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Por Ivan Martínez-Vargas — São Paulo


Palacete do Carmo, a um quarteirão da Sé, no centro de São Paulo, é um dos 82 imóveis abandonados na região — Foto: Edilson Dantas/Agência O Globo
Palacete do Carmo, a um quarteirão da Sé, no centro de São Paulo, é um dos 82 imóveis abandonados na região — Foto: Edilson Dantas/Agência O Globo

Imortalizada em música de Caetano Veloso, a esquina do cruzamento entre as avenidas Ipiranga e São João, no centro de São Paulo, abriga o Edifício Independência, famoso por ser o endereço do tradicional Bar Brahma e que está há anos com 13 de seus 15 andares completamente vazios e em estado de degradação. Há janelas quebradas, pichações e uma placa de aluga-se.

O caso do Independência é icônico, mas está longe de ser exceção no centro expandido de São Paulo. Até 2020, foram notificados pela prefeitura ao menos 666 imóveis no centro, 84% deles edificações vazias ou abandonadas. São pelo menos 82 prédios às moscas, segundo informações compiladas pela arquiteta Ana Gabriela Akaishi, que pesquisou o tema em seu doutorado na USP.

O plano diretor de São Paulo, de 2014, já previa o chamado IPTU Progressivo. A lei prevê cinco alíquotas (a mais alta, de 8%). Pagam o imposto progressivo hoje 1.743 imóveis na cidade toda, de acordo com a gestão de Ricardo Nunes (MDB). Desses, 181 já pagam a última alíquota e estão, portanto, há no mínimo cinco anos vazios. É o caso do Independência, que é de propriedade da tradicional Imobiliária Savoy.

Edifício Independência, na esquina das avenidas São João e Ipiranga, está com 13 andares abandonados — Foto: Edilson Dantas/Agência O Globo
Edifício Independência, na esquina das avenidas São João e Ipiranga, está com 13 andares abandonados — Foto: Edilson Dantas/Agência O Globo

Enquanto esses imóveis permanecem desocupados, Ao mesmo tempo, a população sem-teto na cidade chegou a 31 mil em 2021, 31% a mais do que pré-pandemia.

Embora a lei permita que a prefeitura realize desapropriações de imóveis desocupados por mais de cinco anos desde 2019 e os destine a projetos de habitação social, a norma não tem sido cumprida. Isso porque o pagamento aos proprietários deve ser feito por meio da emissão de títulos da dívida pública do município e, segundo a prefeitura, uma resolução do Senado de 2001 proíbe a emissão desses títulos.

Para Fernando Túlio Franco, presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil em São Paulo, a gestão municipal teria alternativas para fazer as desapropriações.

— Houve uma redução drástica de imóveis notificados nos últimos anos. Além disso, a prefeitura poderia trabalhar na lógica do consórcio. Chamar investidores interessados em imóveis desocupados, propõem uma contrapartida pública e realiza o projeto social, por exemplo — diz.

A lei municipal que dá incentivos para o retrofit de imóveis, segundo ele, não tem incentivos adicionais caso o imóvel tenha função social, por exemplo, o que pode implicar na expulsão de população vulnerável da região.

— É um território em disputa, mas sem uma definição clara do poder público sobre o que se quer para a região. Há quem defenda que a ocupação deve ser por jovens de classe média, mas a população de baixa renda que mora no centro vive em geral em condição precária —explica Ana Gabriela.

Residência do coronel Joaquim Franco de Mello localizado na Av. Paulista , 1919, está vazio há anos. O palacete, que atualmente pertence ao Estado de São Paulo é o único resquício remanescente da primeira fase residencial da avenida Paulista e vai receber o Museu da Gastronomia; leilão de concessão do espaço deve ocorrer ainda neste ano, segundo Secretaria da Cultura — Foto: Edilson Dantas
Residência do coronel Joaquim Franco de Mello localizado na Av. Paulista , 1919, está vazio há anos. O palacete, que atualmente pertence ao Estado de São Paulo é o único resquício remanescente da primeira fase residencial da avenida Paulista e vai receber o Museu da Gastronomia; leilão de concessão do espaço deve ocorrer ainda neste ano, segundo Secretaria da Cultura — Foto: Edilson Dantas

Na lista dos maiores imóveis abandonados, estão prédios inteiros de investidores, mas também de instituições religiosas ou de espólios de pessoas já falecidas e cujas posses estão em litígios judiciais.

A poucos metros da Rua da Consolação, a Imobiliária Savoy tem mais um edifício abandonado. O prédio, de 11 andares e de 6.400 mil metros de área construída, chegou a ser ocupado por movimentos sociais expulsos definitivamente do local em 2018. Desde então, permanece vazio, protegido por seguranças. Quem se interessar por alugar o imóvel inteiro terá de desembolsar R$ 90 mil mensais e mais R$ 412 mil de IPTU. Procurada, a empresa não respondeu.

— A estrategia da Savoy com esses imóveis não é clara. A empresa é uma das maiores devedoras de IPTU — afirma Ana Gabriela.

Entre os prédios públicos abandonados, está uma série de 18 imóveis doados pelo INSS à prefeitura desde 2015, como forma de pagamento de uma dívida.

Casa Amarela Afroguarany é exceção no padrão de abandono

A maior parte dos edifícios e terrenos doados pelo INSS está no centro e seria destinada a projetos de habitação social, mas até hoje quase todos estão vazios. Uma exceção é a Casa Amarela Afroguarany, na Rua da Consolação, um casarão tombado que é ocupado por um coletivo de artistas. A prefeitura já tentou reaver o imóvel, mas afirma que o processo de reintegração “segue suspenso”.

Interior do palacete que foi residência do coronel Joaquim Franco de Mello, na Av. Paulista, 1919 — Foto: Edilson Dantas
Interior do palacete que foi residência do coronel Joaquim Franco de Mello, na Av. Paulista, 1919 — Foto: Edilson Dantas

Entre os imóveis desocupados icônicos, o Casarão Franco de Mello, na Avenida Paulista, é um dos poucos que já tem destino certo. Construído em 1905 e tombado em 1992, o casarão foi se degradando nas últimas décadas por falta de manutenção e abandono do imóvel.

O imóvel foi desapropriado e o governo paulista assumiu o casarão em 2019. O local, que já recebeu reparos emergenciais para evitar incêndios e desabamentos, vai receber o Museu da Gastronomia. O espaço será concedido à iniciativa privada, que vai revitalizar o casarão e implementar o museu.

— O prazo de concessão será de 35 anos. Já fizemos os estudos do projeto, que vai a audiência pública em julho. Até setembro, publicaremos o edital do leilão, que será feito ainda neste ano — diz Sérgio Sá Leitão, secretário estadual de Cultura.

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