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Por Arthur Leal

Falta de água potável, de peixes, de grãos. Problemas que num passado recente poderiam parecer inimagináveis em um paraíso natural preservado, cultivado e habitado por povos originários, hoje figuram no topo das demandas dos indígenas que habitam o território Yanomami, em Roraima, junto à necessidade urgente de acesso básico à saúde – questões que andam juntas, sobretudo neste caso. O panorama é descrito pelas lideranças da Central Única das Favelas (Cufa), organização que tem voltado todas as suas atenções nos últimos dias à crise humanitária à qual estão expostas essas aldeias, e que deu início a uma campanha, junto à Frente Nacional Antirracista, para levar água e saneamento a essas pessoas e, também, para arrecadar R$ 3 milhões que podem ajudar a viabilizar a reforma e construção de polos de saúde na região isolada. Hoje, as unidades se encontram em condições precárias.

O ativista e empresário Celso Athayde, fundador da Cufa, conta que ele e a equipe têm procurado saber junto à população indígena, em Roraima, quais são as principais urgências, no objetivo de garantir maior assertividade na ajuda, para além das cestas básicas. Ele conta que a água está entre elas. A ação de garimpeiros ilegais, que despeja mercúrio e metais pesados nos rios, assim como a disseminação de verminoses por conta da crise sanitária, são fatores que têm tornado recursos os naturais insalubres – e até nocivos. A mortandade e toxicidade de peixes também prejudica a tradicional subsistência desses povos com a pesca. Muitos, por exemplo, têm pedido sardinha para se alimentar.

– Um dos maiores problemas, segundo eles, diz respeito à água potável e tratamento de água, além da necessidade de atendimento médico. Então, ficamos de conseguir um parceiro para buscar soluções para eles, e conseguimos o parceiro estratégico Água Camelo, especialistas em levar água potável a quem precisa, e que ja tem trabalho em favelas e comunidades indígenas pelo país. É importante mostrarmos, também, que é possível fazer isso com a ajuda de parceiros – diz o ativista; o projeto deve começar a operar em breve.

O Água Camelo é uma start-up que já ajudou, através de parceria com empresas, a levar água potável e saneamento básico a 8.340 pessoas, entre indígenas e moradores de favelas, de 9 estados do país. Athayde afirma que a iniciativa junto à Cufa em Roraima será feita gratuitamente. Em parceria com a Ambev, por exemplo, o projeto levou água tratada aos indígenas Yawanawá, na Amazônia. Segundo a empresa, por lá foram instalados 150 kits Camelo, que servem como purificadores de água, e 8 pontos de coleta e distribuição, beneficiando 1.700 pessoas de 13 aldeias.

Água Camelo: kit emergencial já foi usado e obteve sucesso em tribos indígenas do Amazonas — Foto: Divulgação
Água Camelo: kit emergencial já foi usado e obteve sucesso em tribos indígenas do Amazonas — Foto: Divulgação

– Nós possibilitamos o acesso a uma fonte segura de água tratada para populações em condições de vulnerabilidade social. O kit Camelo é uma mochila, um filtro de água portátil, com suporte de parede, onde é possível fazer todo o tratamento da questão das verminoses, dos protozoários e das bactérias, que são os maiores causadores de doenças de veiculação hídrica. Para tratar, inclusive, essa questão da diarréia, que é um dos grandes causadores da desnutrição – explica Rodrigo Belli, à frente do projeto. – E esse é um produto emergencial. A gente tem outros produtos em que a gente faz esse tratamento de forma mais comunitária, mas a gente entenendeu que nesse momento, nessa forma de chegar junto para cuidar dessa crise humanitária, seria melhor chegar com esses primeiros produtos e fazer um mapeamento por solucões mais perenes.

