política, econômica, ética. O povo brasileiro está descrente dessa forma de fazer política, não aceita mais esse toma lá, dá cá.

O senhor critica o toma lá, dá cá, mas faz parte da campanha contra a prisão do ex-presidente Lula, cujo governo foi marcado por esse tipo de política. Está no mesmo grupo que o senador Renan Calheiros (MDB-AL), que também defende o Lula.

Estou no mesmo grupo que o Pérez Esquivel, Prêmio Nobel da Paz; de Boaventura de Souza Santos; da maior parte dos juristas brasileiros que lutaram contra a ditadura militar. Defender a liberdade do Lula é uma questão democrática, por entender que houve um processo de perseguição política com o objetivo de retirá-lo do processo eleitoral. Em relação aos governos do PT, esse é um dos nossos pontos principais de crítica: não se fez uma necessária reforma política e se governou com quem sempre mandou no Estado brasileiro. Nós não vamos governar com Renan, (José) Sarney, (Romero) Jucá.

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O Lula está preso pelo processo do tríplex e ainda há outros, como o do sítio de Atibaia, no qual os indícios contra ele parecem mais numerosos. Como o senhor enxerga essa ação?

Condenação em processo criminal não se faz por convicção nem por atacado, e sim com base em provas. No estado de direito é assim. O Lula foi condenado no processo do tríplex sem nenhuma prova material, apenas delações.

Então, na sua avaliação, Lula não cometeu crime em nenhum momento?

A quem cabe provar se o Lula cometeu crime é o Ministério Público. E até aqui não provou.

A perseguição política de que o senhor fala seria feita pela Operação Lava-Jato?

A Lava-Jato começa com o espírito de combate à corrupção, mas ela toma caminhos de politização e partidarização. O Lula está preso sem nenhuma prova apresentada e Michel Temer, com excesso de provas, está governando o Brasil. O Aécio Neves dizendo que ia matar o primo antes de delatar está fazendo lei no Senado.

A estimativa é que a Lava-Jato recupere R$ 12 bilhões. Daria para construir 63 mil imóveis do Minha Casa Minha Vida. Isso é desprezível?

Não, de forma alguma. Para ficar muito claro: corrupção tem que ser investigada e, havendo prova, as pessoas têm que ser punidas, independentemente da coloração partidária. Não temos compromisso com o erro de ninguém.

Por que o senhor está perto do Lula e do PT, então?

Sou candidato a presidente pelo PSOL. Agora, diferença política não vai fazer a gente conivente com injustiça.

Qual é o seu principal adversário no primeiro turno?

O atraso representado por Jair Bolsonaro e os banqueiros, por Geraldo Alckmin.

A auditoria da dívida pública continua uma bandeira sua?

O enfrentamento aos privilégios e às desigualdades são pontos essenciais. Vamos fazer uma reforma tributária progressiva, com taxação de grandes fortunas, de lucros e dividendos, e de grandes heranças. Vamos enfrentar a Bolsa Empresário. Só este ano são R$ 283 bi de desonerações fiscais a empresas. Vamos cortar parte dessas desonerações. Terceiro, o Bolsa Banqueiro, que são os juros extorsivos da dívida pública. Isso passa por uma política consistente de redução dos juros, reestruturação do perfil da dívida e por uma auditoria para evitar que se repitam problemas em relação à rolagem da dívida pública brasileira. O ajuste fiscal é uma política desastrosa e que não será seguida em nosso governo.

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Qual sua avaliação sobre a situação da Nicarágua?

O que está acontecendo na Nicarágua é lamentável. Condenamos de maneira clara essa repressão feita pelo governo. Ao mesmo tempo, há milícias de oposição que também entraram no enfrentamento. Não tem um mocinho na história da Nicarágua.

E na Venezuela, o senhor considera a reeleição de Nicolás Maduro legítima?

Sim, como reconhecem observadores internacionais, inclusive o ex-presidente espanhol (José Luis) Zapatero, que não é suspeito de ser bolivariano.

O senhor é formado em psicanálise. Acha que a esquerda brasileira precisa de um pouco de autocrítica?

Não só a esquerda. Não tenho dúvida de que a esquerda precisa. Todos precisamos. O sistema político precisa de autocrítica, reconhecer o quanto se afastou das pessoas. No caso da esquerda brasileira também. Reconhecer erros não é demérito para ninguém. Deixar de reconhecer é um problema, porque voltam. Como se diz em psicanálise, quando não se reconhece, não se supera o passado. Fica como um passado que não passa, assombra o presente e compromete o futuro. Do ponto de vista psicanalítico, é uma das razões pelas quais me tornei candidato. Em um momento de intolerância, ódio, violência, o Brasil precisa de um psicanalista.

Geraldo Alckmin (PSDB)
por Cristiane Jungblut, Maiá Menezes e Silvia Amorim

Entrevista com o candidato à Presidência pelo PSDB, Geraldo Alckmin, na redação do Globo - Ana Branco / Agência O Globo

Visivelmente mais confortável depois de ter conseguido fechar a mais ampla aliança da eleição e de ter driblado as resistências do centrão para a escolha da senadora Ana Amélia (PP-RS) como vice, o pré-candidato à Presidência Geraldo Alckmin (PSDB) não esconde o pragmatismo das suas ações nas costuras políticas. Em entrevista ao GLOBO, ele afirma que o político que não faz alianças acaba “abandonado” e aposta que o centrão não será fisiológico em seu governo.

O senhor diz que representa o “novo” nesta eleição . Como isso é possível se está há 40 anos na política e tem ao seu lado o centrão?

Primeiro, o novo não é não ter nenhuma experiência de administração pública ou nunca ter sido candidato. O novo é defender o interesse coletivo e mudar a política. É isso que queremos.

Mas são partidos pautados pelo fisiologismo há muitos governos...

Acho que as pessoas entendem o objetivo. Vocês fulanizam muito. O Valdemar Costa Neto (líder do PR) não é nem candidato. O PR tem o Josué Gomes, um dos melhores quadros desta nova geração. O fato é o seguinte: se você não faz aliança, você é criticado, está abandonado, não decola, vai ser cristianizado. Quando faz a aliança, dizem: “Puxa, a aliança é grande demais”. Na política, a gente tem que ter um foco: como é que vamos tirar o Brasil da crise. Esse é o foco e é isso que interessa.

Por que eles (o centrão) mudariam agora?

Eles vão ter que mudar porque farei um governo com rigor ético absoluto. O que eles querem é ser partícipes.

Os políticos querem mais do que isso...

Não há a menor hipótese de isso acontecer.

O senhor é alvo de uma investigação por suspeita de caixa 2 em 2010 e 2104. Seu cunhado, Adhemar Ribeiro, é apontado como arrecadador desses recursos. O senhor disse há algumas semanas que não é crime “apresentar pessoas”. Adhemar apenas apresentou doadores para as suas campanhas?

Ele nunca arrecadou, nunca foi da tesouraria do partido. Agora, uma pessoa que tem mulher banqueira e é dono de financeira tem relacionamentos. Qual é o problema nisso? Não levou pessoas, mas é claro que ele é uma pessoa bem relacionada. As minhas campanhas sempre foram rigorosamente dentro da lei.

