Após um motoboy negro ser algemado e preso ao denunciar ter sido golpeado com uma faca por um idoso de pele branca, em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, a Educafro Brasil afirmou ao GLOBO que planeja mover uma ação civil pública contra o estado. Segundo a entidade, Everton Henrique Goandete da Silva “foi vítima de uma tentativa de homicídio”, e “em vez de ser tratado como vítima, foi tratado como suspeito”.
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A iniciativa da entidade prevê três ações:
- Ação civil pública, para responsabilizar o estado do Rio Grande do Sul pelas violações de direitos sofridas pelo motoboy.
- Obrigações de fazer, para exigir que o estado implemente políticas públicas que previnam incidentes semelhantes
- Política pública de segurança antirracista, para propor ao estado que seja alocado um valor significativo, estimado pela entidade em R$ 100 milhões, para desenvolver e implementar uma política de segurança pública adequada.
A defesa de Everton Henrique Goandete da Silva relatou ao GLOBO que o agressor teria se incomodado com um suposto barulho dos motoboys na rua, em frente ao prédio em que ele mora. Segundo o advogado Ramiro Goulart, conselheiro estadual de Direitos Humanos no Rio Grande do Sul, o idoso, identificado como Sergio Camargo, desceu para tirar satisfação com os entregadores já com a faca em mãos, momento em que o motoboy é ferido no pescoço.
— Mais de cinco testemunhas alegaram que o caso começou após o Sergio se incomodar com a presença dos motoboys, que estariam ouvindo música. Não há razão específica contra o Éverton, o agressor estava desequilibrado e a vítima tentou tranquilizá-lo, mas foi atacada e ainda presa de forma agressiva — afirma o advogado.
Assim como as testemunhas que presenciaram o ocorrido e filmaram a abordagem policial, Goulart caracterizou a ação dos agentes da Brigada Militar do estado como "racista" ao relatar que houve uma “diferença brutal” na forma de tratamento da vítima perante o agressor. Éverton vai prestar depoimento nesta segunda-feira na delegacia da Polícia Civil de Porto Alegre sobre a tentativa de homicídio que sofreu.
A reportagem não conseguiu localizar a defesa de Sergio Camargo. Ainda não há informações sobre quando o agressor será ouvido.
Vídeo mostra a abordagem
Motoboy negro é preso após ser ferido com faca por homem branco em Porto Alegre
A ocorrência foi registrada por testemunhas. Nas imagens, é possível ouvir que o motoboy, identificado como Everton Henrique Goandete da Silva, pedia ao outro homem que “pegasse a faca” na frente dos policiais, que já estavam no local. Segundo Éverton e as testemunhas, o idoso teria tentado esfaqueá-lo momentos antes.
Em seguida, os agentes da Brigada Militar do Rio Grande do Sul tentam conter o motoboy, que rebate a abordagem: “Quem tá errado é ele, então me larga”. A partir deste momento, pelo menos quatro policiais se envolvem na abordagem e iniciam constantes tentativas de imobilização do homem negro, que resiste.
Enquanto uma das agentes tenta algemar o motoboy, testemunhas gritam dizem aos policiais que o outro homem, um idoso de pele branca, era o responsável pela tentativa de esfaqueamento. Ele circulava livremente pela calçada. Por fim, Éverton é detido. O agressor somente teria sido preso após ir em casa e voltar ao local da ocorrência.
Com a repercussão do caso nas redes sociais, o ministro Silvio Almeida afirmou que o homem negro foi “tratado como criminoso”, e que a conduta dos policiais demostra “a forma como o racismo perverte as instituições e, por consequência, seus agentes”.
Neste domingo, a ministra Anielle Franco se pronunciou sobre o caso em seu perfil no Instagram, e disse que trabalhará pela "responsabilização".
Segundo a TV RBS, foi registrado boletim de ocorrência por lesão corporal. De acordo com a Polícia Civil, o homem negro teve escoriações no pescoço, possivelmente provocadas pela faca, e o homem branco teve escoriações na perna. O motoboy também teria registrado ocorrência por abuso de autoridade contra a Brigada Militar.
O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, afirmou, neste domingo, que determinou abertura de sindicância para que a Corregedoria da Brigada Militar do estado apure as circunstâncias da abordagem. Na mesma publicação, Leite reforça a "confiança" que tem "nos homens e mulheres que compõem as forças de segurança".
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