Celso Athayde conta que se sensibilizou ainda mais quando visitou o principal polo de saúde em território Yanomami, que atende – ou deveria atender – pelo menos 200 aldeias. Segundo ele, o cenário é desastroso e o local é muito distante da maioria das aldeias

– Fomos visitar unidades hospitalares e os tratamentos aos quais eles são submetidos são pura selvageria. As pessoas demoram dias para chegar lá. Às vezes, já chegam quase mortos. Fora que não há cuidado. O indígena vem de uma aldeia com malária, é colocado no mesmo lugar que os outros, acaba passando e espalhando para outras aldeias. Todo mundo acaba doente. E foi no posto médico que voltamos a ouvir demandas sobre água tratada, inclusive na unidade. Entendemos que uma reforma e construção desses postos seria essencial para salvar vidas e dar dignidade e também aproveitar para trazer outras agendas para além das cestas básicas, que também são muito importantes. Outras questões também fizeram com que essas pessoas chegassem a esse ponto, de passar forme. A falta de tratamento médico é uma delas. Se houvesse tratamento in loco, não só na capital (as aldeias ficam a pelo menos 1 hora de avião de Boa Vista e o custo para deslocamento é alto), isso evitaria muitas mortes e esses povos não chegariam às condições que chegaram.

Ativistas da Cufa e da FNA durante incursão ao território Yanomami — Foto: Divulgação
Ativistas da Cufa e da FNA durante incursão ao território Yanomami — Foto: Divulgação

Até agora, a Cufa já entregou 60 toneladas de comida aos povos indígenas, além de 15 toneladas doadas pela rede de supermercados Assaí com a alimentação específica da dieta de Indígenas mais isolados. Outras 160 toneladas arrecadadas em todo o Brasil estão indo para Roraima em voos. Athayde explica que alguns dos ianomâmis se alimentam de itens que não fazem parte da cesta básica comum; daí, a importância de se fazer uma "triagem".

– Quando você vai observar como vivem esses grupos indígenas, você percebe que os ianomâmis sequer comem feijão, óleo, então os hábitos são diferentes do comportamento social urbano. Eles pedem sardinha, porque estão com dificuldade de pescar por conta do mercúrio do garimpo. Pedem farinhas: de banana, tapioca de macaxeira. Então, fizemos essa parceria com o Assaí Atacadista, em que eles estão fazendo as cestas básicas com os produtos "recortados" para a demanda deles. São raízes em geral, goma de tapioca... além disso pede muito, também, redes, mosquiteiros, lençóis, panelas e medicamentos – conta. – Essa campana não tem a pretensão de salvar de uma vez por todas os povos indígenas, mas, sim, de chamar atenção para o fato de que é possível fazer, principalmente entendendo as necessidades dessas pessoas.

Athayde conclui, reforçando que o problema não surgiu "ontem", e que muitas das demandas são antigas. Mas argumente, também, que o cenário só piorou nos últimos quatro anos. Muito contestado na gestão da pandemia e também na assistência aos povos indígenas, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) é duramente criticado, não só por ativistas ambientais e indigenistas, como também pelo atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e pelo Ministério Público Federal (MPF), que falam em responsabilização por um genocídio.

– Nos últimos anos muitas agendas sociais, culturais e indígenas, e a própria questão do meio ambiente, não eram reconhecidas pelo governo anterior. Mas nunca achei que foi um governo incoerente, porque nunca disseram que fariam diferente. Seria incoerente se fosse um governo que entendesse a gravidade, mas não fizesse nada – afirma. – O que conversei e ouvi de prefeito, governador, moradores, movimentos sociais e indígenas é que, ouvindo essas necessidades, é preciso proteção e preservação da cultura desses povos, a demarcação é fundamental, e ao mesmo tempo é preciso acabar com a entrada de grileiros, garimpeiros e exploradores ilegais. Senão, estaremos numa ciranda sem fim.

Arrecadação

A mobilização para a arrecadação da campanha "Favelas com Yanomamis" acontecerá entre os dias 27 de janeiro e 27 de fevereiro, com a previsão da pedra fundamental ser lançada no dia 1º de março. As unidades de saúde serão reformadas e construídas mesmo que o valor total de R$ 3 milhões não seja atingido – é um compromisso da Cufa. Os canais para doações para o novo programa são o PIX [email protected], a vaquinha e o site. As instituições alertam para a ação de golpistas que estão divulgando contas e endereços falsos para arrecadação de dinheiro em nome da campanha.

– Quando você olha para o lado e vê que o território Yanomami é do tamanho de um país, do tamanho de Portugal, você vê que, de fato, o desafio é muito grande. Se o poder público não consegue controlar uma favela como a Rocinha, o Complexo do Alemão, fico imaginando como um território com tanta riqueza e cuja dimensão é tão grande, é um desafio.

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