Como pretende tratar o tucano Aécio Neves, réu na Lava-Jato?

Ele foi afastado da direção partidária e ainda não foi julgado. Se for condenado, não vamos passar a mão na cabeça de ninguém.

Outro ator central na Lava-Jato é o Supremo Tribunal Federal. O senhor é a favor do mandato vitalício dos ministros?

Vi um candidato (Jair Bolsonaro) dizendo que vai dobrar o número de ministros. O sujeito quer fazer da Suprema Corte um puxadinho do Executivo, como na Venezuela. Negativo. Acho que deve ser debatida a alternativa de modelo de mandato para os ministros.

O senhor promete quatro reformas (tributária, previdenciária, política e de Estado). Terá cacife político para isso?

Essas reformas mais de fundo precisam ser feitas no começo da legislatura, quando o presidente tem mais legitimidade, voto e força.

Para que as reformas avancem, é fundamental aliados no comando do Congresso. O sr. se comprometeu com a reeleição do deputado Rodrigo Maia para a Câmara?

Minha opinião sobre o Rodrigo Maia é a melhor possível. Mas essa coisa de ficar articulando eleição de mesa legislativa antes da hora não é do meu estilo. Pretendo ter como maior aliado no parlamento a sociedade.

O senhor fala em reduzir ministérios, mas não diz para quantos. O eleitor não merece um pouco mais de clareza para decidir o seu voto?

Não vou anunciar isso durante a campanha. Estou dizendo que vou reduzir. Os detalhes serão ditos pela dinâmica do governo.

O PSDB terá a maioria dos ministérios?

Quem vai ter a maior parte dos ministérios é o povo.

Vai aceitar indicações do centrão?

Podem sugerir (nomes). Mas claro que vou escolher. Nas agências reguladoras, aí não. Só serão técnicos. As agências reguladoras serão despartidarizadas.

A escolha da senadora Ana Amélia (PP-RS) para vice já entra na cota do PP?

Escolhi a candidata a vice que eu quis. Não existe cota. Todos os partidos têm bons quadros. A senadora era o nome ideal. Ela é ligada ao agronegócio, respeitada e admirada, um quadro extraordinário.

Vai privatizar quais estatais?

O que não vamos privatizar é o Banco do Brasil e a Petrobras. Estamos estudando a questão da Caixa Econômica Federal, que tem prós e contras. É importante dizer que não vamos privatizar a Petrobras, mas a área de transporte e de distribuição sim. O episódio da greve dos caminhoneiros é ruim, porque vai afastar investidores. O Brasil está exportando petróleo e importando derivados.

Seu fraco desempenho em São Paulo pode ser entendido como rejeição à sua figura?

Não. Ela é resultado da falta de interesse das pessoas na eleição neste momento.

O senhor terá que tirar votos de Jair Bolsonaro (PSL), que tem um estilo bem diferente do seu. Ser o “chuchu” nessa hora atrapalha?

Quem tem que ter carisma é o povo. Governo não deve girar em torno de astros. Isso é coisa do passado. Vou ser o que sempre fui: discrição, humildade, simplicidade. Governante é para resolver problemas da população. Não quero espetáculo, nem sair dando tiro. Quero colocar o Brasil no rumo do crescimento. Só faço um reparo. Não é chuchu, é picolé de chuchu, que é mais saboroso.

Um dos maiores problemas da segurança pública é o domínio das facções criminosas. O maior grupo atuante no país nasceu e se expandiu a partir de São Paulo, chegando a outros países. Seu governo não tem parcela de responsabilidade nisso?

São Paulo tem os melhores indicadores do país. Tínhamos 11 mil homicídios por ano em São Paulo e, em 2017, foram 3.503. Não vai ter mágica para resolver a violência no país, mas dá para reduzir. Estados e municípios terão metas de redução. Não tem um líder de facção criminosa em São Paulo que não esteja preso.

O senhor tem prometido acabar com privilégios com a reforma da Previdência. O presidente Temer tirou da reforma os servidores das Forças Armadas e das polícias militares. Vai manter isso?

As Forças Armadas passarão por reforma, mas separadamente. No mundo todo, elas têm um regime de previdência próprio.

Isso não é manter privilégios?

Vai ter reforma, mas com regras diferentes. Vou criar o regime geral de previdência para os servidores de todos os poderes com o teto do INSS. Não tem sentido ter dois tipos de cidadãos. Quem quiser benefício maior, vai para a previdência complementar. Fiz isso em São Paulo.

Henrique Meirelles (MDB)
por Letícia Fernandes, Paulo Celso Pereira e Robson Bonin

Henrique Meirelles (MDB) vai ser o candidato de Temer à presidência - Daniel Marenco / Agência O Globo

O ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles , 72 anos, já disse que a Presidência da República é uma questão de “oportunidade e destino”. Indicado pelo MDB para disputar o Palácio do Planalto, ele pretende usar a oportunidade para, se eleito, recolocar o país no rumo do crescimento. Seus aliados, porém, esperam que ele assegure alguma tranquilidade ao destino do grupo político do presidente Michel Temer que ficará sem o foro privilegiado a partir de 31 de dezembro. Sobre esse assunto, ele afirma que só analisará contratações depois de eleito. Ciente do desafio de representar na urna o governo mais impopular da História, Meirelles tenta se descolar de Temer oferecendo aos brasileiros, em troca do voto, as suas realizações na economia. “Eu retirei o Brasil da maior recessão da História”, disse ao GLOBO.

O slogan do senhor é o “Chama o Meirelles”. Se o povo o fizer, o senhor vai chamar ao seu governo Eliseu Padilha, Romero Jucá, Moreira Franco e Temer?

Eu nunca nomeio equipe na véspera. Só depois que eu fui empossado tanto no Banco Central quanto no Ministério da Fazenda é que comecei a montar uma equipe. Vou tomar essa decisão o dia que eu vencer a eleição e começar a compor o Ministério.

O senhor costuma dizer que tem biografia limpa. Não fica constrangido em posar ao lado de Temer e ministros investigados?

Eu não escolho os líderes do país. Agora, a minha biografia é o que reflete a minha história e as minhas atitudes. Fui presidente de uma grande organização internacional no exterior e posava ao lado de líderes do setor empresarial. Voltei ao Brasil, fui a Goiás e posei ao lado de líderes do partido, na época o PSDB. Entrei no Banco Central, posei ao lado do Lula e de ministros dele. Hoje, com toda a satisfação, poso sim ao lado dos líderes do MDB.

Como pretende crescer nas pesquisas sendo candidato do governo Temer?

Eu sou o candidato da geração do emprego e da renda. Qualquer governo que eu participei, isso é muito facilmente entendido pelo eleitor. Quando a campanha na TV começar a levar aos eleitores a informação sobre tudo que eu já fiz pelo país, o eleitor vai reagir favoravelmente.

Vai defender a biografia do presidente?

Eu vou defender a biografia do que nós fizemos, que é positiva e inquestionável.

Pretende receber empresário na calada da noite para conversar?

Não. A minha biografia já diz. Já tem as respostas para tudo isso. Eu não estou dizendo que vou ou não vou receber. Estou dizendo o que eu já fiz e o que eu faço. Não vou ficar especulando. “Você faria aquilo que o Lula fez? Faria aquilo que os líderes do PSDB fizeram?”. Defendo a minha história pessoal, independentemente de qualquer governo para o qual eu trabalhei.

