Mais dois trabalhadores em situação análoga à escravidão foram resgatados durante a operação de desintrusão que mira invasores da terra índigenas, no Pará, na última sexta-feira. A dupla se encontrava em propriedades diferentes dentro do território da TI Apyterewa.
As identidades dos donos das propriedadades são desconhecidas. Na primeira delas, o trabalhador encontrado "dormia em um depósito onde havia várias coisas guardadas, inclusive carrapaticida, um veneno fortíssimo, que ao respingar em uma pessoa queima", descreve o Ministério do Trabalho e Emprego.
O local onde o homem fazia refeições também era precário, com chão de barro e madeiras quebradas. Apesar de existir um banheiro no espaço, ele estava quebrado, sem água. Com isso, o homem era obrigado a tomar banho em um córrego e a fazer suas necessidades no mato. Foi deixada uma notificação no local para ser entregue ao chefe do trabalhador.
Operação encontra trabalhadores em condições precárias em TI no Pará
"Na segunda propriedade, foi encontrado um trabalhador em um barraco de madeira praticamente destruído e de chão batido", diz o ministério. A cozinha é descrita como precária, e o trabalhador era obrigado a tomar banho em um córrego, também usado pelo gado. De acordo com as autoridades, um pagamento de R$ 100 havia sido prometido ao homem, mas não foi feito até o momento. Uma notificação também foi deixada para ser entregue ao dono do local.
Na última quarta-feira, a equipe do Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM) inspecionava a fazenda Sol Nascente, do pecuarista Antônio Borges Belfort, quando encontrou um trabalhador em condições análogas à escravidão.
De acordo com o auditor-fiscal Magno Pimenta Riga, o trabalhador fazia atividade de plantio de produtos alimentícios para a propriedade, e já estava há 45 dias no local sem receber salário. Depois de apurar os valores relativos à verba rescisória, o empregador foi instigado pela equipe a realizar o pagamento. Ainda na quarta-feira, Belfort transferiu R$ 1 mil para a vítima, que foi encaminhada para um hotel na região.
— O [restante] do pagamento está previsto para a tarde de hoje. Nós vamos emitir uma guia de seguro desemprego, que todo trabalhador resgatado tem direito. Ele vai receber três parcelas de um salário mínimo, pago pelo Estado. Faremos os autos de infração cabíveis, inclusive de trabalho escravo. Um relatório será encaminhado para a Polícia Federal, assim como o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Trabalho, que irá apurar a responsabilidade do empregador.
O GLOBO apurou que mais de 300 servidores federais, 93 viaturas e dois helicópteros vão dar apoio à operação, que mira grileiros, desmatadores, pecuaristas e garimpeiros ilegais. A Secretaria-Geral da Presidência da República, o Ministério dos Povos Indígenas, o Comando Militar do Norte e o Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam) também participam da ação.
Entenda
Forças de segurança deflagraram nesta segunda-feira a maior operação de desintrusão de invasores de terras indígenas no Pará. Cerca de 150 agentes da Força Nacional e outros 60 policiais federais darão início à primeira etapa da ação que visa retirar da TI Apyterewa, localizada no município de São Félix do Xingu, aproximadamente 2 mil famílias que vivem ilegamente na área, a mais devastada entre as terras indígenas nos últimos quatro anos.
A Secretaria-Geral da Presidência da República, o Ministério dos Povos Indígenas, o Comando Militar do Norte e o Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam) também participam da ação.
Território do povo Parakanã, a Terra Indígena Apyterewa perdeu nesse período 324 km² de floresta, maior que a área de Fortaleza, algo em torno de 32.400 campos de futebol. É a maior devastação de uma área de floresta derrubada na Amazônia entre as terras indígenas, de acordo com o Imazon. As áreas desmatadas na TI Apyterewa vêm sendo ocupadas sistematicamente pela criação de gado ilegal. Homologada em 2007, a Apyterewa conta com uma população de 729 pessoas distribuídas em 20 aldeias.
Um comunicado foi entregue aos invasores para que desocupassem “imediatamente” a área de maneira voluntária levando consigo seus pertences e animais antes de a operação ter início. O panfleto cita o artigo 231 da Constituição Federal, sobre a demarcação, proteção e respeito aos bens das terras ocupadas pelos povos indígenas como obrigação da União.
Só na terra Apyterewa há cerca de 70 mil cabeças de gado, já embargados pelo Ibama, com publicação de edital de notificação determinando a retirada dos animais criados ilegalmente na área. O governo promete que haverá monitoramento constante para evitar o retorno de posseiros e invasores.
De acordo com a Secretaria-Geral da Presidência, a desintrusão para reintegração de posse das TIs ocorrerá de "forma negociada com as famílias não indígenas que vivem lá e com assistência do Governo Federal como transporte, doação de cesta básica, cadastro para verificar se as famílias têm direito a Programa de Reforma Agrária e orientação para inscrição no Cadastro Único para as famílias que ainda não façam parte".
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