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A distância de 2,6 mil quilômetros que separa a capital mineira, Belo Horizonte, da cidade de Araruna, no agreste da Paraíba, não é nada para o coração de aficionados. Aos 67 anos, os amigos Paulo Roberto Azevedo e José Marzano não pensaram duas vezes para dar um “trato” em suas motocicletas e pegar a estrada. Foram dias intermináveis varrendo a paisagem das estradas até o Nordeste de olho em um sinal do céu: os dois queriam ver o anel de fogo, que não dava o ar da graça há quase uma década, da melhor posição possível.

A façanha dos “loucos por eclipse” durou 12 dias. Foram cinco dias para ir e mais cinco para voltar, além da parada para assistir ao raro espetáculo. O combustível da dupla é o amor pela astronomia. O fascínio pela observação de eventos astronômicos e corpos celestes mostrou toda sua potência nos dias que antecederam o eclipse solar anular que pôde ser visto, mais nítido ou menos nítido, de alguns pontos do Brasil.

— Estudo astronomia por conta própria há 30 anos. Agora, aposentado, posso me dedicar mais a essa paixão de observar a galáxia. Antigamente era tudo por livros e fotos analógicas — diz Paulo Roberto.

Levantamento da Quaest, feito a pedido do GLOBO, mostrou que, no dia 14 de outubro, data do fenômeno, as menções nas redes relacionados à astronomia, inclusive eclipse, superaram 284 mil. Número 98% maior do que a média de todo o ano. E em um 2023 com calendário cheio: só de chuvas de meteoros estão previstas 12, fora conjunções planetárias e superluas.

Como o essencial é invisível aos olhos, esse boom já acontece silenciosamente entre astrônomos amadores. Paulo Roberto investiu cerca de R$ 50 mil para montar um observatório celeste em casa, na capital mineira. Lá, ele tem estação meteorológica, seis telescópios e computadores, a maioria dos itens construída do zero por ele. Essa busca pelo desconhecido — ou pouco conhecido — atrai iguais. José Marzano é veterano. Ele vive o que chama de “astroturismo” em toda a sua plenitude.

Paulo Roberto Azevedo montou um observatório do céu em casa — Foto: Douglas Magno
Paulo Roberto Azevedo montou um observatório do céu em casa — Foto: Douglas Magno

Ele esteve no Deserto do Atacama, no Chile, pelo privilégio de observar o céu de lá à noite. Se não viaja, pode ser na esquina de casa. Antes da pandemia, ele costumava levar seu telescópio para a Praça Nilo Peçanha, em Belo Horizonte, para compartilhar a alegria de flagrar momentos únicos do universo. Ele conta que adora ver o olhar emocionado de crianças e idosos ao dividir a “espiadinha” no equipamento:

— Tem gente que não acredita, outros choram porque sabem que existem planetas e estrelas, mas dizem que o sentimento de imensidão ao vê-los mais de perto é indescritível — conta o mineiro, que, entre outros momentos, repartiu o privilégio de ver a Lua se alinhar com Saturno.

No universo da astronomia, o termo “amador” não é sinônimo de quem sabe pouco, mas sim da pessoa que adquiriu conhecimento por outros meios que não o acadêmico, independente da idade.

Ciência em alta nas redes

A atividade de pesquisa em astronomia no Brasil teve início com a criação do Observatório Nacional (ON), por decreto de D. Pedro I, em 15 de outubro de 1827, no Rio. Desde 1994, a Agência Espacial Brasileira (AEB) coordena o programa espacial nacional, que inclui o desenvolvimento de tecnologias de veículos lançadores e de satélites. Hoje, mais de 70 universidades e institutos do país contemplam o ensino dos astros.

A Sociedade Astronômica Brasileira (SAB) tem 780 sócios ativos, de integrantes com mestrado até amadores. Apesar de cada vez surgirem mais mulheres interessadas pelo tema, elas ainda são minoria: representam 29% do nível efetivo e apenas 15% do amador. Presidente da SAB, Helio J. Rocha-Pinto atribui a crescente curiosidade de brasileiros pelo céu à divulgação da ciência nas redes:

— Para o público mais leigo, o que cativa são as imagens. Creio que há uma grande contribuição da disponibilidade de informações na internet, principalmente Instagram e TikTok .

A influência desse ambiente é decisivo para histórias como a da alagoana Nicole Oliveira, de 10 anos, que já deixou sua marca no planeta ao detectar 54 asteroides. Três deles subiram para o status de provisórios e logo poderão ser nomeados pela astrônoma mirim. No dia do eclipse, Nicolinha estava na Paraíba para o 23º Encontro Nacional de Astronomia. Ela viu o anel de fogo pela primeira vez.

Nicolinha, de 10 anos, conta que chorou na hora do eclipse — Foto: Arquivo pessoal
Nicolinha, de 10 anos, conta que chorou na hora do eclipse — Foto: Arquivo pessoal

— Eu chorei. Trabalho com astronomia por amor — relata Nicolinha, que criou um clube de ciência por onde já passaram mais de 300 crianças.

Absolutamente leigo, o pernambucano Rodrigo Moura, de 30 anos, foi seduzido pelos mistérios do universo e, antes do evento, foi até Caruaru comprar 15 lentes de soldador para proteger a visão dos raios solares. Ele reuniu amigos em uma área a céu aberto para um “convescote” com o eclipse, em Toritama, onde mora.

Rodrigo Moura, de 30 anos, reuniu os amigos em Toritama (PE) para ver o eclipse — Foto: Arquivo pessoal
Rodrigo Moura, de 30 anos, reuniu os amigos em Toritama (PE) para ver o eclipse — Foto: Arquivo pessoal

—Minha mãe contava que quando ela era criança existiam mitos sobre os eclipses. Grávidas não podiam olhar, e quem desse uma simples espiada precisava ver o fenômeno completo para não atrair desgraças. Hoje, apreciar o eclipse foi um tempo para refletir sobre como o universo é belo e como a vida é feita de ciclos. Me questionei onde vou estar no próximo eclipse. Será que reunido com meus amigos? — filosofa Rodrigo, deixando a resposta para os astros.

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