A retomada econômica é lenta, há 13 milhões de desempregados no país. Que resultados o senhor vai apresentar na campanha?

Eu retirei o Brasil da maior recessão da História. O que ocorreu, no entanto, não tem a ver com recuperação econômica que foi feita, tem a ver com a incerteza eleitoral causada por candidatos de extremos. Um que propõe a volta das políticas que levaram à recessão e ao desemprego e o outro que diz que não entende de economia e vai delegar para alguém o trabalho dele.

A agenda econômica do governo Temer, com a reforma da Previdência, está mantida?

A negociação da reforma já foi feita e não precisa voltar atrás. Está no Congresso e eu acho que será aprovada. Os demais temas são projetos que levam ao crescimento econômico, ao aumento do emprego e da renda, ao controle da inflação com juro mais baixo, incluindo autonomia do Banco Central.

O que o senhor não abre mão na reforma?

É o que já foi negociado com o Congresso. Hoje, o trabalhador que ganha menos não consegue completar 35 anos com carteira assinada. Aposenta por idade, com 65 anos. Aprovada a reforma, aqueles que se aposentam cedo, com altos salários, vão ter que trabalhar mais tempo para aposentar.

Como seria concorrer com um candidato preso e condenado por corrupção (caso do ex-presidente Lula, que cumpre os requisitos para ser considerado ficha-suja)?

É direito do partido propor o candidato que julgar adequado. Porém, sou favorável ao fortalecimento das instituições e que se respeite as decisões da Justiça. O partido pode pleitear, mas é a Justiça que define.

O ex-presidente Lula se corrompeu?

Estou aguardando a decisão final da Justiça para ter uma conclusão.

É a favor da prisão em segunda instância?

Acho que compete ao Supremo discutir. Não sou advogado e não pretendo tomar o lugar do Tribunal. No meu plano de governo não consta um plano de alteração de regras penais. Respeitarei o que for decidido.

O senhor divulgou um vídeo em que Jair Bolsonaro chama Maria do Rosário de vagabunda. Que mensagem queria passar?

Simplesmente divulgar a verdade. Eu não gosto de calúnia, não gosto de adjetivos para se ficar tentando classificar adversários, falando informações falsas.

Ciro Gomes disse que o senhor não confia no Brasil. Por isso levou seu dinheiro para paraíso fiscal.

Uma coisa falsa e desinformada. Quando eu morava no exterior, abri a Fundação Sabedoria para deixar a ela, quando eu morrer, uma parte da minha herança para investir em educação no Brasil. Foi feita uma pequena doação nominal para constituir a fundação, tudo declarado à Receita Federal em 2002. Se o ex-governador fosse estudar o assunto, saberia que isso foi suficientemente divulgado no caso Panama Papers e ficou claro que, na realidade, é algo positivo. Quantas pessoas criam uma fundação para financiar educação no Brasil? Quem pode criticar isso?

Prorrogaria a intervenção na segurança do Rio?

A intervenção foi uma necessidade. Não havia alternativa naquele momento. O governador mostrou a impossibilidade de enfrentar o problema ante a crise fiscal. Agora, o trabalho será de recuperar a polícia no país. Tem estado que há mais de dez anos não contrata efetivo e nem compra viatura. Não tem polícia que consiga atuar nessas circunstâncias. Então, temos que equipar as polícias.

Como o senhor vai fazer campanha no Rio tendo dois caciques do seu partido, Sérgio Cabral e Jorge Picciani, na cadeia. Vai ao palanque dos filhos deles?

Aceito apoio de todas as lideranças importantes que queiram me apoiar. Não sou justiceiro e respeito as instituições. Vou aceitar apoio de todos os líderes em condições legais de me apoiar.

Qual a sua posição sobre o aborto?

Eu sou a favor da lei atual que prevê situações onde isso é justificável.

E sobre a descriminalização da maconha?

Eu sou favorável à aplicação da lei atual, uma lei de 2006, que veda a prisão de usuários da maconha. Acho que não deve ser mandar à prisão o usuário, mas tem que se fazer políticas visando desestimular o consumo.

O que pensa da redução da maioridade penal?

É uma ideia, a princípio, boa. No Brasil, temos um amadurecimento cada vez mais cedo, mas tem que colocar alguma diferenciação entre o crime cometido a partir de 16, 18 e 21 anos.

E sobre o casamento de pessoas do mesmo sexo?

As pessoas têm direito de exercer a sua preferência. Acho que não pode ser nem propagado nem proibido.

Álvaro Dias (Pode)
por Amanda Almeida, Francisco Leali e Robson Bonin

O presidenciável Álvaro Dias, em entrevista ao GLOBO - Daniel Marenco / Agência O Globo

Escolhido pelo Podemos para a Presidência, o senador Alvaro Dias , de 73 anos, acredita que pavimentará seu caminho ao segundo turno com o quixotesco discurso de refundação da República. Provocado a explicar como reorganizará a política com os atuais líderes do centrão e suas práticas, ele revela-se otimista: “Eu acho que eles podem mudar”. Enquanto sonha com a conversão da banda fisiológica do Congresso, Dias mira o PT e o PSDB. Afirma que Geraldo Alckmin “vendeu a alma da nação” ao lotear o futuro governo com o centrão. Sobre a viabilidade eleitoral do ex-presidente Lula, é direto: “O presidiário está inelegível”. Ele ainda sugere ao presidente Michel Temer suspender a intervenção no Rio após as eleições para votar a reforma da Previdência. Também defende o direito ao porte de arma.

O senhor já sente o interesse do eleitor pela campanha eleitoral?

Há uma distância enorme entre o processo eleitoral e a sociedade. É preciso aproximar, mas não sei se teremos a competência suficiente para isso. O desconhecimento sobre os candidatos é muito grande. Por isso questiono muito as pesquisas. A interpretação está equivocada. Se você tem 60% de indecisos, não há como dizer que alguém tem 30% dos votos. Essa interpretação de pesquisa, inclusive, influenciou a formação das alianças. Esse ajuntamento de siglas se deu em função do interesse de manutenção do sistema atual. É a reedição da tragédia que estamos vivendo.

O senhor fala da aliança de Geraldo Alckmin com o centrão?

É o maior ajuntamento de siglas. Virou uma sopa de letrinhas para o eleitor digerir na campanha, com uma prioridade: a manutenção desse sistema. Porque, se for substituído, muitos políticos não sobreviverão.

O senhor critica a aliança de Alckmin, mas, em 2014, fez campanha com 17 partidos, entre eles PP, PR, DEM e SD. A fotografia se tornou trágica por que não é com o senhor?

A crítica que faço não é à coligação, mas o que a fez se constituir. Na campanha ao Senado, em 2014, não teve negociação. Não assumi compromissos. Conversei com esses partidos agora, mas a minha proposta não convenceu. Você não condena sigla, só o que ela esconde.

O que eles queriam para apoiar o senhor agora?

Não houve detalhamento. Mas tinha a reclamação: “A gente ganha, mas não leva”.

Não leva os cargos?

Sim. “Vamos ganhar, mas não vamos ocupar. Seremos tropa de combate, mas não de ocupação”. Frases próprias do mundo da política.

Alckmin levou porque aceitou essa proposta?

Tenho certeza. Venderam a alma da nação nesse ajuntamento. Alguém pode dizer que convivi com esse sistema. Mas onde eu estava? Combatendo o sistema. Só fui governo quatro anos, quando governei o Paraná, e durante sete meses do segundo mandato do FH. O meu itinerário todo foi na oposição, contestando. Mudei várias vezes de sigla, para não mudar de lado, por coerência. Nunca barganhei as minhas convicções.

O senhor vai entregar ministério ao centrão?

Para nenhum partido. Vou escolher ministros qualificados. Não importa de onde venham.

Em 2019, o senhor terá no Congresso os mesmos caciques partidários desse sistema que o senhor critica. Vai refundar a República com esses mesmos chefes de partidos?

Você acha que eles não mudam, mas eu acho que eles podem mudar. É fácil dizer que tem corrupção no Congresso. Tem, mas não podemos generalizar. Por que há corrupção no Congresso? Porque, do outro lado da rua, está o corruptor, o presidente da República. Nesse presidencialismo de muito poder, o Congresso dança a música que o presidente toca. O presidente tem que ter coragem de promover mudanças se valendo da credibilidade obtida nas urnas. Se a sociedade apoiar, ele vai ter o Congresso ao lado. O Congresso vai reabilitar sua imagem. Não vai remar contra a maré. Isso é ingênuo? Alguns podem imaginar que seja. Temos de ser otimistas.

Vai soltar Lula, como Ciro Gomes defendeu?

Se cometeu crime, o lugar dele é na cadeia. Não há outra alternativa. A ideia fundamental da refundação da República é que todos devemos nos submeter às leis.

Como avalia a liderança de Lula nas pesquisas?

Contesto essa liderança. Como alguém lidera as pesquisas com 50% de rejeição? O presidiário (em referência a Lula) está inelegível. Uma minoria insignificante o apoia. Temos de olhar o Brasil decente. Isso é uma afronta ao Brasil. É como se o PCC se transformasse em partido e o Marcola (líder) fosse candidato à Presidência. Esse é o Brasil que queremos?

Lula tem méritos?

Claro. Mas o que vale é o conjunto da obra. E ele foi perverso, destruiu sonhos e esperanças. Não apenas empregos e salários.

O senhor vai fazer a reforma da Previdência?

De tudo que se produz no país, 40% circulam nos cofres públicos e 65% disso desaparece com a Previdência e com a folha de pessoal. O ajuste fiscal é urgente. Vou propor que o presidente Temer, depois das eleições, suspenda o decreto da intervenção no Rio e vote a reforma no Congresso em outubro. Se houver segundo turno, os dois candidatos a presidente vão apoiar.

Vetaria o aumento do Judiciário e acabaria com o auxílio-moradia?

Não tenha a menor dúvida. E cortaria o auxílio nos três poderes. Eu não uso auxílio-moradia.

O que o senhor pensa sobre a posse de arma?

Temos que respeitar a população. Houve um plebiscito e 63% foram favoráveis à venda de arma. É um direito do cidadão ter uma arma em sua casa, para permitir a autodefesa. Mas isso não elimina a responsabilidade do Estado na segurança. Não é política de segurança pública. Isso é o respeito ao livre arbítrio.

João Amôedo (Novo)
por Roberto Maltchik / Mariana Martinez

O candidato à Presidência João Amoedo em entrevista ao GLOBO - Alexandre Cassiano / Agência O Globo

Aos 55 anos, o engenheiro João Amoêdo tenta ingressar na vida pública diretamente pelo cargo mais alto. Fundador do Partido Novo , o engenheiro, que atuou por três décadas no setor financeiro, diz que sua candidatura à Presidência da República visa tornar o partido mais conhecido.

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Para tal, o primeiro desafio é conseguir espaço para falar para a população. Com apenas seis segundos na propaganda eleitoral gratuita e um comercial a cada cinco dias, o foco no momento é chegar a 5% nas pesquisas eleitorais, o que poderia levá-lo aos debates de TV.

Alinhado a uma agenda liberal na economia, Amoêdo faz questão de se apresentar como um “outsider” e não perde a oportunidade de criticar Jair Bolsonaro e Geraldo Alckmin pela associação com a “velha política”.

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Qual é o sentido da candidatura do Novo?

Nosso desafio é tornar o Novo mais conhecido. Existe um grande desejo de renovação por parte da população. Temos recebido um nível de aceitação muito grande, com eventos no Brasil inteiro. Eventos lotados. E o nosso desafio, como um partido recente e sem ter nenhuma figura pública conhecida, é chegar ao máximo possível de pessoas.

Se impuseram alguma meta de resultado?

Nosso desafio é chegar aos 5% nas pesquisas para ter alguma chance de ir aos debates. A legislação, infelizmente, é feita para evitar a concorrência. Um partido recente, que nunca participou da eleição, não tem deputado federal. Como não tem deputado federal, não consegue ir para o debate. Qualquer pesquisa aponta que 70%, 80% da população têm um desejo de renovação elevado, e, quando você pergunta para qualquer especialista, ele diz que a renovação vai ser baixa. No fundo é o sistema político que impede. Iremos lançar cerca de 130 candidatos a deputado estadual, aproximadamente 240 nomes para deputado federal, seis senadores e cinco candidatos ao governo. E temos uma meta estabelecida de tentar emplacar 30 deputados federais.

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Bem ousada...

É bem ousada. Sabemos que é difícil, mas estamos trabalhando para isso.

Esse desejo por renovação começou em 2013. E, segundo as pesquisas, não se expressa pela candidatura do Novo.

É aquela questão de ver o copo meio cheio ou meio vazio. Acho nossos números surpreendentes. O partido existe desde setembro de 2015. Participou das suas primeiras eleições municipais em 2016, sem usar dinheiro público, trazendo gente de fora da política e sem fazer coligação. Elegeu quatro vereadores nas cinco cidades que participou. Ficou com a quinta ou sexta maior quantidade de votos na legenda. Teve mais votos, por exemplo, do que a Rede, em São Paulo. Eu nunca fui uma figura pública. No entanto, nas pesquisas espontâneas, onde 60% da população fala que não sabe em quem vai votar, estou mais ou menos igual ao Alckmin e a Marina, entre 1% e 2% da espontânea.

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Se algum outro candidato vencer a disputa e lhe convidasse, o senhor aceitaria atuar no governo?

Depende muito de quais seriam as condições. Em 2008, quando tive oportunidade de ter contato com alguns líderes políticos, especialmente no Rio, concluí duas coisas. Um: temos um sistema político feito para se perpetuar e beneficiar quem está lá dentro. Dois: a gente têm líderes políticos que no fundo têm suas próprias agendas, com pouca liderança e não têm a pauta do cidadão como prioridade.

Qual sua avaliação sobre o arco de alianças de Alckmin?

Acho que ele foi numa linha mostrando que é a velha política. Por causa de dois, três minutos de tempo televisão, fez associações com Valdemar da Costa Neto, Roberto Jefferson...

A advogada Janaína Paschoal fez um convite informal para que o senhor se aliasse ao Bolsonaro. Há ideias que justificariam essa união?

Com o PSL certamente não. É um partido da velha política, tradicional. É muito difícil saber as ideias do Bolsonaro. Assisti à última entrevista dele na GloboNews, e ele não consegue apresentar uma única ideia. Ficou 30 anos como deputado, e não consigo citar duas ou três realizações dele no âmbito federal ou para o estado do Rio. Não quero um chefe de torcida. Eu não me animo com nenhuma das opções que estão aí, independentemente de ser candidato.

Por que Bolsonaro acaba captando com mais velocidade a frustração do eleitorado?

Ele não conseguiu capturar com maior velocidade. Vamos lembrar. O Bolsonaro fez política nos últimos 30 anos. Eu me formei, entrei como trainee no banco, fui gerente, virei diretor, administrei uma empresa, e depois montei um partido. Resolvi me expor como pré-candidato há pouco menos de um ano. O Bolsonaro está há 30 anos fazendo isso. Discutindo com o Jean Wyllys e a Maria do Rosário, aparecendo em rede nacional, participando de várias eleições. Dado tudo isso, nós estamos mais rápidos do que ele.

O Novo não conseguiu transformar Bernardinho em candidato. Também não trouxe nenhum nome conhecido. É frustante?

Convidamos o Bernardinho, que já era filiado ao Novo desde 2016. Chegamos a conversar com o Salim Mattar, que apoia o Novo, mas por questões de negócios preferiu não sair por Minas. Fora o Bernardinho e o Salim, não fizemos nenhum convite. O Bernardinho não quis sair candidato pois achou que não era hora de entrar para a vida pública. Nunca tivemos a ideia de chamar pessoas conhecidas, salvadores da pátria. Sempre quisemos ter pessoas alinhadas com o projeto. Claro, se a pessoa for conhecida, melhor. Mas isso nunca foi um ponto. Do contrário, seríamos mais uma legenda que traz um puxador de votos.

O senhor fala muito em mudar o sistema. Para governar, precisará do sistema, do Congresso. Como fazer isso?

Se eu for eleito, essa mensagem de renovação terá sido bastante difundida. Consequentemente, imagino que teremos uma renovação razoável no Congresso.

Imagina ou deseja?

É óbvio que teremos negociação com esse Congresso. Mas essa negociação tem de ser feita de forma clara, transparente, sem esse fisiologismo atual, sem o toma lá da cá, e chamando a população para participar.

O que seria isso?

Numa reforma política simples, entendo que deveríamos acabar com o dinheiro público para partidos. Seria a melhor forma de sanear essa enorme quantidade de legendas. Acabar com horário eleitoral gratuito para terminar com essas coligações sem nenhum alinhamento ideológico. Instituir o voto facultativo.

Haja renovação no Congresso para se obter isso isso...

A população vai demandar isso, não tenho dúvida. O Brasil entrou numa rota de mudança. O que a gente vai discutir e acompanhar nos próximos anos é a velocidade em que isso acontecerá. Mas pode ser que demore mais.

Imagina um governo que consiga dialogar com o Congresso sem ocupação de espaço em ministérios?

Acho que é viável porque queremos colocar gente técnica lá. Se queremos fazer o Estado funcionar direito, não dá para o ministro da Saúde ser o ex-presidente da Caixa, indicado por partido político e envolvido na Lava-Jato.

O senhor já disse que o Novo tem um tratamento um pouco diferente da imprensa. O que isso significa?

A gente tem muito pouco espaço. A imprensa procurou nos últimos meses um outsider na política. Poderia ser um Joaquim Barbosa. Eu tenho visto uma parte da imprensa dizendo: começamos a campanha sem um outsider. O que eu sou na política, se não um outsider?

Marina Silva (Rede)
por Dimitrus Dantas / Maria Lima / Paulo Celso Pereira

Marina Silva será candidata ao Palácio do Planalto pela terceira vez, agora pela Rede Sustentabilidade - Ana Branco / Agência O Globo

A Rede Sustentabilidade , partido de Marina Silva , ocupa duas salas de um edifício sem luxo de Brasília. Em uma delas, a ambientalista, ex-seringueira e ex-senadora recebeu a reportagem do GLOBO. Por trás de seu discurso, o mesmo desejo das suas duas últimas tentativas de chegar à Presidência: fazer da eleição sua própria versão do duelo bíblico de Davi contra Golias.

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Isolada na disputa, com o apoio apenas do PV (sua antiga legenda), Marina aumenta o tom de voz apenas quando o assunto é Lava-Jato, e dispara contra outros partidos, apesar de ter liberado acordos estaduais com algumas legendas que critica: “Todos eles têm um pacto, combater a Lava-Jato.” Ela sustenta que, em suas campanhas, nunca houve desvios: “As minhas campanhas nunca receberam dinheiro de caixa dois”.

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A senhora se arrepende de ter apoiado o impeachment de Dilma Rousseff?

Não. Houve um crime de responsabilidade. Só que eu nunca me conformei (só com o impeachment). Eu sempre disse: o impeachment tem legalidade mas não alcançará a finalidade. A Dilma e o Temer são faces da mesma moeda. Todos eles têm um pacto: combater a Lava-Jato. Não por acaso, quando o Aécio ia ser afastado, foi o PT que fez um documento pelo não afastamento.

E acredita que o apoio ao Aécio Neves em 2014 pode lhe tirar votos?

Eu não fico trabalhando com essa lógica de votos. Hoje, com as informações que a Lava-Jato trouxe, com a própria voz das pessoas gravadas para todo mundo ver, não teria votado no Aécio. E tem muita gente que não teria votado na Dilma, com exceção daqueles “religiosos” que negam a realidade ou para quem o discurso da ética só serve quando é para o adversário. Não posso ter dois pesos e duas medidas.

A senhora criticou muito a aliança de Geraldo Alckmin com o centrão e bate no PSDB e no DEM, mas liberou a Rede para fazer aliança com esses partidos em estados. Não é esdrúxulo criticá-los e liberar sua base para se aliar a eles?

É que eu sou inteiramente coerente. Se eu estou dizendo, desde 2010, que pessoas boas existem em todos os partidos, estou dizendo que, com base no programa e nas pessoas, nós fazemos alianças pontuais. Seria esdrúxulo se eu dissesse que todos os partidos são problemáticos. Aí seria terra arrasada, porque eu só tenho dois deputados. Pelo amor de Deus... A gente está buscando um realinhamento político para esse país. Estou dizendo que pessoas boas existem em todos os partidos e que vou governar com elas. A política tem que acabar com essa história de desconstruir biografias, acabar com a vida das pessoas só porque você quer o poder. A forma como a gente ganha determina a forma como a gente governa.

A senhora considera o Romário um desses bons quadros da política?

Eu discordei (do apoio à candidatura dele ao governo do Rio). E queria manter a campanha do Miro (Teixeira), que era o meu candidato. Mas o Rio tem sua autonomia de fazer. O meu palanque no Rio de Janeiro é a Rede e o Miro, como meu candidato ao Senado. O Romário está dando palanque para a candidatura do Álvaro (Dias). Espero que o Miro seja eleito senador porque é um homem honrado, altruísta.

A senhora tem batido duro no Bolsonaro e no Alckmin, por causa da aliança com o centrão. Mudou de estratégia?

Eu fiz uma crítica ética (ao Bolsonaro): dizer que os problemas de saúde do Brasil devem ser perguntados no Posto Ipiranga é não entender a magnitude dos problemas de saúde. O que isso tem de ataque pessoal? Ele poderia ter dito: vou procurar meus especialistas. Todo mundo precisa de especialistas. Ninguém sabe de tudo. Não fui eu quem chamou o especialista dele de Posto Ipiranga. Só estou dizendo que eu não usaria a metáfora.

Quais pontos da reforma trabalhista precisam ser revistos?

Tem aqueles que saltam aos olhos. Uma mulher grávida trabalhando em situação insalubre precisa ser revisto. Existem, sim, situações draconianas. O trabalho intermitente tem um problema, assim como a questão do horário do almoço.

A senhora é a favor do imposto sindical?

Fui fundadora da CUT, a gente sempre defendia a liberdade e autonomia sindical. A gente defendia que existia uma estrutura pelega e que existiam muitos sindicatos só mesmo para pegar imposto sindical. Tem que haver uma contribuição, não é imposto, mas uma contribuição sindical. O problema é que não se criou um mecanismo adequado de como os sindicatos continuarão existindo, representando os trabalhadores. Isso precisa ser resolvido. A contribuição voluntária deve ser pela relação de efetividade na questão dos acordos coletivos, nos processos de negociação.

A Lava-Jato atingiu os principais partidos, tornou voz corrente, a partir de inúmeras delações, a existência disseminada de caixa dois. Chegou a haver uma delação citando a campanha da senhora em 2010. A senhora está na política há cerca de 30 anos. Existe a possibilidade de alguma campanha da senhora ter recebido dinheiro de caixa dois?

As minhas campanhas nunca receberam dinheiro de caixa dois, e aquela denúncia feita contra o Guilherme (Leal, vice de Marina em 2010) é uma infâmia, uma mentira. Aquela delação foi anulada. Isso nem deveria ser repetido porque é uma fake news, é uma infâmia que foi feita contra uma pessoa honrada que nem queria receber aquele indivíduo (o empresário Léo Pinheiro, da OAS), eu me recusei a receber aquele indivíduo. Essa delação foi anulada porque é uma mentira o que foi dito contra o Guilherme.

A senhora, que defende tanto a Lava-Jato, se preocupa com a hipótese de outras delações poderem também ser mentirosas?

Eu defendo a Lava-Jato, mas nesse caso não há materialidade. Pode acusar à vontade, mas a verdade vai prevalecer. E a Justiça pode provar. Não importa: leve 100 anos, 500 anos, vá para a eternidade, o Guilherme nunca propôs isso, não é verdade. A Justiça que provou: anulou a delação do mentiroso.

Mas ela foi anulada porque vazou, não necessariamente porque era mentirosa.

Não sei. Mas poderia dar continuidade e nós estamos prontos, tragam as provas. Quem foi? Aonde? Como? Mostrem as provas. Isso não é verdade, é uma fake news que é usada por gente de quinta categoria para botar pessoas honradas e decentes na vala comum da corrupção.

Mas a senhora acha que a Operação Lava-Jato pode ter cometido excessos, que vazamentos da Lava-Jato podem ter sido injustos?

Acho que tem problemas em relação ao contexto. E vou explicar: em um contexto em que a Justiça sabe que está sendo sabotada pelos mais altos cargos da República, fica muito difícil fazer o trabalho de investigação. Fico imaginando: se a imprensa não tivesse dado a publicidade que deu a fatos inaceitáveis da corrupção brasileira, a Lava-Jato teria sido enterrada no primeiro momento.

Procuradores dizem que é preciso dar essa publicidade para ter o apoio da sociedade. A senhora acha que há pirotecnia?

Eu estou falando em relação ao meu caso. O Moro é um estudioso da Operação Mãos Limpas, e o bom dos seres humanos inteligentes e competentes é que eles são capazes de aprender com as experiências pretéritas. Tem muita articulação política, inclusive nesse momento no campo do centrão, para inviabilizar a Lava-Jato. Do outro lado, igualmente, pessoas que têm como objetivo criar todos os meios para desfazer.

Essa é a sua terceira tentativa de chegar à Presidência. Agora vai?

Parece até aquela música: “tem fé que já é, põe fé que já é, agora vai”. É o que a música diz.

A senhora diz que poderia ser governadora, senadora e insiste em ser candidata a presidente. A senhora acha que está mais fácil desta vez?

Mais fácil não. Com oito segundos? Alguns adversários com mais de meio bilhão e eu com 10 milhões para fazer campanha de deputado estadual, federal, governador, senador, presidente...

Ciro Gomes (PDT)
por Catarina Alencastro, Fernanda Krakovics e Maiá Menezes

O candidato do PDT à Presidência, Ciro Gomes - Leo Martins / Agência O Globo

Isolado pelo PT na negociação de alianças partidárias, o candidato do PDT à Presidência da República, Ciro Gomes , diz rejeitar o papel de vítima. “Na política não cabe mimimi, choradeira. Guerra é guerra”, afirma em entrevista ao GLOBO.

Ciro ataca a cúpula do PT, que está “pouco se lixando para a sorte da nação”, mas defende o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva da condenação no processo do tríplex no Guarujá (SP). Para ele, a sentença do juiz Sergio Moro é “inconsistente”.

Embora esteja em visível esforço para combater a fama de pavio curto, o pedetista diz que candidato a presidente não tem que mostrar temperamento de “ameba”. E provoca seu concorrente do PSDB, Geraldo Alckmin: “Se não, vai ser chamado de picolé de chuchu”.

Ele diz ser factível sua proposta de tirar 63 milhões de devedores do SPC: “Não tenho vocação para ser populista”.

O senhor fez sucessivos ataques ao PT e depois divulgou um artigo dizendo que o partido não é seu inimigo e que Lula foi um bom presidente para muitos. Aonde o senhor quer chegar?

A cúpula do PT é simplesmente desastrada, não tem escrúpulo de nenhuma natureza, está pouco se lixando para a sorte da nação brasileira. Porém, isso não transforma o PT em meu inimigo, porque a cúpula do PT é uma coisa. Por exemplo, eu apoio o PT no Piauí, com o Wellington Dias.

Parece uma estratégia para tentar se descolar do desgaste do PT e do Lula, de quem foi ministro, e, ao mesmo tempo, conquistar parte desse eleitorado.

Você está preconceituosamente querendo me olhar com esse filtro de que eu sou um maquinador. O Lula aumentou o salário mínimo, quando eu fui ministro dele, com muita honra; expandiu o crédito; criou uma rede de proteção social que baniu a fome, que está de volta com o Temer. Agora, o Lula loteou a Petrobras. O Palocci é réu confesso, o Guido Mantega está envolvido com dinheiro em conta em paraíso fiscal. E eu faço o quê? Eu não sou petista, o petismo é que esquece isso, bota para debaixo do tapete, inventa uma conspiração.

O senhor tem feito críticas a supostos excessos do Judiciário. Considera que Lula é inocente?

Eu acho a sentença do Moro injusta.

Por quê?

Porque é inconsistente. No Brasil, eu não conheço nenhum julgamento em que alguém tenha sido condenado por conjunto indiciário, como o Lula foi. No Brasil se exige prova.

O TSE pretende julgar logo o registro de Lula, e Fernando Haddad deve assumir a candidatura.

A mim me surpreende como o Haddad e a Manuela (D’Ávila) se prestam a esse tipo de serviço. Eu falo isso porque eu mesmo fui pressionadíssimo a fazer esse papelão (ser vice do Lula). Ora, se isso der certo, não dá certo.

Por quê?

Porque nasce daí um presidente desse tamaninho (fazendo gesto com os dedos). Um presidente que parece que vai precisar ir para Curitiba consultar como fazer as confusões e as complexas questões nacionais.

O senhor acabou sendo vítima de um acordo do PT com o PSB que o deixou isolado.

Eu não tenho esse lugar de vítima, sou um velho lutador. Eu tenho escrúpulo, você não vai encontrar uma rasteira (minha) dessa natureza. Na política não cabe mimimi, choradeira. Guerra é guerra. Me escolheram para a guerra nessa fase, eu estou na guerra. Não sou a Marina (Silva), que com todas as suas extraordinárias virtudes, aceitou ser empurrada para a direita. Eu não vou para a direita, vou buscar a liderança do campo progressista de verdade do Brasil.

O senhor já disse que negociou com o centrão porque é candidato a presidente e não a “madre superiora de convento”. O que isso quer dizer?

Eu quero reformar o Brasil, para isso eu preciso ter capacidade de diálogo com diferentes forças. Eu disse para eles na conversa: “Meu programa está aberto para ser discutido com vocês”. Aí vinha reforma trabalhista. Não volto atrás. Revogação do teto (de gastos), não volto atrás. Isso estabelece uma relação para o futuro em que eu lidero, se for o eleito pelo povo, para não ser o que a Dilma foi e o Lula, em certo aspecto, também: testa de ferro desses pilantras que infernizam a vida brasileira. Não deu certo (a aliança com o centrão), mas eu mostrei que tenho capacidade de dialogar e tenho limite de transigência.

O senhor critica a reforma trabalhista. O que vai revogar e o que vai manter?

Atenuar os abusos da Justiça do Trabalho é uma coisa que a minha reforma terá. Trabalho intermitente não é possível ficar como está. Gestante em ambiente insalubre, francamente isso é século 18. Imposto sindical isso não tem nenhum sentido, já conversei com as centrais sindicais. Estou sensível à ideia de trabalhar com eles uma transição. Eles estão me sugerindo, e eu acho razoável, permitir que tenha efeito normativo a convenção coletiva estabelecer a contribuição sindical. E que valha para a categoria inteira.

É possível ser eleito sem contemplar os empresários?

Eu não quero servir a dois senhores. Mas o meu projeto tem o objetivo de conciliar os interesses práticos de quem trabalha com quem produz.

A promessa de limpar o nome de quem está no SPC é factível?

Eu não tenho a menor vocação para ser populista. O Tesouro não vai botar nenhum centavo nisso, é crédito. Banco do Brasil e Caixa Econômica (vão refinanciar). Se os bancos públicos quiserem, eles entram e ganham dinheiro, mediante um pequeno afrouxamento do compulsório. O programa começa com um leilão reverso, quem der o maior desconto entra primeiro. Junto com o Programa Nome Limpo, o cidadão vai receber uma cartilha e vai fazer um rápido treinamento sobre educação financeira. Quem entrar no programa, entra com garantia. Cada cidadão vai ter que arranjar quatro amigos e vão combinar que um suporta a inadimplência do outro, se acontecer.

O senhor tem fama de pavio curto, mas nos últimos dias está parecendo mais tranquilo. Está tentando se controlar?

Dependendo da natureza da provocação eu reajo. Eu tenho que me comportar agora como o futuro presidente do Brasil, que eu quero ser. E o futuro presidente do Brasil não tem que mostrar temperamento de lesma, de ameba. Se não vai ser chamado de picolé de chuchu.

Sua mulher, Giselle Bezerra, tem acompanhado suas agendas. Qual é o papel dela na sua campanha?

Ela é minha companheira, meu amor, trabalha comigo, vive comigo, me aconselha e tal. Pronto. Vai querer que eu repita aquela bobagem? (de que o papel de sua então mulher Patrícia Pillar, na campanha presidencial de 2002, era dormir com ele). Isso é ridículo, foi há 16 anos. Em tempos de Rodoanel, merenda de escola, cunhado recebendo ou não dinheiro, funcionário fantasma. De mim, o que se recupera é um imponderável temperamento e uma bobagem inominável que eu falei.

O senhor disse que é contra a descriminalização das drogas.

Eu não disse que sou contra, eu disse que não sou candidato a guru de costumes. Esse é um assunto tabu para grupos importantes da sociedade brasileira por quem eu tenho muito respeito.

Mas a questão dos costumes, até pelo posicionamento do primeiro colocado nas pesquisas, Jair Bolsonaro, vem balizando os debates.

A esquerda velha criou e está aperfeiçoando o Bolsonaro, porque ela desconhece a vida real brasileira. Você acha que o (Marcelo) Crivella seria prefeito do Rio de Janeiro se não fosse a estreiteza do PSOL?

Por quê?

A pretexto de ser o déspota esclarecido, ultraesquerda, o intransigente, acaba se descomprometendo com a realidade do povo. Por se achar muito mais inteligente do que todo mundo, muito mais moralista, muito mais danadão, resultado: é o Crivella o prefeito, e não o (Marcelo) Freixo. Você acha que o Crivella se elegeria prefeito de Fortaleza alguma vez na vida? Nem a pau, Juvenal. E o Rio de Janeiro, maior concentração de artistas por quilômetro quadrado, de intelectuais, de engenheiros, uma elite exuberantemente linda, criativa e olha a situação de vocês. Isso por causa do gueto da Zona Sul. Eu vou para as reuniões aqui (no Rio) e as pessoas não querem falar de emprego, de salário. Completamente voando da agenda do povo, querem exigir de mim compromisso de descriminalização de droga, porque “eu gosto de fumar minha maconha’. Nenhum problema, meu patrão, mas eu quero ser presidente do Brasil, e não guru de costumes.

Sua vice, Kátia Abreu, disse ser contra o aborto, inclusive de anencéfalo. Concorda?

Tem muita coisa que não estamos de acordo, por isso a convidei. Eu advogo um projeto de centro-esquerda e ela tem visão diferente da minha em muitos assuntos. Por isso ela é muito útil para nós.

Ela também defende facilitação do porte de armas no campo e o seu programa de governo é contrário.

Eu não refleti especificamente sobre questão rural e urbana. Confesso que quando escrevi aquilo estava pensando mais na questão urbana. Ela me sensibilizou para essa questão, dado que a polícia não tem condição de ostensividade no campo. Mas ainda acho que essa tarefa de garantir a incolumidade das pessoas e do patrimônio é tarefa do Estado e não do exercício individual.

Fernando Haddad (PT)
por Sérgio Roxo e Flávio Freire

Fernando Haddad, ex-prefeito de São Paulo - Edilson Dantas/Agência O Globo

Após entrevista ao GLOBO, Fernando Haddad posou para foto em frente à janela do comitê da campanha presidencial do PT, coberta por uma persiana em tiras verticais. A luz do sol invadia o ambiente, e ele fez uma observação que, em tom de brincadeira, revela sua disposição. "Dependendo do ângulo, parece que estou no Alvorada", disse, em referência à residência oficial dos presidentes. Ele repetiu que manter a candidatura de Lula não era capricho, mas compromisso político. Reconheceu que, se o PT chegar ao poder, seria difícil governar, mas aposta numa reformulação partidária já a partir do ano que vem.

Como Lula está preso e inelegível por força da lei da Ficha Limpa, Haddad, então formalizado como vice, foi o convidado do PT para a série de entrevistas com presidenciáveis. No dia 11 de setembro, ele foi oficializado candidato à Presidência da coligação.

Qual autocrítica o senhor faz do envolvimento de petistas em casos de corrupção?

Eu lastimo o envolvimento geral e irrestrito de pessoas com a corrupção.

Sim, mas no caso do PT?

Veja bem, toda agremiação, qualquer que seja, igreja, família, partido, pode ter condutas desviantes, e é sempre lastimável quando alguém comete um erro. Defendo que a pessoa pague na proporção da lesividade de seu crime. Quando é na sua casa, é mais difícil. Mas é importante frisar que nosso sistema de financiamento eleitoral estava todo comprometido, então PSDB e PT, que governaram esse pais numa situação de normalidade nos últimos 20 anos, deveriam ter tomado providência para blindar o sistema politico de situações terríveis. Eu lamento que não tenham sido tomada essas providências por esses partidos.

Sua administração na prefeitura de São Paulo foi acusada por um delator de ter criado uma empresa de fachada para administrar o Theatro Municipal. O denunciante disse que teve aval do senhor para criar essa empresa. Qual sua resposta para esta questão?

Esse caso de corrupção foi desbaratado pela minha administração. Quem identificou os membros da quadrilha foi o meu controlador-geral. Nós interviemos na organização social por ação judicial e bloqueamos o patrimônio dessas pessoas. E obviamente eu tenho problemas com o promotor Marcelo Millani. Representei contra ele por outras razões.

Como o senhor vê essa crítica do PT, de que uma eventual chapa Haddad e Manuela é muito acadêmica e fala pouco com os mais pobres?

O que fala com as classes mais pobres é o que você fez na vida. A atuação do Lula dispensa comentário. Qualquer que seja o desfecho, a Manuela tem uma ação incrível em relação às causas sociais. Eu penso que, como ministro e como prefeito, sempre demarquei aquilo que beneficia as camadas populares. Penso que o Lula estará bem acompanhado.

O que se ouve é que o senhor e a Manuela não teriam poder de atuação nessas classes porque o presidente Lula sabe, por exemplo, falar sobre o preço do botijão de gás. Aliás, o senhor sabe o preço do botijão de gás?

Sei quanto custa porque ficou famoso o preço do botijão (sem falar o valor).

O programa de governo do PT critica a situação econômica, mas quando a Dilma saiu o país já tinha 11,4 milhões de desempregados. Essa crise não é dividida entre o PT e o governo de Michel Temer?

Entendo que, a partir de 2013, sobrecarregamos o orçamento com uma pauta grande demais: Simples, desonerações, energia, combustíveis. Isso era sustentável no médio e longo prazo? Não. Era necessário fazer um ajuste, que teria um custo, mas um custo muito menor que veio a ter.

Existe uma certa desilusão das pessoas com a política. O senhor não acha que essa candidatura do PT com três nomes na chapa pode causar ainda mais confusão?

Estamos vivendo uma situação incomum. Temos um candidato que lidera as pesquisas, mas está preso sem provas. Se ele [Lula] tivesse sido condenado com provas, estaríamos discutindo em outras circunstâncias. Nossa posição é que não abriríamos mão de nenhum recurso para levar a candidatura Lula até as últimas consequências, denunciando o casuísmo. Isso faz com que haja essa situação (confusa), dentro e fora do PT, dado a um ineditismo que exige soluções também novas.

Mas se esse cenário se estender até 20 dias antes da eleição, prazo final para Lula poder ser substituído, o processo político não fica ainda mais desgastante?

Primeiro, temos um compromisso moral com o Lula. Segundo, todas as pesquisas que fazemos revelam o sinal claro de que o eleitor não quer abrir mão do Lula. Se a Justiça vai tomar uma decisão casuística, a decisão é dela, não pode ser nossa. Manter a candidatura dele não é um capricho, é um posicionamento político.

Pode parecer que a campanha servirá para a defesa de Lula.

Não, nós fomos os primeiros a apresentar um programa de governo. E fomos muito transparentes no nosso propósito.

Por que a proposta de limitar a atuação do STF foi retirada do programa de governo do PT?

Porque não era consenso entre os juristas essa transformação do STF em Corte constitucional, e não era uma limitação, mas uma desoneração. Na verdade, elevaríamos o STF a uma categoria superior, deixando de julgar casos específicos e atuando em teses.

Se consideramos potenciais aliados do mesmo campo político (PT, PCdoB, PSB e PDT), um eventual governo do PT teria, num cenário muito otimista, um terço da Câmara como base. Como governar?

Concordo com o pressuposto da pergunta, com esse quadro partidário é muito difícil compor maioria. Acredito que teremos uma reformulação partidária a partir do ano que vem. Temos que ter uma agenda para passar reformas importantes, sem preocupação com composição de base de sustentação de governo.

O senhor acha viável compor uma base com partidos que apoiaram o impeachment como o MDB e o PSD?

Não acredito que todos esses partidos vão sobreviver às eleições.

O senhor está confortável de chegar em Alagoas e fazer campanha ao lado do Renan?

Do governador?

Ou o pai, o ex-presidente do Senado?

Não sou partidário de fazer acordo de bastidor, de gabinete. Onde houver coligação e, dependendo das circunstâncias, o presidente Lula rodará o país procurando ampliar o leque de alianças na direção de quem concordar com o plano de governo dele.

O senhor costuma dizer que há necessidade de mais controle externo no setor público. Pode explicar?

Temos um Estado que se autocontrola, que não é padrão no mundo. A polícia controla polícia, desembargador controla desembargador. No mundo desenvolvido há órgãos de controle compostos por pessoas de outras corporações e são objeto de fiscalização. A composição do CNJ, por exemplo, precisa mudar, para que o Judiciário tenha tratamento de controle externo mais efetivo.

O senhor já disse que Geraldo Alckmin é honesto. Após denúncias da Dersa, continua pensando assim?

Eu fui um pouco mais fundo. Nós que temos uma atuação política precisamos ter a dignidade de defender a honra de um adversário. Estava indignado porque nenhum amigo tucano do Lula veio a público defender a honra dele. Trabalhei quatro anos com o Alckmin nunca ouvi comentário maldoso sobre ele.

Como lidar com o Jair Bolsonaro, adversário em segundo lugar nas pesquisas?

Tentando compreender o eleitor, o que está levando um contingente de brasileiros a acreditar nessa proposta que é inconsistente, até porque são poucas e controversas